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REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 27 responsabilidade pelo 11/9”. A disputa “virou uma campa- nha eleitoral de um tema só, segu- rança”, disse Sarah Oates, profes- sora e pesquisadora da Philip Mer- rill College of Journalism (University of Maryland), nos Estados Unidos. “Sob esse aspecto, a eleição de 2004 é praticamente única. Podem dizer o que quiserem do americano, mas somos um povo prático, e a maioria das nossas disputas eleitorais gira em torno da economia. A sensação era de que as pessoas estavam sendo manipuladas para pensar constante- mente em segurança.” Simpatia à linha dura A combinação de alertas de terro- rismo e a cobertura do vídeo de Bin Laden, prosseguiu Oates, convenceu muitos eleitores a encarar commais simpatia a linha dura de Bush, ape- sar da advertência de certos críticos de que isso significava aceitar a troca de uma democracia liberal aberta por um Estado mais securitizado. “Acho que aqueles anos aprofundaram o trauma para todos. Havia adminis- tradores e burocratas cuja preocupa- ção era não deixar que outro atentado ocorresse. Já estávamos traumatiza- dos por (...) Guantánamo. Daí termos aceitado a erosão de nossos direitos como cidadãos”, afirmou. Em um relatório de 2006, Oates examinou uma amostra do noticiá- rio durante a campanha – incluindo telejornais como World News Toni- ght (com Peter Jennings, da emis- sora ABC), Evening News (com Dan Rather, na CBS) e The Nightly News (comTomBrokaw, na NBC) – e cons- tatou que 43%do noticiário era ligado à eleição, enquanto 22% tratava de terrorismo. Depois do Iraque, o ter- rorismo era o assunto mais citado. O estudo de Oates Comparing the Politics of Fear: The Role of Televi- sion News in Election Campaigns in Russia, the United States and Britain (Comparando a Política do Medo: OPapel doNoticiário de TV emCam- panhas Eleitorais na Rússia, nos Esta- dosUnidos enaGrã-Bretanha, emtra- dução livre) mostra ainda que, apesar da presença frequente do terrorismo no noticiário, canais de TV não expli- caram a diferença entre as propostas de governo dos candidatos. Embora volta emeia tocassemno tema do ter- rorismo, Bush e Kerry tinham visões opostas sobre uma série de temas – como pena de morte, aborto, redu- ção de impostos, saúde e geração de empregos. Omesmo estudo também revela que, em vários casos, Bush acusou o adversário de ser “brando” demais e não ter um plano de segu- rança coerente. Kerry em geral res- pondia com a promessa de “não vacilar” e “perseguir os terroristas onde quer que estivessem”.“O tom da cobertura da imprensa durante a campanha em 2004 foi fortemente influenciado pela mensagem implí- cita do governo de que não apoiar a abordagem deles já era quase falta de patriotismo”, disse Philip Seib, coautor de Global TerrorismandNew Media: The Post-al Qaeda Generation (Terrorismo Global e Novas Mídias: A Geração Pós-al Qaeda, em tradu- ção livre) e professor de jornalismo, diplomacia pública e relações inter- nacionais na Annenberg School for Communication e Journalism (da University of Shouthern Califor- nia). “Esse período de 2001 a 2004 é marcado pelo tom assumido pela Fox News. Creio que isso ajudou a promover a ideia da cobertura jor- nalística patriótica.” Dificuldade para os democratas Jennifer Merolla, autora do livro Democracy at Risk: How Terrorist Threats Affect the Public (Democra- cia emRisco: Como as Ameaças Ter- roristas afetam o Público, em tra- dução livre), declara que houve um esforço concertado para colocar o terrorismo no centro da campanha de 2004: “O terrorismo era a ques- tão determinante para os eleito- res. Qualquer coisa ligada a segu- rança nacional é um desafio para os democratas. Estamos vendo amesma coisa em 2016, com Trump sendo assertivo e bombástico sobre o tema da segurança”. No entanto, o foco absoluto dos meios de comunicação no terrorismo fez com que a cobertura ignorasse outros temas importantes. Em um
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