Revista da ESPM_MAR-ABR_2012
m a r ç o / a b r i l d e 2 0 1 2 – R e v i s t a d a E S P M 57 S o f i a E s t e v e s ‘ Gustavo Franco da de 1970, quando as taxas de crescimento do país eram iguais às dos chineses. Em algum momento esse modelo se destrambelhou sozinho. Uma das causas pode ser a pressão da população querendo mais participação e melhor distribuição de renda que, no nosso caso, produziu a hiperinflação. Enquanto você tem crescimento, o regime autoritário é capaz de utilizar a inflação como instrumento de taxação e autofinanciamento até o momento em que a tolerância da sociedade desaparece. A China enfrenta problemas parecidos. Muita gente olha a inflação chinesa como um indício da temperatura dessas contradições. Mais dia menos dia, ela terá de enfrentar sua primavera , como a reação contra regimes autoritários que ocorreu no mundo árabe. A China vive uma espécie de hipercapitalismo: o Estado é sócio de muitos empreendimentos, mas ainda assim o mercado de trabalho funciona com base num modelo primitivo, como o capitalismo inglês do século XVIII, já que não tem pre- vidência social, orientação sindical, jornada de trabalho ou qualquer direito trabalhista. Durante quanto tempo esses mundos vão se falar e não vai haver uma tensão com relação à obtenção desses direitos? MARCONINI – Será que isso vai desem- bocar numa crise política? GUSTAVO – Nos últimos dois séculos, a globa- lização deixou tudo muito parecido. Qualquer coisa diferente ocasiona o que nós, economis- tas, chamamos de arbitragem. O Brasil está vendo as empresas migrarem para a China por conta do movimento de offshore . Isso é normal em qualquer parte do mundo. Só aqui acham que a indústria precisa ter 80% de nacionali- zação. Isso não existe mais e a China é parte desse movimento. Tudo é muito parecido em qualquer cidade domundo, que temas mesmas lojas e os mesmos padrões de consumo. Esse é o lado bom da globalização, dos padrões de vida e de práticas democráticas que garantem uma equalização mundial, sem que isso anule a cultura e a identidade dos países. GRACIOSO – Pelo que percebi, você acre- dita que o mundo acaba saindo dessa crise sem muita dificuldade. Mas o Brasil está tomando as medidas cor- retas para aproveitar esse novo mundo que vai emergir nos próximos anos? GUSTAVO – Essa é uma grande pergunta. No que é fundamental, sim. Deixamos de ser um país exótico, principalmente depois dos proces- sos de reforma que experimentamos nos anos de 1990, como a estabilização, as privatizações e a abertura de mercado. Temos problemas normais, como qualquer país emergente. No quesito democracia, somos mais avançados do que a China e a Índia, porém nosso cres- cimento está focado na base da pirâmide. Nos últimos anos, o Brasil deu uma demonstração extraordinária de maturidade institucional e democrática pelo fato de ter havido uma mudança de governo em 2002 e a política eco- nômica não mudou absolutamente nada. Isso mostra que o tripé câmbio flutuante, metas de inflação e superávit primário (associado à res- ponsabilidade fiscal) virou política de Estado, política suprapartidária. No quesito responsa- bilidade fiscal ainda temos muito a progredir, assim como na questão da moeda sadia, que tem o problema dos juros – nossa taxa de juros é a maior do mundo e isso não está correto. Já o câmbio flutuante considera que o Brasil é uma nação aberta para receber investimentos e } Deixamos de ser um país exót ico, pr incipal- mente depoi s dos processos de reforma que exper imentamos nos anos 90 ~
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