Revista da ESPM MAR-ABR_2007

26 R E V I S T A D A E S P M – MARÇO / ABRIL DE 2007 Consumo - esfera de manipulação ou de liberdade? sidades represadas emalto grau, sendo por suanaturezapossível apenas como uma manifestação episódica” (Freud, 1992, p. 33). A cultura do consumo, através do seu complexo arsenal de mercadorias- fetiche, oferece um modelo, ideo- logicamente construído e difundido de bem-estar e de felicidade, como sinônimos de uma situação ideal a ser atingida, alicerçada na crença da natureza humana para a felicidade, sendo essa situação ideal identificada com os valores de uma sociedade que hierarquiza e cujo reconheci- mento do indivíduo é obtido – ou não – em função dos objetos possuídos (Dantas e Tobler, 2003). A publicidade cria a ilusão de satis- fação e de soluções imediatas, gerando muitas vezes frustração e sofrimento, em função de um prazer não al- cançado ou de um desejo não satis- feito, evidenciado principalmente em comerciais que prometem mudanças rápidas ou a realização de sonhos impossíveis. Aomesmo tempo, utiliza essas informações para atingir mais profundamente o seu público-alvo, através da manipulação do imagi- nário social. ...é pela existência efetiva dos “in- divíduos”, manifesta em seus atos e suas práticas, e pela efetividade das “coisas”, que as significações se materializam e se concretizam. As significações sociais não existem no abstrato, separadas ou desencarnadas da vida social. Elas existematravés dos indivíduos – seus comportamentos, julgamentos, crenças, valores – e dos objetos que instrumentalizam suas cultura do consumo, através dos meios de comunicação, tembuscado uma estrutura homogeneizante da sociedade, padronizando estilos e criando, como mencionado no caso das lojas Ikea, uma espécie de “fast home” com seus “McMóveis”. A cultura de consumo contribui para a crença de que o “remédio” para a cura de todos os males pode ser adquirido, comprado, ingerido e incorporado. Buscou-se, no presente artigo, apre- sentar a preocupação que o tema consumo tem trazido às Ciências So- ciais, principalmente à Antropologia, à Sociologia e à Psicologia, através das abordagens assumidas por alguns autores. Ao analisar os conceitos e apresentar a influência da publicidade sobre os indivíduos, procurou-se sensibilizar profissionais de Comunicação para que os conhecimentos sobre o com- portamento do consumidor sejam utilizados comuma clara consciência do seu alcance, limitações, problemas de natureza ética e senso de respon- sabilidade social. Parte do problema parece originar-se de uma hipertrofia da necessidade de vender a todo cus- to, não importa o quê, numa versão perversa da noção segundo a qual o que importa é como se podem utili- zar determinados comportamentos psicológicos para aumentar as vendas (Veiga Neto, 1998). Os indivíduos podem enfrentar este fluxo crescente de materiais sim- bólicos mediados (Thompson, 2005) desenvolvendo uma postura seletiva, Consu o - esfera de manipulação ou de liberdade Consumo - esfera de manipulação ou de liberdade? práticas. Portanto, a conseqüência desta tese para a compreensão dos objetos de consumo é inequívoca: os bens só existem socialmente pela significação que lhes é atribuída (Silva, 2003, p.189). Esta citação de Norberto Silva vai ao encontro do conceito de Douglas e Isherwood dos bens como acessórios rituais e o consumo como um proces- so ritual cuja função primária consiste em dar sentido ao fluxo dos acon- tecimentos. Sendo assim, apesar das críticas que podemos tecer em relação à cultura do consumo como manipu- ladora de desejos e de incitação da busca desenfreada pelo prazer, não podemos ignorar que os objetos ins- trumentalizam as práticas sociais. Na realidade, o homem é fruto das suas próprias criações. CONSIDERAÇÕES FINAIS Aprodução instantânea e homogenei- zante de desejos desnuda a perversa engenharia que sedimenta a socie- dade de consumo. De posse de um saber especializado, as relações de produção e de consumo guardam o segredo de que o objeto desejado é, necessariamente, um objeto distante, e que obtê-lo, tocá-lo, possuí-lo sig- nifica retirá-lo do lugar desejante. Não se deseja aquilo que já se tem. Porém, sempre que umobjeto captura o con- sumidor, umnovo objeto se encarrega de recomeçar o processo (Jobim e Souza et al. 2000, p.105). Retomando o texto inicial deste artigo, sobre a fúria consumista dos britânicos, pode-se concluir que a

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