RJESPM_19

REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 17 16 JANEIRO | JUNHO 2017 IDEIAS + CRÍTICAS FERNANDO LUÍS SCHÜLER Uma nova visão da comunicação pública Se a sociedade dispuser de veículos que expressem múltiplos pontos de vista em várias plataformas, o direito à informação estará assegurado CRÉDITO RICO LINS o argumento em favor da utilidade da comunicação pública foi apresentado comrara elegância pelo professor e pesquisador daUniversidade de São Paulo (USP), Eugênio Bucci, em sua obra O Estado de Narciso . Bucci define uma emissora pública como aquela que é financiada peloEstado, não obstante tendo, diante dessemesmo Estado, indepen- dência financeira, administrativa e editorial (Bucci, 2015, p. 126). Emissoras públicas devemestar “a serviço do direito à informação do cidadão, não dos slogans que os governos se comprazem em difundir” (idem, p. 75). Na visão apresentada pelo autor, estações públicas de rádio e televisão cumprem um papel essencial para a democracia. Sua independência em relação ao Estado pode ser assegurada uma vez que sejam atendidos dois critérios: (1) a existência de dotações orçamentárias pró- prias, definidas pelo Parlamento, sobre as quais os gover- nos não tenham ingerência, e (2) um arcabouço institu- cional apropriado, capaz de assegurar a devida autono- mia editorial e jornalística dos veículos. (...) em outro nível, as próprias audiências irão criar seus fluxos de informação, do zero, comou semnossa ajuda. ashley highfield , ex-diretor da BBC Seria possível falar, nesse âmbito, observando-se o panorama do setor, no plano internacional, de sistemas de baixa e alta institucionalização. O Brasil, por certo, enquadra-se no primeiro caso. Nossas emissoras públi- cas tendem a permitir uma ingerência exagerada dos governos em sua gestão e orientação editorial. Exemplos de alta institucionalização são os adotados em diversos países do mundo desenvolvido. Os modelos mais conhe- cidos são o americano, criado a partir do Public Broad- casting Act, de 1967, e o britânico, que tem como res- ponsável a BBC. Na literatura sobre comunicação pública, a BBC é ampla- mente reconhecida como um paradigma de qualidade e independência jornalística. Ela é financiada pela licence fee , uma taxa anual no valor de 145,50 libras, cobrada de todo cidadão com acesso à televisão em sua residência. O recurso não é administrado politicamente, mas repas- sado de imediato à estação pública de comunicação 1 . A taxa é obrigatória e, na prática, consiste em um imposto. Pouco importa se o contribuinte aprecia ou consome a informação produzida pela BBC. Ele é com- pelido a pagar. Uma pesquisa recente, realizada pela ComRes, uma das mais respeitadas empresas de con- 1 Nos Estados Unidos, criou-se um sistema muito mais complexo e descentralizado de comunicação pública a partir do Public Broadcasting Act, de 1967. O sistema envolve o Public Broadcasting Service (PBS), voltado à televisão, e o National Public Radio (NPR), envolvendo uma rede de cerca de 900 estações de rádio locais, que abrangem virtualmente todo o país. O coração do sistema é a Corporation for Public Broadcasting (CPB), uma agência público-privada que recebe fundos aprovados pelo Congresso, bem como dos estados americanos, no valor médio de 1,35 dólar por cidadão americano, e distribui, segundo critérios técnicos, para as diferentes estações públicas. Estas, por sua vez, buscam também recursos em suas próprias comunidades. O sistema, típico da tradição americana, combina um forte componente comunitário, descentralização e independência editorial e administrativa em relação aos diferentes governos.

RkJQdWJsaXNoZXIy NDQ1MTcx