RJESPM_18

REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 43 que os jovens se manifestassem. Nas 24 horas que se seguiram, recebemos dezenas de opiniões distintas de mil- lennials, o tom melhorou e a conversa a partir dali deslanchou. Depois disso, o FT armou uma suíte com um apanhado dos melho- res comentários. Outra tática, segundo ela, é solicitar a contribuição do leitor em sua área de conhecimento. “Um exemplo foi pedirmos a leitores espe- cializados na parte legal que nos aju- dassema responder perguntas difíceis sobre o Brexit que ainda não tinham resposta dias antes do referendo”, diz. O FT deu uma matéria com base nessas respostas. Embora não tenha usado o Projeto Coral nesse exemplo, as ferramentas doprojeto teriamcomo objetivo simplificar esse processo, aju- dando omeio que não temuma equipe responsável pela relação coma comu- nidade a fazer algo parecido. Efeito positivo Aproveitar comentários de leitores também tem efeito positivo sobre a participação futura desses leitores. Em junho de 2016, a iniciativa Enga- ging News Projects (que se uniu ao Projeto Coral para fazer uma son- dagem de comentadores) soltou um estudo de 9 milhões de comentários do New York Times que avaliava o impacto, sobre os comentários, da reformulação do design do jornal em novembro de 2011. Entre outras coi- sas, os comentários começarama apa- recer diretamente abaixo do artigo – até ali, ficavam em outra página, cujo link vinha no pé damatéria. O estudo constatouque, no ano seguinte à refor- mulação, o número de comentários denunciados por suposto abuso foi menor – sugerindo que a civilidade da discussão aumentou – e que, quando umeditor aproveitava umcomentário, aquele leitor passava a comentarmais. Alémdisso, o Times deixou demos- trar respostas de outros usuários logo abaixo de comentários para que um comentário pareçamais uma declara- ção, o que desestimula a troca de far- pas, e vem testando ummodelo mais estruturado de comentários para dar foco à discussão. O uso de perguntas para direcionar o leitor e ajudá-lo a formular uma opinião antes de digi- tar está despontando como uma das melhores ferramentas para enfatizar um debate. É como diz Raptopoulos: “Se acharmos um jeito de estruturar a conversa com uma pergunta lá no começo dos comentários, podemos não só dar às pessoas uma orientação quemelhore de fato a qualidade, mas tambémfalar a todos aqueles que nor- malmente não comentariam”. Naturalmente, toda organização é peculiar. Annemarie Dooling, que dirigia a comunidade no Huffington Post (onde trabalhou comLosowsky) e hoje é diretora de programação do site Racked.com, escreve por e-mail: “ORacked está avançando rumo a um modelodistribuído, oque significa que as matérias mais importantes apare- cerão na íntegra na nossa newsletter e terão, também, umespaço no site (...). Portanto, ainda que no site tenhamos comentários, eles não são um pilar dos planos a longo prazo, pois nota- mos que o leitor tende a gravitar para a newsletter e, emseguida, ter discus- sões privadas”. O importante, conti- nuaDooling, é entender opúblicopara poder adaptar seu trabalho: Ninguémdevia escrever umamaté- ria só por escrever. Há sempre uma intenção em mente. Talvez seja fazer o leitor comprar alguma coisa, ou con- tribuir para um [projeto no] Kickstar- ter, entendermelhor umassunto, man- dar uma receita (...). Não há umameta única para a participação do leitor. “O grande problema do comentá- rio é filosófico, não técnico”, garante Dooling. Sites jornalísticos não refle- temo suficiente sobre ameta que que- rem atingir com comentários. Loso- wsky acusa o mesmo fenômeno ao observar que a seção de comentários foi herdada dos primeiros blogs lá atrás, mas que muito meio não pensa em como está usando o recurso. Meios de interação Enquanto isso, sites de notícias anseiam pela colaboração “positiva e construtiva” do leitor, comoescreveu Jensen, da NPR, em seu post. Estão à procura de comentários menos rea- cionários – e antes que a matéria seja escrita, não depois. A NPR vai usar a plataformaHearken para incentivar a participação do público e pedir a opi- nião de leitores. Se o Projeto Coral vai conseguir impedir que meios de comunicação eliminem a seção de comentários em seus sites para priorizar a discussão em redes sociais ainda é uma incóg- nita. O projeto, no entanto, só dá as ferramentas – o sucesso de uma reda- ção na interação com seus leitores tem a ver com a atitude tomada pela própria organização jornalística, que tanto pode ser proativa no trabalho com o público ou relegar comentá- rios a plataformas de redes sociais sobre as quais tem pouco controle. ■ nausicaa renner é editora-associada da Columbia Journalism Review e do Tow Center for Digital Journalism . Seu Twitter é @nausjcaa.

RkJQdWJsaXNoZXIy NDQ1MTcx