Revista da ESPM MAR-ABR_2007
82 R E V I S T A D A E S P M – MARÇO / ABRIL DE 2007 Entrevista Nos EUA e no Canadá essas formas de consumo “pularam por cima” de gerações, em parte porque as pessoas se sentiram, de certa forma, inadequadas. Quem não tivesse 20 mil músicas no seu iPod estaria passando ao largo da vida. A outra postura é dizer: “Recuso-me a lidar com estas coisas”. No Canadá, não tenho celular. Livrei-me dele, era demais. GRACIOSO – Você não tem? ROB – Não, mas provavelmente será a primeira coisa que comprarei quando regressar – depois de ver vocês todos, brasileiros, tão envolvi- dos, imersos na telefonia celular! GRACIOSO – Você não tem ou perdeu? ROB – Não, eu não tenho. Recu- sava-me a usar. Depois de ficar horas ao telefone, pager etc., queria colocar-me numa posição de “por favor, se quiser falar comigo, ligue no escritório, das 9h às 17h”. Esta foi minha reação individual à in- vasão cultural das nossas vidas. Uma espécie de forçar a barra para ter um “consumo virtuoso” – o virtuosismo do consumo. Às vezes, as pessoas juntam vários cacos, troços, sem um template, um modo individu- alizado, com seu próprio “aroma”, sua individualidade, ao invés de se conformar com uma nova tribo consumista. Não é fácil de fazer, com regras de consumo bem de- terminadas e preestabelecidas. Um bom exemplo é a moda. Há uma indústria solidamente estabelecida, dizendo às pessoas o que comprar, mesmo que não seja muito adequa- do à estação. Há um algoritmo para observar e seguir. GRACIOSO – Os supermercados não gostam de vendas pela internet. Quando compramos os produtos na internet, sabemos exatamente o que queremos. Já no supermercado, além daqueles itens, acabamos le- vando dez outras coisas mais. Isso é para exemplificar, simplesmente, como as pessoas se sentem, mas vai mudar. MÁRIO – Não lhe parece que toda essa conversa de internet, cyber etc., possa ser um tipo de substituição dos contos de fadas? Porque as histórias que li quando criança parecem-se com second life , Big Brother, To-E- To, Imagination, Peter Pan, What is going on? A mitologia de estar em todo lugar, saber tudo, ser outra pessoa. Será que estamos diante da concretização eletrônica dos Contos de Grimm?... ROB – Temos de ser cuidadosos, porque os contos de fadas não dizem respeito a abstrações, não são ficção. Quando os lemos como adultos, os percebemos como 100% ficcionais. Mas não as crianças; elas vêem as histórias de seres que não existem, mas são invisíveis, mági- cos, estão elididos. Minha palavra para isto é que são ficcionais. São intangíveis, invisíveis, nesse sentido. Citando Proust, a respeito desta definição de virtualidade: “É real, mas irreal-ideal, não abstrato”. Vir- tualidade é um tipo de mediação ou distinção em relação ao mundo con- creto, corpos que se podem ver, e o mundo abstrato contém personagens inteiramente fictícias. A virtualidade é “o que é real, mas imaterial”. Há um site importante, das coisas que estão vindo à existência, site sobre inovações, e-comings. Deixe-me dar um exemplo: imagine um seu amigo de muitos anos. Decorrido certo tempo, as células que formavam seu corpo físico serão totalmente renovadas, serão outras, mas o amigo é o mesmo. Materialmente, são outras células, mas o amigo é a mesma pessoa. A identidade da pessoa teve continuidade e evoluiu. Isto tudo é intangível, mas é real, sobre uma pessoa que não é fictícia. Quando pensamos do ponto de vista filosófico, as reflexões que fizeram Proust e seus seguidores? E os filó- sofos pós-modernistas, Deleuze e Guatari... Seriamente, precisamos de uma linguagem para falar destas realidades que, contudo, não são concretas, tangíveis. Os filósofos refletem: “Mas o que é inovação?” E voltam a esta categoria ontológica, que denominamos de virtual. O ciberespaço não passa da mani- festação de um determinado entusi- asmo. A virtualidade se refere a tudo que é real, porém intangível. Cons- tantemente, nas ciências sociais, lidamos com esse tipo de objeto, causas-sociais, estruturas-sociais, comunidades, tudo que diz respeito a identidade. Como os contos de fadas, são muito poderosos. Mas de “A INTERNET ESTÁ-SE TORNANDO A MÍDIA DAS MÍDIAS.”
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