Revista da ESPM MAR-ABR_2007

Roberta Dias Campos 99 MARÇO / ABRIL DE 2007 – R E V I S T A D A E S P M “desenvolvido” do primeiro mundo. Maria (18 anos) apresenta uma série de objetos trazidos, por pessoas de sua família, dos EUA: um fichário e várias canetas Coca-Cola. Por não existirem no Brasil, estes objetos eram invejados por seus colegas de infância, na escola. Se por um lado a mercadoria Coca-Cola era abundan- te e cotidiana, esses produtos eram para poucos. Essa entrevistada ainda guarda suas canetas Coca-Cola em uma caixa de lembranças, ao lado de canetas diversas. Nenhuma des- sas canetas funciona hoje em dia. A importância dessas canetas é explicitada pelo fato de comporem uma caixa onde se encontram outras “preciosidades pessoais” como a caneta da sua personagem princi- pal, da infância (Branca de Neve) ou a caneta trazida pelos pais, da Inglaterra, em um momento crítico em que seu pai esteve naquele país por questões médicas. Julia e Pedro contam histórias semelhantes sobre camisetas trazidas, respectivamente, de Israel e de Atlanta nos Estados Unidos, sede da Coca-Cola, segun- do ele mesmo nos explica. Essa mesma estratégia se encontrou manifesta em produtos bem diferentes nas gerações mais velhas. Na época em que a Coca-Cola só era vendida em garrafas de vidro retornáveis, dois entrevistados descreveram sua surpresa ao encontrar garrafas à venda no supermercado ou em bares com o logo escrito em um alfabeto estrangeiro. Isto para eles surgia como um grande mistério e acabavam por guardar essas gar- rafas em coleções para mostrar aos amigos e visitas. Para os grupos mais velhos, o acesso ao exterior durante a sua infância era raro, por- tanto, essas experiências assumiam uma importância particular. Nesse contexto de distância dos países es- trangeiros, essas garrafas ganhavam uma dimensão ainda mais especial, pois propiciavam o acesso a um mundo estrangeiro e desconhecido que chegou, por acaso, à gôndola de um supermercado próximo. Será o colecionador que nos ex- plicará o porquê deste surgimento de embalagens de Coca-Cola com alfabeto estrangeiro no mercado bra- sileiro. As empresas de catering das companhias aéreas traziam garrafas de vidro dos países de origem de seus vôos para servir aos passageiros durante as refeições. Trocavam no Brasil as garrafas vazias por novas garrafas. Esta prática está sendo substituída nas gerações mais novas pelo hábito de trazer embalagens de Coca-Cola do exterior em viagens. As preferências são por embalagens que não são encontradas aqui. Todas as embalagens descritas são guardadas em armários da sala de jantar, sala de estar ou cozinha, onde ficam estocados produtos de funções e origem diversas e menos utilizados no cotidiano: como os enfeites de natal, pratos e copos plásticos para festas e outros objetos trazidos de viagens. Em sua maioria são objetos nômades ou sem local próprio na casa. Usados apenas para testemunhar esse acesso a um mundo à parte da mercadoria Coca- Cola, um mundo para poucos. ESTRATÉGIA 2: O OBJETO VESTIDO DE LÚDICO Muitos entrevistados relatam o uso de partes da embalagem para mon- tagem de brinquedos de infância. A importância destas canetas é explicitada pelo fato de com- porem uma caixa onde se en- contram outras “preciosidades pessoais”. Para os grupos mais velhos, o acesso ao exterior durante a sua infância era raro, portanto, essas experiências assumiam uma importância particular. Nesse con- texto de distância dos países estrangeiros, essas garrafas ganhavam uma dimensão ainda mais especial. Há produtos de funções e origem diversas e menos utilizados no cotidi- ano: como os enfeites de natal.

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