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REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 81 Google, Apple, Facebook, Snapchat, Twitter – e, emme- nor grau, até plataformas como LinkedIn e YouTube (do Google) – são todos publishers, e a maioria já começou a montar equipes e traçar estratégias focadas na promoção dojornalismo.OLinkedIn,porexemplo,hápoucoanunciou umaseçãode “trending topics” nosmoldesdadoFacebook. Contudo, essaprogressãoacelerada e implacavelmente lógica de resultados movidos pelo mercado dirigido não deu temposuficienteparacalibrar asconsequênciasdessa transferênciadedinheiro, funções e influênciada impren- sa para empresas de tecnologia. Em 14 anos, o Facebook passou da ideia de um universitário para, potencialmen- te, a redação mais importante do mundo. A plataforma tem só umpunhado de funcionários dedicados ao jorna- lismo, embora nenhumdeles realmente pratique o ofício. E, isso posto, as plataformas não podemerguer umfire- wall entre sua própria atividade e o jornalismo. Enquanto um Napster podia festejar a derrocada de uma EMI, Facebook, Google e Apple têm ao menos a necessidade instrumental de parecer estar protegendo o jornalismo e a liberdade de expressão. Masodesejodecontribuir paraaviabilidadedo jornalis- mo, pormais bem intencionado que seja, vai contra omo- delo e a estrutura de incentivos de plataformas. Enquanto issonãomudar, ouenquantonãohouver umesforçopara delineare incentivaroconteúdodequalidade, plataformas sociais vão seguir minando o bom jornalismo. Entraves estruturais O recente esforçopara a criaçãode instrumentos de iden- tificaçãode informações falsas ecampanhasdealfabetiza- çãodigital são iniciativas importantes e indicamque ope- radoras de plataformas começam a enfrentar problemas quehámuito têmevitado. Essas iniciativas farãodiferença tangível na qualidade da informação compartilhada em plataformas digitais e ajudarão o cidadão a lidar de forma responsável com inverdades, que continuarão existindo. Sóque essas iniciativas têmefeito limitado, pois estãodes- vinculadas dos problemas estruturais inerentes ao ecos- sistema de plataformas: o domínio quase total da ideolo- gia do vale do Silício, o efeito pernicioso do modelo eco- nômico da adtech e a opacidade da automação. Nesse contexto, é importante que a imprensa encare com seriedade quatro problemas fundamentais. COMOVIGIARUMSISTEMADE PODERAOQUAL A ATIVIDADE JORNALÍSTICA ESTÁ INCORPORADA O vale do Silício cultiva, há muito, a ideia de que as ferra- mentas e plataformas criadas por suas empresas empo- deramo indivíduo. Essasmesmas empresas, contudo, ga- nhamdinheirobasicamentevendendodadossobreocom- portamentode seususuários. Quandopropõeacriaçãode uma “comunidade global” no Facebook, Mark Zuckerberg tambémestá pensandona expansãodeuma dasmaiores empresas do mundo. Paralelamente, ao adentrar setores altamente regula- mentados (aeroespacial, automotivo, telecomunicações, segurança nacional), muitas empresas de tecnologia es- tão, cada vezmais, trabalhando emestreita parceria com o Estado, e sob direto controle deste. O resultado é que um pequeno número de empresas detém um controle considerável tanto da imprensa co- mo de setores que o jornalismo tradicionalmente cobre. Esse conflito põe em xeque a viabilidade do “accountabi- lity journalism”, sobretudo do trabalho que exige a pres- tação de contas pelos detentores do poder no governo e em empresas. Esse trabalho exige um grau de indepen- dência difícil de imaginar em ummundo no qual a ativi- dade de publicação da imprensa é exercida por controla- doras de grandes plataformas digitais. A dúvida é saber como a imprensa vai vigiar os novos nós dopoder quando essamesma imprensa depende de- les para distribuição, audiência e receita. COMO CORRIGIR INCENTIVOS PARAO JORNALIS- MONAWEB SOCIAL Em plataformas, o conteúdo é atomizado em categorias monetizáveis (anúncios, conteúdo patrocinado, publica- ções pessoais etc.) e comprado e vendido da mesma ma- neira. Nãoháprêmiopara aqualidadeda informação, ape- nas para a escala. Alémdisso, comooFacebook já informa a anunciantes, o comportamento do público pode ser in- fluenciado pela informação que este recebe. O mesmo é válidopara a influênciapolítica. Interesses de grandes em- presas de tecnologia estão reforçando a tendência a uma atomização e automaçãomaiores – duas coisas difíceis de conciliar comopapel do jornalismo comoumbemsocial. Se quiseremmanter a independência, é evidente que organizações jornalísticas terão de achar modelos de fi- nanciamento que não dependamdo ecossistema das re- des sociais. Isso pode significar utilizar plataformas co- mo ferramenta para chegar ao público e com ele se rela- cionar, mas sem depender delas para monetizar o con-

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