Revista da ESPM - JUL-AGO-2011
R E V I S T A D A E S P M – julho / agosto de 2011 32 rigor em seus gastos, chegando mesmo a desde- nhar dos que eram apegados a marcas e gastos supérfluos. Os gastos com escolaridade também demonstraram ter mais prioridade do que entre as famílias católicas. A influência dos pastores na gestãodoorçamentoera tãodiretaque, emalguns casos, era comum ter cursos de planejamento de vida de cinco anos com estratégias e metas financeiras. Um informante disse ter quebrado seus cartõesdepoisqueouviuseupastor dizer que “ cartão é ilusão e o Senhor não gosta de endividados ”. Quando o assunto eramarcas, odiscursoparecia uniforme, ninguém liga para marca. “ Eu quero é preço ”, era a resposta imediata, independente da religião. Todas as entrevistadas tinham orgulho emfalar que“ batalhavampor centavos ”, que faziam o orçamento apertado render. Entretanto, por ser umestudode campo comuma convivênciamaior ao longo do tempo, pode-se perceber que, na prática, asmarcas de alimentos eramvalorizadas. “ Aqui emcasa o café temque serPilão, senão omarido reclama logo ”. Com relação a roupas, as famílias católicas pareciammais ligadas emmarcas, mas as evangélicas não. Uma entrevistada evangélica falou com orgulho que suas roupas de cama e banho eramasmesmas do casamentode 20 anos atrás e que nunca comprava roupa “de marca” para ela. Como a pesquisa analisava a nota fiscal das compras de supermercado, nas notas de uma família católica aparecia o azeite Galo, aliás o item mais caro da nota. Ao ser perguntada sobre a escolha deste item a dona de casa respondeu que “ o arroz você tem como disfarçar, mas o azeite da salada não, depois também, o azeite vai para mesa... ”. Outro aspecto interessante desta pesquisa foi a orientação temporal, com o núcleo das famílias evangélicas mostrando um horizonte de tempo bem mais longo que no núcleo católico. Barros (2006) já havia percebido a influência da religião em seu estudo com empregadas domésticas, lembrando que no ethos protestante aqueles que alcançam riqueza material, através do trabalho árduo, podem considerar-se eleitos de Deus. Esta “moralweberiana”explicaemparteadistânciado fatalismo, muitas vezes presente no discurso dos católicos, “ Deusquisassim ”. Tambémfoinotadaem Caxias uma presença forte de empreendedorismo por partedas evangélicas. Comodisseuma entre- vistada “ nada de idas a shopping, cinemas... tudo que sobra eu invistonaminhapadaria, poisdaqui aumano eu to comprando esse terreno ao lado e expandindo ”. Uma diferença interessante, emboranão se possa generalizar, em pesquisa anterior na favela da Rocinha, na cidade do Rio de Janeiro, o discurso dos entrevistados deixava claro um relaxamento de códigos morais, pois quando perguntados se tinham o “nome sujo”, mostravam tanta natu- ralidade na resposta afirmativa que chegava a causar espanto. Já em Duque de Caxias esse era um tema sensível. Apesar de não ter sido o foco denosso trabalho, quandooassuntovinhaà tona, vinha sempre acompanhadode “ tive, mas já estou resolvendo ” ou então com pedido de sigilo “ por favor não comente com minha mãe, ela vai morrer de desgosto de souber disso ” (contadora, 48 anos). Os entrevistados deDuque deCaxias exibiamfeli- cidadeempoderusufruirdealgunsconsumospela primeira vez. Rosilda mostrava orgulhosa fotos de sua primeira visita ao Corcovado, apesar de morar a 30 minutos de lá, ter 68 anos, nunca tinha ido. Graças às excursões pagas em parcelas ela pode tambémfrequentarhotel. “ Fui paraPaulodeFrontin e agora não quero outra vida, hotel é a melhor coisa do mundo. Agente não faz cama, nemcafé e nemsei o que Há três divisões entre as denominações evangélicas. As tradicionaisvêmdoperíododaReformaProtestante,ocorri- danoséculoXVI. AsPentecostais tiveramorigememuma época de reavivamento do protestantismo nos EUA, no início do século XX. As neopentecostais, que estimulamo fiel a “procurar a prosperidade em lugar da graça”, são um fenômeno bemmais recente.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NDQ1MTcx