RJESPM 16
18 JANEIRO | FEVEREIRO | MARÇO 2016 Mas voltemos ao histórico. Entre 1990 e 2007 houve marchas e con- tramarchas, conversas e desconver- sas, até que, em setembro de 2008, o ex-presidente Lula assinou o decreto 6.583, segundo o qual o desacordo entraria em vigor em 1º de janeiro de 2009, com quatro anos de “acomoda- ção”. Nesse período valeriam as duas grafias (a “nova” e a “velha”). Detalhe: o Brasil se valeu de um item do “Segundo Protocolo Modifi- cativo ao Acordo Ortográfico”, assi- nado em 2004, em São Tomé e Prín- cipe, segundo o qual seria suficiente que apenas três países da Comuni- dade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) ratificassemo desacordo para que ele entrasse em vigor nesses paí- ses. Foi o que fizeram o Brasil, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe, o que deu aos mandatários brasucas a bri- lhante ideia de pôr logo em vigor o desacordo, mas... Mas aí alguém se lembrou de per- guntar se o Feola de turno tinha com- binado algo comos russos... Tradução: alguém se lembrou de Portugal, que só ratificou esse “Segundo Protocolo” em 2008, o que funcionou como um sinal verde para que o Brasil anun- ciasse que o desacordo entraria em vigor por aqui em 1º/01/2009. Poisbem. Entre2007e2008, quando já se tinha como certo ou quase certo que Lula assinaria o decreto, as edi- toras correram para adequar as suas publicações ao texto do desacordo e constataram que nele havia uma sucessão de buracos negros. Não foi Sem o acento diferencial em “para”, o que fazer com casos como “Nada para os bombeiros” ou “Trânsito pesado para a Barra”? por acaso que até a ABL lançou um dicionário repleto de contradições, fato que apontei na Folha de S.Paulo em 1º/01/2009. Confusão geral O resultado dessa tola e infantil pressa paracolocaremvigornoBrasil o infame desacordo é que aindanão se sabia, por exemplo, como se grafariam palavras como “coerdeiro” (ou seria “co-her- deiro”?) e “reeleição” (ou seria “re-elei- ção”?). Nem o Dicionário Escolar da Língua Portuguesa , da própria ABL (“Coma nova ortografia da língua por- tuguesa”), sabia responder a isso. Na página 21 de um “exemplar para aná- lise”, a que tive acesso, lia-se o seguinte (a respeito do emprego do hífen): “Nas formaçõescomosprefixos co- , pro- , pre- e re- , estes seaglutinam, emgeral, como segundo elemento,mesmoquando ini- ciado por o ou e ”. Emseguida, davam- se estes exemplos: “coautor, coedição, procônsul, preeleito, reeleição, coabi- tar, coerdeiro”. Quando se procurava cada um dos exemplos no próprio dicionário... Sur- presa! “Coautor”, “coedição” e “coa- bitar” se mantinham, “procônsul” e “preeleito” não tinham registro (mas havia registro de “pré-eleitoral”, com acento agudo e hífen), “coerdeiro” pas- sava a “co-herdeiro”, e “reeleição” pas- sava a “re-eleição”, o que também se via em vários casos análogos (“re-e- ducar”, “re-editar” etc.). Quando finalmente o Vocabulário Ortográfico ficou pronto e foi publi- cado, viu-se que a ABL dera (arbitra- riamente) rumo a alguns dos bura- cos negros do texto oficial, parti- cularmente no que diz respeito ao emprego do hífen. Os nós eram tan- tos que a ABL precisou publicar uma extensa “Nota Explicativa”, na qual arrola as principais medidas toma- das pela Comissão de Lexicologia e Lexicografia da casa. Essa lista de medidas “corrigiu” ou tornou nulas partes do texto oficial do desacordo e instituiu a obrigato- riedade da decoreba de certos (mui- tos) casos, em que a “regra” proposta pelo desacordo é simplesmente ras- gada ou interpretada arbitrariamente pelas comissões, que, segundo elas
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