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60 OUTUBRO | NOVEMBRO | DEZEMBRO 2016 PARA LER e PARA VER LEÃO SERVA Em novo livro, Joe Sacco reúne histórias sobre temas como a imigração na Europa e critica o equilíbrio de versões em uma reportagem JOE SACCO tem publicado livros de quadrinhos sobre temas da atualidade, especialmente con- flitos internacionais, entre os quais os longos Palestina – Uma Nação Ocupada (Conrad, 2010) e Gorazde (sobre a Bósnia, 1992- 1995 – Conrad, 2001) são prova- velmente os mais famosos. Re- portagens , recém-lançado no Brasil, é uma compilação de his- tórias mais curtas sobre Territó- rios Palestinos, Iraque, Kushina- gar, Chechênia, os julgamentos de Haia e as recentes ondas de imigração na Europa. Alémdas histórias, o livro con- tém um prefácio em que o au- tor reflete sobre seu trabalho: “Alguém aí pediu um manifes- to?”, escrito como defesa con- Quem disse que HQ não é jornalismo não leu Joe Sacco LIVROS tra as críticas daqueles “que se opõem à legitimidade dos qua- drinhos como forma eficiente de fazer jornalismo”, diz. Nascido em Malta, em 1960, Sacco se formou jornalista, mas “deixou a profissão para se dedi- car às histórias em quadrinhos”, como diz sua pequena biogra- fia, ao final do volume. Só que não: o autor se vê como um re- pórter que usa os quadrinhos para narrar suas apurações. Sacco admite a subjetividade maior do desenho em relação à fotografia, por exemplo: “Cos- tuma-se entender que as foto- grafias capturam literalmente um momento do mundo real. No desenho, porém, não há na- da de literal”. Mas, escreve, “isso não põe por terra as pretensões dos cartunistas que aspiram ao jornalismo”. E explica que man- tém íntegras as “obrigações-pa- drão”: “Reportar demaneira pre- cisa, ater-se às falas dos entre- vistados, checar afirmações”. A esses ditames gerais da pro- fissão, Sacco acrescenta com- promissos peculiares aos qua- drinhos: “Tento desenhar pesso- as e objetos da forma mais pre- cisa possível, sempre que possí- vel”. Quando usa a imaginação, ainda assim, busca orientar-se por uma “base nas especifica- ções de temporalidade, lugar e situação”. “Faço perguntas: quantas pessoas havia lá? On- de ficava o arame farpado? As pessoas estavam de pé ou sen- tadas?”. Então afirma a perti- nência do uso do quadrinho pa- ra narrativa jornalística: “É pos- sível almejar precisão no âmbito de uma obra desenhada”. Em meio ao texto, ele critica duas “vacas sagradas” do jorna- lismo americano, a “objetivida- de” e o “equilíbrio”, ambos im- possíveis, segundo crê. Para ele o limite possível de ser objetivo é: “Abordar um fato sem ter pre- concepções”. E, quanto ao equi- líbrio, ele critica: “Se um lado diz uma coisa e o outro diz ou- tra, será mesmo que a verda- de se encontra ‘em algum ponto entre os dois’? O jornalista que diz ‘bom, deixei os dois lados fu- los da vida, então acho que es- tou no caminho certo’ provavel- mente está se enganando e, o pior, engana também o leitor”. Ao denunciar a incapacidade do equilíbrio de versões, Sacco sugere a apuração e afirmação REPRODUÇÃO

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