Revista da ESPM

março / abril de 2011 – R E V I S T A D A E S P M 15 } Hoje, praticamos valorização descompetitiva – se é que existe essa expressão – e, no entanto, estamos vendendo ainda mais para Argentina, Colômbia, Paraguai e Venezuela. ~ J o s é B o t a f o g o G o n ç a l v e s o presidente Lula nas suas iniciativas no campo da política externa, quanto dos que são opositores, de que tudo isso é resultado de uma ação voluntarista do presidente ou do seu ministro das Relações Exteriores. GRACIOSO – A discussão se polarizou. BOTAFOGO – Exatamente. Já existe um erro de base em relação a essa discussão. Mas certamente tivemos algumas coisas novas nos últimos anos. No campo externo, o que ocorreu na área de comércio exterior foi muito importante porque o Brasil apro- veitou a conjuntura internacional favorável associada a uma política de estabilidade ou consolidação macroeconômica, sobretudo no campo da inflação – e este é o principal mérito do Governo Lula. O Brasil soube aproveitar tanto as circunstâncias internas criadas pela estabilidade e pelo combate à inflação quanto as circunstâncias externas geradas pelo crescimento mundial e pela fome por matérias-primas e commodities . O Brasil realmente deu um salto e passou a ser um protagonista mais importante, sobretudo no fornecimento de alimentos e de matérias- -primas industriais, como o aço e o minério de ferro, daí a Vale ser a segunda maior em- presa do País. O Brasil mudou de patamar, sem dúvida nenhuma, e o ponto principal foi a consolidação da política de estabilidade e ortodoxia macroeconômica, que foi o grande mérito do governo precedente, do presidente Fernando Henrique. O presidente Lula fa- zia questão de falar em “herança maldita” quando, na verdade, foi uma herança bendita que ele recebeu. Dentro desse quadro, fica até um pouco paradoxal perguntar, mas se o Brasil cresceu tanto no comércio exterior, por que não chegou a fazer acordos comer- ciais? Acordos comerciais de livre comércio de última geração compreendem uma parte que hoje, para o Brasil, tem pouco atrativo e relevância, que é o benefício de tarifas adua­ neiras baixas por parte de quem compra os nossos produtos. Isso é pouco atrativo por- que os países desenvolvidos, como Estados Unidos, países da Europa e a própria China, já praticam políticas de tarifas aduaneiras baixas. A tarifa aduaneira hoje tem muito menos relevância do que teve no passado e, com o processo de internacionalização da produção, as cadeias produtivas hoje não são mais nacionais. Ao produzir um copo d’água, um refrigerante, uma máquina ou um telefone celular, você tem uma cadeia das peças com cinco ou dez países envolvi- dos e, na verdade, a marca é o aspecto em termos de hardware que menos conta. Tenho um Nokia, cuja marca é da Finlândia, mas provavelmente tenha peças de Cingapura, da China e matéria-prima vinda do Brasil. A cadeia produtiva é toda fragmentada em ter- mos de origem dos países. Isso faz com que a tarifa aduaneira seja praticada normalmente em níveis bastante inferiores. O que faz hoje um acordo de livre comércio? Os países in- dustriais pedem disciplinas muito mais rigo- rosas em termos de propriedade intelectual, compras de governo, liberdade de serviços e transferência de recursos financeiros. Esses são temas muito mais complicados para um país como o Brasil, que está ainda numa fase de transição para o capitalismo porque não

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