Revista da ESPM - SET-OUT_2007
83 SETEMBRO / OUTUBRO DE 2007 – R E V I S T A D A E S P M responsável pelo Brasil no Banco Mundial, morou em Brasília por muito tempo e fez uma bela apre- sentação sobre o Brasil visto de den- tro. Assinalei, então, o paradoxo de que ele – indiano – falava do Brasil visto de dentro, e eu passei mais da metade de 44 anos no exterior, como diplomata, vendo o país de fora. Isso nos dá uma perspectiva de como estamos no mundo e como o mundo nos vê. Dias atrás, passou pelo Rio um cientista especializado em questões européias para lançar um livro sobre o futuro das relações entre EUA e União Européia e o Mundo Ocidental, no Centro Brasileiro de Relações Internacionais. Um colega embaixador presidia e ele nos perguntou: o que é que o Brasil podia fazer para salvar o Ocidente? Perguntei se aquele senhor estava num estado normal, por que como o Brasil salvaria o Ocidente? Isso faz parte de uma atitude meio depreciativa que o brasileiro tem em relação a si próprio. É claro que ele não pode salvar o mundo, mas há coisas que pode fazer para melhorar – e a primeira delas é reconhecer-se, de fato, como Ocidente e reconhe- cer a importância das exportações, do envolvimento no cenário inter- nacional e de uma aproximação decidida com as grandes potências, que são, basicamente, do mundo ocidental. Entrei no Itamarati em 1963, quando se acreditava em um mundo dividido em três. O 3 o mundo fazia um movimento pela reforma da ordem econômica in- ternacional e o Brasil foi um dos seus grandes líderes; também com o apoio político à independência dos países africanos e asiáticos. Tínhamos, no Itamarati, a idéia de que o mundo opunha obstáculos, barreiras ao nosso desenvolvimento, e a nossa era uma plataforma “re- formista” em relação às instituições internacionais, Fundo Monetário, Banco Mundial, eram ilusões nossas - e o mundo da Guerra Fria estava dividido entre o Ocidente (desen- volvido, EUA e União Européia), do outro lado o bloco socialista e o 3 o mundo onde estávamos nós, dentro da América Latina. A emergência do Brasil era uma expressão que não se usava; havia o 1 o mundo, o bloco socialista e o terceiro mundo, subdesenvolvido. Eles é que eram bons; quando algo de positivo ocorria aqui, era “de primeiro mundo”. Uma das críticas que, hoje, faço à política externa brasileira é que nós, do Itamarati, ve- mos a nossa missão como contribuir para o desenvolvimento do Brasil para que um dia chegue a ser desen- volvido, mas parece que, por razões ideológicas e políticas, há um apego à idéia do subdesenvolvimento; queremos continuar assim e alimen- tamos ilusões de aliança com países que são, de fato, nossos grandes concorrentes. Esse pensamento re- traído teve a ver com o movimento de substituição de importações dos anos 50 – 60 – 70. Acabamos levando essa atitude protecionista muito longe e, com isso, deixamos de importar e de exportar o que seria conveniente. Eu vivi ao longo desse período várias crises que abalaram o Brasil: estava em Washington, na primeira crise do petróleo em 1973; estava em Brasília, em 1979, durante a crise latino-americana; mais re- centemente, na Alemanha, quando o Plano Real começou a estabilizar a economia, vivi a crise asiática que ocorreu em 1997 e veio bater no Brasil em 13 de janeiro de 1999, crise provocada pela sustentação de um câmbio artificial. Nesses últimos anos, vivi em Washington, onde fui relativamente feliz, com cenário comercial favorável. Chegamos atrasados, mas supera- mos o ideário nacional do desen- volvimentismo que estava por trás dessa plataforma de substituição de importações, do reformismo ilusório na área internacional. En- quanto chupávamos os dedos, na ilusão de alterar pela força a política das organizações internacionais, Coréia do Sul, Hong Kong, Taiwan souberam progredir no processo de desenvolvimento e no processo de inserção internacional. Um dado que o ministro não chegou a co- mentar, mas que é impressionante: até o início dos anos 80, o Brasil recebia sozinho 40% do total de investimentos diretos destinados a países em desenvolvimento, naquele momento a China não tinha quase nada e hoje recebem em torno de 60 bilhões de dólares; nós estamos entre 15 e 20%, o que é 1/3 do que a China recebe. O Brasil passou de uma postura de extrema retração para uma atitude mais assertiva no plano interna- cional e uma evolução interessante – que está sendo levada adiante – que é a visão da América do Sul e do seu próprio potencial. Fui a favor do Mercosul, mas olhando para trás vejo que houve excesso Ð
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