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REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 5 As autoridades brasileiras têmuma tradição sólida. Qualquer que seja o governo, elas acreditamque a edição de novas leis sempre dará conta de resolver velhos problemas. Quanto mais detalhadas as novas leis, melhor. Na história política do Brasil, nada mais sólido do que essa crença. mais um desses exemplos acaba de ocorrer. Desta vez, o pretexto foi o direito de resposta na imprensa. Comecemos por lembrar que a Constituição Federal já garante esse direito. No artigo quinto, inciso V, está escrito que “é assegurado o direito de resposta, propor- cional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”. Segundo muitos juristas, por estar inscrito em norma constitucional, o direito de resposta tem aplicação ime- diata e não depende de regulação por lei ordinária (infra- constitucional). Os dispositivos para isso já estariam no Código Civil, no Código de Processo Civil e no Código de Defesa do Consumidor. Mas a fúria legisferante acha que isso não é suficiente, que é preciso especificamente definir a proporcionalidade, comprovar o agravo, quantificar o dano a que se refere a Constituição. O Projeto de Lei 6.446/2013, de autoria do senador RobertoRequião foi aprovado naCâmara dosDeputados às pressas, graças ao incentivodecididodopresidente daCasa, EduardoCunha, e sancionado a jato pela presidenteDilma Rousseff, que só vetouuma das suasmuitas excentricidades. Equacionar tudo a favor de quem? Olhando a lei mais de perto, identificamos nela indícios que podem abrir cami- nho para cerceamentos da liberdade de imprensa e que não contribuem, nem de longe, para regular o legítimo direito de resposta de quem se sinta atingido por infor- mações publicadas que lhe pareçammentirosas, difama- tórias ou de algum modo prejudiciais. Por exemplo: o projeto estabelece que a resposta terá “o mesmo destaque, publicidade, periodicidade e dimensão” da publicação supostamente ofensiva. O veículo de comu- nicação acionado tem sete dias para publicar a resposta de forma espon- tânea. Caso se recuse, ou se a parte que se diz prejudicada não se declarar satisfeita, a pessoa (física ou jurídica) poderá ir à Justiça. Se o juiz ordenar a publicação da resposta, ela tem de ocorrer em até dez dias. E no caso de publicações de perio- dicidade trimestral? E com os livros? Como garantir o direito de resposta a um livro? A editora deve publicar outros livros, escritos por pessoas que se sentemprejudicadas pelo original, comamesma tiragemeomesmo tama- nho? E em dez dias? E se 50 pessoas se declararem avil- tadas, por motivos diversos, por uma reportagem de jornal. Como vai ser? O diário terá de publicar 50 reporta- gens nomesmo espaço, comomesmo destaque da matéria original? Ninguém aqui é contra o direito de resposta. Bem ao contrário. Ele deve ser assegurado na prática pelas regras internas de toda publicação jornalística Admitimos, ainda, a possível existência de lacunas legais que poderiam ser resolvidas também–mas não exclusivamente – pelo aper- feiçoamento do ordenamento jurídico. Aindamais quando fica clara, como nessa lei, a intenção de prejudicar veícu- los jornalísticos independentes. Nessas horas, é útil entender as soluções adotadas em outros países democráticos. Nos Estados Unidos, em 1974, a Suprema Corte em votação unânime sepultou as tenta- tivas de regular por lei o direito de resposta. “A escolha do material que sai num jornal (...) constitui exercício de controle e julgamento editorial”, proclamou a Corte. Lá, os que se sentemofendidos recorremà legislação comum. E não há reclamação contra isso. Fundamentalmente, a solução não depende tanto de lei, mas da cultura jornalística de cada publicação – e, mais ainda, de cada sociedade. O que assegura o amplo direito de resposta é a ética da profissão, que se traduz nos méto- dos de trabalho das redações. Sendo um tópico mais da cultura jornalística do que da lei, o direito de resposta tem sido resolvido e contem- plado em outras democracias, como a do Reino Unido, muito mais com base na autorregulação do que da lei e do Direito Positivo. O assunto pertence mais às relações entre a imprensa e a sociedade do que aos tribunais. Repita-se: não se deve recusar, por princípio, a ajuda da lei. Apenas é necessá- rio levar em conta que a lei não resolve tudo. Principal- mente quando se trata do direito de resposta. ■ Uma resposta ao “direito de resposta” EDITORIAL

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