RJESPM 16

30 JANEIRO | FEVEREIRO | MARÇO 2016 sinceridade do processo jornalístico tem tremendo poder. Nas entrevis- tas, a câmera normalmente não fica só no entrevistado; pega também o repórter. Por outro lado, a impressão de que tudo foi costurado espontaneamente dá a sensaçãode estarmos ouvindoum furo da boca de um amigo, ainda que a informação já tenha sido noticiada. Os vídeos têmedição caprichada e são filmados em alta definição como na velha mídia, mas parecem informais como os de redes sociais. No final de abril de 2015, o foco era a campanha para as eleições do Reino Unido, o impacto do terremoto de magnitude 7,8 no Nepal e a tensão nas ruas de Baltimore. No dia 25 de abril de 2015, os pro- testos após amorte suspeita de Fred- die Gray, sob custódia da polícia, des- cambaram para a violência: manifes- tantes quebraram vidros de carros e jogaram pedras na polícia. Três dias depois, Monica Villamizar, da Vice, começou a transmitir os protestos por livestream . Não há um âncora para interagir, nem uma montagem cuidadosa de tomadas: apenas duas horas nas quais o espectador acompanha o repórter e o cinegrafista. Os dois discutem aonde ir e o que gravar. A câmera treme, às vezes perde o foco e, com a iluminação da rua, fica difícil enxer- gar o rosto dos entrevistados. O que se vê é a equipe abordando na lata os moradores, testemunhando o saque de uma loja numa esquina e discu- tindo o que filmar emseguida. A coisa toda é bruta, mas também honesta: uma espiadela não só no que está acontencendo no local, mas também em como é produzido o jornalismo. Filmagem visceral Nesse e em outros quatro vídeos – alguns mais condensados, de dez ou 15 minutos –, não há muita informa- ção nova sobre a dinâmica racial em Baltimore ou sobre as consequências dos protestos (embora parte da cober- tura escrita tratasse desses assun- tos). Saímos, sim, com uma ideia vis- ceral do que é aquele lugar. Vemos a densidade dos manifestantes na rua, e o gesto que fazem à polícia – com o dedo médio de cada mão em riste. ARQUIVO CJR