Revista da ESPM
R E V I S T A D A E S P M – março / abril de 2011 94 enorme. O grande dilema é que isso não depende apenas da nossa lição de casa, há o resto do mundo, a go- vernança global está muito complexa. O melhor dos mundos seria, de fato, que os Estados Unidos conseguissem se recuperar cada vezmais e ter algum entendimento com a China, que nos favorecesse no sentido do câmbio e de todos os outros temas da governança global. O próprio dólar também é o nosso problema. As incertezas inter- nacionais são grandes. SÉRGIO – Embaixador, o senhor que viveu na China concorda com as observações do professor Marconini? LUIZ AUGUSTO – Concordo em termos reais e verifico também que a China deveria estar vendendo um artigo sobre sua relação com o Brasil, se são parceiros ou competidores. São as duas coisas. Pondo a questão da desindustrialização à parte, mesmo na área industrial importamos bens de capital da China em condições que antigamente eram importados dos Estados Unidos, da Alemanha ou do Canadá muito mais baratos, o que permitia amodernização do setor industrial brasileiro e uma certa com- petitividade em outros mercados. De forma que muitas vezes o déficit com a China, em alguns setores, foi um pré-requisitopara ter saldos emoutros mercados nessesmesmos setores, esse é umaspecto. Tenho uma experiência chinesa interessante. Certa vez fui visitar uma indústria de bens de capi- tal de um empresário da nova classe empresarial chinesa. Ele disse que tinha vendido algumas máquinas de ferramenta para o Brasil e comentou: “Só há um detalhe: essa máquina na China vai gerar três a quatro vezes mais empregos do que está gerando no Brasil porque funcionará sete dias por semana, 24 horas por dia, como várias indústrias brasileiras que estão estabelecidasnaChina funcionam. Ela vai permitir que a depreciação se dê de forma acelerada, demodo que daqui a dois ou três anos poderá ser substituí- da por umamáquina nova,moderna e manter a mesma excelência, a mesma tecnologia de ponta”. Eu comentei que a questão de trabalhar sete dias por semana, 24 horas por dia coloca o trabalho em situações penosas. Ele disse que tinham de dar empregos para dez milhões de pessoas por ano, sendoquemuitas delas estãoentrando nomercado de trabalho. Segundo ele, a legislação trabalhista da China tem comopropostamaximizar ageraçãode empregos formais. Eles têmmuitapre- ocupaçãocomo inevitável êxodo rural. Em 1970, a China tinha 20% da sua população urbana e 80% rural. Hoje, 45% das pessoas moram na cidade e 55%vivemnomeio rural, numpaís de 1.315 bilhão habitantes. Ele continuou dizendo que a prioridade era gerar empregos, se isso não ocorresse, essa migração levaria à criação de slums (favelas) em torno das cidades, que trariamumaumento da informalida- de, da marginalidade e da exclusão. “E, como o senhor sabe, Embaixador, a partir daí o pulo para a violência urbana é muito pequeno.” Ao ouvir essa frase, achei que o empresário chinês estava me dando um recado... SÉRGIO – Uma das questões de- monstradas no custo Brasil são os encargos trabalhistas e sociais. Para buscar essa competitividade com o mundo, o Brasil corre o risco de perder certas conquistas sociais no âmbito do trabalho? WALTER – Confesso que sim. É o que algumas congregações atuais traduzem em encargos, como dé- cimo terceiro, férias, adicional de férias... O encargo em si, o que está na folha começou com 3% e hoje é de praticamente 40%. Esse valor pode ser transferido, ir para outro título de imposto e já foi. Se pegar- mos a marcha, quando eu comecei a trabalhar era 7% do empregado e 8% do empregador. Depois, passou para 8%, 9% e 10% de desconto do empregado. O encargo significa também outra coisa para o próprio trabalhador, que pode ter um ganho salarial, dependendo da negociação. ROBERTO – Compensação. WALTER –Aí foi uma construçãobra- sileira para financiar umdeterminado tipodeaposentadoriaeda forma como ela foi concebida, mas nas diversas coisas passou a ser Salário-Educação, passoua ser SESI/SENAI, passoua ser Seguro de Saúde e coisas desse tipo, tudo na folha de pagamento. Temos um sistema tipo árvore de natal, com muito penduricalho e não se pode chamar tudo de encargos. } Uma coisa que precisamos fazer é olhar para frente. Daqui a 30 anos, a população economicamente ativa do Brasil será de 150 milhões. ~
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy NDQ1MTcx