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REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 5 a lei era completamente desnecessária , já que todos os delitos para os quais determina punição já estavam tipi- ficados na legislação comum. Assim como ocorre com a lei do direito de resposta e as propostas de criação de uma nova lei de imprensa, criar esse instrumento só faz aumentar a confusão jurídica e incentivar iniciativas para impedir a livre manifestação de ideias, em claro conflito com a Constituição. Cheio de expressões e conceitos genéricos e subjeti- vos, o texto dá margem a interpretações múltiplas por parte de promotores e juízes, que podem se valer dele para perseguir e encarcerar quem tenha opiniões con- trárias às suas. OCongresso vinha tratando do assunto já havia 40 anos, mas as coisas tiveramde ser apressadas devido à proximi- dade dos Jogos Olímpicos do Rio, já que muitos países e algumas entidades denunciavamo que consideravam fra- gilidade das leis brasileiras para lidar com o terrorismo. O governo e o Congresso preferiram ceder a tais pres- sões sem atentar a alertas como o de Edison Lanza, da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Orga- nização dos Estados Americanos (OEA), para quem “[há] casos abundantes na América Latina que mostram que leis antiterrorismo redigidas em termos vagos e ambí- guos servemmuitas vezes para de algummodo crimina- lizar grupos que são vozes muito fortes, dissidentes, mas não necessariamente grupos terroristas”. Pela nova lei, qualquer pessoa que expresse apoio a uma entidade que seja classificável como terrorista pode ser condenada a até 13 anos de pri- são por fazer “apologia ou incitação ao terrorismo”, caso suas palavras tenham sido publicadas na internet ou em meios de comunicação. Esse tipo de atentado contra a liber- dade de expressão tem sido frequente em outros países. França e Espanha, por exemplo, aprovaram legislação tão discutível quanto a brasileira após atos terroristas teremocorrido recen- temente em seus territórios, algo que, por sinal, não aconteceu no Brasil. A aplicação dessas leis tem pro- vado como elas podem ser deletérias em relação ao exercício dos direitos humanos. No Carnaval deste ano, em Madri, dois rapazes que exibiamum show de marionetes para crianças foram presos depois que pais na audiên- cia os acusaram, perante a polícia, de estarem, segundo eles, elogiando o Estado Islâmico, a Al Qaeda e a orga- nização basca ETA. Isso porque os personagens faziam jogo de palavras com os nomes dos grupos. Os artistas estão sendo processa- dos e podem pegar até sete anos de prisão por “glorifi- car o terrorismo e promover o ódio”. Não é um caso isolado. Em 2015, 25 pessoas foram jul- gadas na Espanha por crimes similares, inclusive um can- tor de rap e um poeta, e só seis foram absolvidas. Na França, o comediante Dieudonné M’bala M’bala foi condenado a dois meses de prisão por um comentário no Facebook considerado simpático aos assassinos da redação do Charlie Hebdo e há diversas outras situações parecidas com artistas que, de modo debochado ou ico- noclasta (aliás, na tradição do próprio semanário), tra- tam de temas “suspeitos”. É conhecida e inegável a tendência do Judiciário bra- sileiro à intolerância, em especial das instâncias inferio- res, em relação a ideias que desagradam a esse ou aquele magistrado. Coma nova lei antiterrorismo, eles terãomais justificativas para praticar censura, intimidar artistas e repórteres, perseguir desafetos. A Lei Antiterror vai provocar inúmeros atos de terror contra a liberdade. ■ Lei Antiterror vai causar terror antiliberdade EDITORIAL Novo golpe contra a liberdade de expressão no país foi cometido pelo Legislativo brasileiro com a aprovação do PLC 101/2015, agora conhecido como a Lei Antiterror, de iniciativa do Executivo e que contou com o voto expressivamentemajoritário dos deputados e senadores.

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