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14 abril | maio | junho 2016 ideias + críticas VITOr blotta Amizade distante com que se pode contar A relação de Habermas com o jornalismo é como a de companheiros de infância que se reencontram mais maduros, já que nunca deixaram de compartilhar valores e interesses ofilósofoalemão JürgenHabermas é sempre lembrado nos cursos e estu- dos sobre jornalismo e comunicação, especialmente por suas obras-primas Mudança Estrutural da Esfera Pública, de 1962 ( MudançaEstrutural daEsfera Pública. 2ª ed. trad. FlávioR. Kothe. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003), e Teoria da Ação Comunicativa , de 1981 ( The Theory of Communicative Action. Reason and the Rationalization of Society . Trad. Thomas McCarthy. vol. I. Boston: BeaconPress, 1984). Em resumo, a primeira é um estudo soci- ológico e filosófico sobre o surgimento de espaços de comunicação e expres- são entre cidadãos privados reunidos em públicos desde o século 17, no iní- cio da fase concorrencial do capita- lismo na Europa. Os suportes princi- pais desses públicos eram os recém- criados jornais, a imprensa, sua insti- tuição por excelência, e seu produto, a opiniãopública, tornar-se-iamo funda- mento último da lei no Estado demo- crático. Isso significa que a imprensa incorpora para Habermas o princípio da esfera pública, que deveria garantir a proteção da esfera privada e a publi- cização do poder, ou seja, a separa- ção entre sociedade civil e Estado por meio dos direitos humanos e da sobe- rania popular. Porém, com o advento dos meios de comunicação de massa e a indus- trialização da cultura no século 20, ocorre a decadência da esfera pública. A notícia teria se tornado mercado- ria e a opinião pública transfigurada em opinião publicada e aclamação. Depois dessa desilusão com o prin- cípio da esfera pública, de um lado tornada propaganda, de outro, medi- ção estatística de pesquisas de opi- nião, Habermas se distanciou do jor- nalismo e dos meios de comunicação como espaços emque poderia identi- ficar uma comunicação voltada para o exercício das liberdades de comu- nicação e do respeito às competên- cias comunicativas de cada indivíduo. Por isso, Teoria da Ação Comunica- tiva é um estudo sobre a constituição linguística do mesmo tipo de comu- nicação que pode ser identificado em Mudança Estrutural da Esfera Pública , mas queHabermas então atribui a toda relação humana que se utiliza das tro- cas discursivas voltadas à comunica- ção orientada pelomelhor argumento, e não pelo autointeresse, a reputação ou o lugar social do discurso. Mais ainda, estaria presente emtoda comu- nicação emque indivíduos e grupos se reúnempara discutir e decidir sobre a verdade dos fatos, a validade das nor- mas e a sinceridade e a autenticidade das expressões individuais e culturais. Com essa guinada para a filoso- fia e mais em seguida para a teoria da moral e do direito, Habermas só retomaria mais sistematicamente o jornalismo e os meios de comuni- cação como objetos de análise qua- renta anos depois da primeira publi- cação de Mudança Estrutural . Ao que parece, preocupado comas condições de uma esfera pública transnacional a partir da formação da União Euro- peia e o papel dosmeios de comunica- ção nessa questão. Mas, apesar dessa

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