REVISTA_de_JO_ESPM 20
78 JULHO | DEZEMBRO 2017 chos do mercado com mensagens sob medida, sem ne- nhuma regulamentação. Isso é possível graças à coleta de grandes quantidades de dados e aodeclínioda privacida- de do usuário na internet. É como explica David Carroll, professor associado de design de mídia na New School: Se considerarmos como a segmentação da publici- dade é cada vezmais usada como arma, sobretudodes- de (…) que o Google e o Facebook consolidaram nosso histórico de navegação em seus IDs de usuário, e pen- sarmos emcomo qualquer pessoa nomundo podemi- rar qualquer indivíduo nos Estados Unidos compreci- são cirúrgica com base em suas suscetibilidades e in- clinações, talvez essa eleição tenha sido similar a um momento 11 de setembro, mas não violento e invisível, no qual nossa infraestrutura comercial foi usada con- tra nós e só percebemos isso depois da catástrofe. Será que em eleições futuras vai ser pior ainda? Essa capacidadedemicrodirecionamento tambémvale para o jornalismo sério. Emvez de criar audiência emseus próprios sites eusarmídias sociais para gerar tráfegoneles, ummeiohojepodesimplesmentecomprarvisualizações.A capacidadedeempresas de comprar acessoaopúblico tor- nacadavezmaisdifícil, parapequenasorganizaçõesdemí- diasemessepoderdeação,aumentarsuaaudiência.Oecos- sistemapublicitárioquepermitequenotícias falsas se alas- treméomesmodoqualcertosmeiosdependemparasobre- viver. Toda informação émonetizada damesmamaneira. Mudar essa realidadenãoserá fácil, poisuma solução te- ria de envolver decisões editoriais em grande escala, pa- ra determinar que informações são legítimas. Até aqui, o Facebook optou, basicamente, por repassar essa função a verificadores de fatos independentes. Mas essa solução se equilibra sobreumdesafioestruturalmuitomaior: uma vezque todoconteúdoédesagregadoecomercializadoem uma comunidademuito grande de troca de informações, haveria como aumentar a supervisão humana? Essaconfusãode limites entre tiposdeconteúdoeomo- do como são distribuídos e monetizados levou ao surgi- mento de muitos modelos de criadores de conteúdo, que vão desde aqueles que direcionam e monetizam a desin- formaçãoacomunidadesideologicamentedefinidas,àque- les quevendemoperfil e amicrossegmentaçãode grupos eleitorais altamente definidos. Carroll é pessimista sobre o impacto coletivodessamu- dança para a publicidade: Quemfaz jornalismonãoestácolhendoos ganhosna re- ceita, que cadavezmais vãoparaoduopólio, e essas plata- formas que distribueme lucramcoma criação de conteú- do estão ganhando o controle do setor semassumir a res- ponsabilidade de serem empresas de mídia. Se não corri- girmos isso, acabou. A atividade jornalística e a democra- cia que ela vemproteger estarão fadadas à morte. ArespostadoFacebook A princípio, Mark Zuckerberg tentou rebater a acusação de disseminação de informações falsas no Facebook du- rante a campanha. Em um post em sua página pessoal no Facebook quatro dias depois da eleição, escreveu que “mais de 99% do [conteúdo] que as pessoas veem é legíti- mo”, o que tornaria “extremamente improvável que infor- mações falsas tenham influenciado o resultado das elei- ções”. Provavelmente, é verdade. Isso posto, o Facebook contribuiu, sim, para a propagação de mentiras que se fa- ziam passar por verdade, como reconheceu Zuckerberg quatro dias depois. Emumpost no qual admitia que a de- sinformaçãoeraumproblemanoFacebook, anunciouvá- rios projetos para tentar conter o problema, incluindome- canismos melhores para a imprensa, alertas de informa- ções falsas e o fim de incentivos financeiros para criado- res de notícias falsas, ideia que certamente teria impacto nomodelo de negócios da organização. Amudança pare- cia ser ditadapela crescente revoltadopúblico, justificada ou não, com as fake news. Elliot Schrage, vice-presidente de comunicação glo- bal, marketing e políticas públicas do Facebook, foi me- nos otimista. Em um simpósio de chefes de campanha política emHarvard – a CampaignManagers Conference – no dia 29 de janeiro de 2017, Schrage admitiu que a dis- seminação de informações falsas era um problema que precisavam encarar: “Durante muito tempo, não quise- mos ter normas sobre o que era ou não digno de publi- cação, pois não nos consideramos um serviço (…) de dis- tribuição de notícias. Foi um erro!”. Na continuação, dis- se: “Esta eleição nos obrigou a questionar se é nossa fun- çãodeterminar a veracidade do conteúdo que as pessoas compartilham. E tenho de dizer a todos vocês, e é uma das razões pelas quais estou aqui, que exercer esse pa- pel dá ummedo tremendo”. Ummês depois, após uma série de aparições empúbli- co que levarammuita gente a especular que o criador do Facebook tinha ambições políticas, Mark Zuckerberg lan- çou um manifesto de 6.000 palavras sobre o futuro do Facebook e da sociedade civil: Uma imprensa forte é fundamental para a criaçãode uma comunidade informada. Dar voz às pessoas não basta – precisamos ter gente dedicada a descobrir e a analisar novas informações. Temos de fazer mais pa- ra apoiar a imprensa e, com isso, garantir que esse pa- pel social vital seja sustentável. Isso inclui incentivar o jornalismo local, criar formatos mais adequados ao mobile emelhorar o leque demodelos de negócios dos quais organizações jornalísticas dependem.
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