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REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 23 dos, deviamdeixar todos preocupados. O vice-procurador-geral dos Estados Unidos, John Carlin, admitiu que há problemas associados ao fato de, atu- almente, nenhuma lei americana reco- nhecero“terrorismodoméstico” como crime, assim como nenhuma legisla- ção criminalizar o apoio material ao terrorismo doméstico. Segundo Car- lin, que é responsável pela segurança nacional no Departamento de Jus- tiça, “nos últimos anos mais america- nos morreram nas mãos de extremis- tas internos do que de grupos terro- ristas internacionais”. O foco desmedido no terrorismo internacional fez com que uma ame- aça mais premente tenha sido igno- rada. Mais preocupante ainda, a ati- vidade online que precede esses atos – que inspira ódio e promove violên- cia – não é tipificada por nenhuma legislação e goza, em grande medida, das garantias do discurso protegido à luz da Primeira Emenda. “Não tenho condições de, sozinho, ir ao gueto e lutar”, escreveuDylannRoof, o assas- sino da Carolina do Sul, emummani- festo na internet. “Escolhi Charleston por ser [a] cidade mais histórica em meu Estado e, em certomomento, ter tido amaior proporção de negros para brancos no país. Não temos skinhe- ads, nenhuma KKK [Ku Klux Klan] de verdade, ninguém fazendo nada além de falar na internet. Pois bem, alguém temde ter a coragemde levar isso para a vida real, e acho que tem de ser eu.” Muçulmanos são alvo fácil “Falar na internet” é algo que adeptos da supremacia branca, incluindo aque- les que flertam com o assassinato em massa, fazem. Não é, no entanto, algo atualmente punível pela legislação americana – salvo, é claro, se sua filia- ção for a um grupo terrorista estran- geiro, como a Al Qaeda ou o Estado Islâmico. É essa arquitetura de subterfúgio e discriminação que ajuda a validar no imaginário americano a premissa de que todo terrorista é muçulmano. Ainda que o terrorismo hoje seja feijão com arroz do noticiário, jorna- listas americanos ainda não mostra- ram capacidade ou vontade de indi- car como a definição legal de terro- rismo levou à demonização de toda uma minoria religiosa. A população muçulmana-ameri- cana é alvo fácil: pouco numerosa e basicamente incapaz de conter a onda de punição e culpa a ela diri- gida. É responsabilidade dos jorna- listas que formulam esse debate falar em nome dela. ■ rafia zakaria é advogada, ativista de direitos humanos e autora do livro The Upstairs Wife: An Intimate History of Pakistan (Beacon, 2015). Zakaria integrou o conselho do capítulo americano da Anistia Internacional de 2009 a 2015. Texto publicado no site www.cjr.org em 15 de setembro de 2016.

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