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REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 29 ram, todos, atrás do terrorismo. Segundo a jornalista, escritora e professora adjunta de ciências polí- ticas na Columbia University Brigitte Nacos, um grande atentado durante a campanha teria favorecido Donald Trump, pois cerca de 40%do público acreditava que ele poderia sanar todo problema dos Estados Unidos. Minha pesquisa revela duas dife- renças vitais entre a cobertura do ter- rorismo durante as disputas presiden- ciais de 2004 e 2016 nos Estados Uni- dos. Amais óbvia é que o uso dissemi- nado do jornalismo digital e demídias sociais serviu para rapidamente vin- cular narrativas humanas a crimes de ódio recentes como o de Orlando ou atentados terroristas como os deNice e Paris. Hashtags como #MuslimsA- reNotTerrorists e #NotInMyName deram destaque a relatos humanos com longos rastros digitais, o que aju- dou a corrigir informações e rechaçar a islamofobia. Foi muito divulgado o dado da União dos Muçulmanos dos Alpes-Maritimes de que um terço dos mortos em Nice eram muçulmanos. E, mais importante, amídia ameri- cana também teve de se adaptar aos grandes desafios da cobertura da dis- puta presidencial emtempo real. Sites de verificação de fatos comoPolitiFact e FactCheck, bem como o departa- mento de verificação instantânea de fatos emjornais como TheWashington Post , tiveram impacto sobre o pro- cesso eleitoral. Seu sucesso também foi destacado por estudos: de cada dez americanos, mais de oito têmuma opinião favorável sobre a checagem de fatos. Minuto a minuto Comoumcandidato republicanonada convencional, Trump – comsua natu- reza agressiva – exerceu umprofundo efeito no ritmo da cobertura jornalís- tica. Organizações de comunicação viram o ciclo noticioso de 24 horas virar uma corrida minuto a minuto. O noticiário já não depende do filtro de editores ou especialistas. Existe sob o holofote de milhões de contas de redes sociais transmitindo para os celulares de todo o país. A natureza intensa e muitas vezes espetacular do terrorismo pode tor- nar difícil uma análise que extra- pole o horror imediato do evento. O ritmo e a violência chocante de ata- ques contra civis, e sua consequên- cia para as liberdades humanas, dão lições valiosas sobre como meios de comunicação – novos e tradicionais – reagem. Cada exemplo demonstra como diferentes respostas de políti- cos podem influenciar tanto a opi- nião do eleitorado como eleições posteriores. Como observaram muitos dos especialistas que entrevistei, o impacto do terrorismo se faz sentir por anos a fio, tanto em democra- cias estabelecidas como em emer- gentes. Embora traga poucas amea- ças diretas à existência de umEstado moderno, o terrorismo suscita, sim, sérias questões sobre como são for- muladas novas leis de segurança, o clima político que permite sua rápida aprovação e seu efeito sobre liberdades civis. Mídia, políticos e plataformas sociais terão de se adaptar a novos desafios nos próximos anos. Plata- formas como Facebook e Twitter – que nas mãos de vítimas e perpetra- dores do terrorismo podem transpor a mídia tradicional – seguirão sendo questionadas no que tange a vera- cidade, a neutralidade e a intenção de usuários. Políticos e jornalistas continuarão a ter suas decisões jul- gadas pela forma como respondem ao terrorismo, e devem incentivar o debate sobre como o processo polí- tico pode ser manipulado pelo ter- rorismo. A prioridade de governos e meios de comunicação deve ser não só informar o público, mas proteger as tradições e os objetivos da demo- cracia no processo. ■ burhan wazir é ex-diretor da seção de opinião da Al Jazeera em inglês. Vive no Oriente Médio desde 2008. Texto publicado no site www.cjr.org em 16 de setembro de 2016.

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