RJESPM 16
44 JANEIRO | FEVEREIRO | MARÇO 2016 Diário de um correspondente A dura, mas riquíssima, realidade de quem cobre países em conflito e enfrenta regimes autoritários, espionagem e perseguições de todo tipo por samy adghirni minha despedida do irã , após quase trêsanoscomocorrespondenteda Folha de S.Paulo , ocorreunumanoite abafada de junho de 2014, numrestaurante em Darakeh, bairromontanhoso ao norte de Teerã. O jantar com a turma havia sidoorganizadoporJasonRezaian, cor- respondente do WashingtonPost , meu amigomais próximo naquele período. Ganhei presentes e nos divertimos até a hora do adeus. O último e emo- cionado abraço se deu na rua princi- pal de Darakeh, de onde se enxerga, a cerca de 300 metros de distância, um muro de concreto que costeia a mon- tanha. É a prisão de Evin, onde Jason seria jogado exatas duas semanas após minha partida. Soube da detenção de Jason por email, enquanto eu aproveitava férias em São Paulo. Agentes à paisana haviam invadido o apartamento de Jason e Yeganeh, suamulher, e levado os dois, deixando para trás móveis e pertences destroçados. Uma opera- ção simultânea do outro lado de Teerã prendeu uma fotógrafa que havia sido colaboradora da Folha (ela preferiu não divulgar o nome) e seu marido, amigos queridos também presentes naquela despedida em Darakeh. O porteiro do prédio onde moravam tentou impedir a entrada dos agentes, mas foi confrontado pelos arapongas e morreu de parada cardíaca. A fotó- grafa e seu marido foram libertados dias depois e Yeganeh, em outubro. Mas Jason ficaria encarcerado em Evin por 18 meses, cinco dos quais numa solitária. Acusações de espionagem Jason foi detido pelo que é, não por algo que tenha feito. Até autoridades iranianas admitiram que o caso pas- sava longe de qualquer reportagem publicada no Washington Post . As vagas acusações de espionagem tam- pouco faziamsentido. Numpaís domi- nado pelos serviços de segurança, que acesso a informações sensíveis pode- ria ter um jornalista com cara e sota- que de gringo? Uma fonte na Guarda Revolucionária, a temida força de elite militar, me dizia que os verdadeiros espiões são pessoas infiltradas den- tro do próprio governo. Jason tinha umperfil atípico dentro da pequena comunidade de jornalis- tas estrangeiros. Era o único repórter dos Estados Unidos a possuir creden- cial de correspondente no Irã. Mas ele também tempassaporte iraniano, herdado do pai, umvendedor de tape- tes persas que fez a vida na América, onde se casou e teve dois filhos. A dupla cidadania dava a Jason motivo de orgulho e, ao mesmo tempo, uma autoridade ímpar para dissecar e cri- ticar os dois países em proporções simétricas. Jason às vezes me parecia um típico americano de classe média, com seu gosto por hambúrguer e beisebol,
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