Revista da ESPM
R E V I S T A D A E S P M – março / abril de 2011 22 } O Brasil soube aproveitar tanto as circunstâncias internas criadas pela estabilidade e pelo combate à inf lação quanto as circunstâncias externas ge- radas pelo crescimento mundial e pela fome por matérias-primas e commodities . ~ ENTREVISTA interesses, se é que podem ser definidos, nas suas relações com Estados Unidos e Europa. No caso da China, o Brasil deve começar a pensar desde já como vai usar um instrumento muito poderoso que tem em mãos, que é a sua capacidade de suprir alimentos para o mundo. Não existe no mundo um país com essa capacidade e isso é irrefreável. O Brasil tem essa vocação e muita terra disponível para produzir. Hoje, com a tecnologia, é possível produzir em 100 milhões de hectares no Brasil. GRACIOSO – Aliás, quando se fala em commodities com certo desprezo como se fosse algo fácil de produzir, estamos esquecendo que os brasileiros estão dando ao mundo uma lição de aplicação de tecnologia de ponta na agricultura. Hoje, a agricultura brasileira tem mais conteúdo tecnológico do que talvez a maior parte das indústrias. BOTAFOGO – Tem toda a razão, é exata- mente isso. Por isso que aquela velha tese da CEPAL não se justifica. Já que até para vender minério de ferro, você precisa ter muito mais tecnologia embutida, desde a mineração até o transporte e a paletiza- ção. Quando passamos para o terreno da produção agrícola, nem se fala. Hoje, um frango é resultado de uma cadeia produtiva industrial, como se fosse um automóvel. A cadeia produtiva da Sadia é capaz de juntar tecnologia, insumos, assistência técnica, a parte sanitária para no fim da linha entre- gar o frango. E o Brasil ainda não sabe, não definiu como usar esse instrumento na sua relação com a China. A China já está pen- sando. Por exemplo, todo mundo sabe que a China está comprando terras pelo mundo e quer comprar terras aqui no Brasil também, na suposição de que vai precisar ser dona da terra para produzir alimentos e mandar para ela mesma. GRACIOSO – O que eles querem, na verdade, é garantia. BOTAFOGO – Garantia de suprimentos e de alimentos. Esse aspecto ainda não está definido, o próprio Brasil está em dúvida. A questão da venda de terras a estrangeiros é boa ou não? Ameaça a segurança nacional ou não? Hoje, há um debate sobre isso, inclusi- ve com proibições. Não temos uma política clara a respeito e não sei se a resposta já foi encontrada, mas não há dúvida de que esse é um problema político importante. Ainda que se diga “ninguém tira terra daqui”, o chinês e o alemão podem comprar terra à vontade, porque ninguém vai arrancar esse pedaço da terra e sair por aí com ela. Mas o fato de um chinês ser dono de vastas áreas é um problema político. Temos dois exemplos fundamentais na Amazônia. O primeiro foi a Fordlândia (área adquirida por Henry Ford às margens do Rio Tapajós, no Pará, em 1927) e o mais recente foi o Projeto Jari (idealizado pelo bilionário americano Daniel Keith Ludwig, em 1967, com o objetivo de produzir celulose às margens do Rio Jari, entre os Estados do Pará e Amapá). Mais do que isso. Havia um problema político: um
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