Revista da ESPM - SET-OUT_2007

88 R E V I S T A D A E S P M – SETEMBRO / OUTUBRO DE 2007 com a Balança de Pagamentos e com a Guerra Nuclear naquela época, mas para validar a Balança de Pagamentos a proposta foi “vamos então liberalizar o comérciomaisdoqueele jáécomuma rodada”, e lançou-se então a Rodada Kennedy.Amesma coisa, na época dos Acordos de Plaza em 1985, e também com uma nova rodada – que acabaria sendo a Rodada Uruguai – para limitar um pouco a voz dos protecionistas. Oterceiroaspecto–que,também,sempre influenciou muito essa visão americana do comércio internacional e do sistema multilateral – foi aquestãodaexpansãoda Europa e dos seus acordos regionais. Na verdade, os EUA sempre se preocuparam com a expansão das comunidades eu- ropéias, na época, e -cada vez que havia uma nova expansão – eles pensavam: “uma forma de controlar um pouco isso é lançar uma rodada, de forma que a gente multilateralize seja lá o que for que os europeus estejam fazendo entre eles”. Isso aconteceu em 1950 e uma vez mais quando foi criado o próprio mercado co- mum; o Kennedy se preocupou também com isso, e foi imposto para a Rodada de Tóquio; em1985, quando JacquesDelors lançou o livro branco do mercado único – isso também foi razão para se lançar a Rodada do Uruguai no ano seguinte, no começodosanos80.Durantecercade50 anos os americanos não tiveram acordos bilaterais,focavamtotalmenteaOMC;mas, no começo dos Anos 80, começaram a estabeleceracordosbilaterais,nocomeço, comoCanadá.Depois ampliaram. Chegamos ao terceiro ponto: afinal de contas o que mudou, porque estamos na situação de hoje – a coisa não anda – ou será que sempre foi assim? Meu ponto de vista, como alguém que passou dez anos na OMC, como economista, é que as coisas não são as mesmas. Não se pode dizer que o sistema “viva de crises”. O que acon- tece hoje em dia tem mais a ver com política nas relações internacionais do que propriamente com a questão de se ter ou não um acordo. Mas nunca houve uma grita tão grande de protecionistas nos Estados Unidos; eles foram capazes de quase impedir que os Estados Unidos aprovassem um acordo com a América Central (a América central representa 15% do PIB do Brasil); o Congresso já disse que não vai aprovar um acordo com a Colômbia, se não houver mais combate ao narcotráfico; já disse que não está contente com a Coréia do Norte... O déficit da balança comer- cial americana é quase do tamanho do nosso PIB: cerca de 770 bilhões de dólares e os quase 900 bilhões do nosso PIB. Isso também está levando o executivo a querer, de fato, assumir os compromissos necessários para fechar a rodada. E a União Européia está se expandindo... O que mudou afinal de contas? Em pri- meiro lugar, omundomudou– emuito. Por mais que se queira caracterizar os países em desenvolvimento como pro- tecionistas, averdadeéqueeles abriram oseucomércio,abriramosseusserviços, privatizaram, acabaram com a questão estatal emvários aspectos. Oque restou como enorme foco do protecionismo – como eu dizia antes – foi a agricultura enos grandespaíses.Quandose falaem liberalizarocomércio,osgrandesvãoter que “entregar o peixe” (falando numa forma coloquial), mas também há que se admitir que não estão em condições políticas de fazê-lo, com uma China na esquina. Se sem um comércio livre, ela já fazoque faz–nãosónanossaecono- mia,mas,sobretudo,nosEstadosUnidos e na União Européia – de que tamanho poderá ser o “estrago”? Também é im- portanteapressãodo outsourcing ,do off shore , ou seja, a idéia de que, hoje em dia, graças à telecomunicação, graças à tecnologia de informação, você não precisa ter serviço no seu próprio país, pode encomendá-lo na Índia, no Brasil, na China. Existe uma reação contra esse tipo de abertura, o movimento de profissionais, o movimento de pessoas de alta como de baixa qualificação - como “o caso do encanador polonês” na França, que causou um enorme problema (por essa razão, entre outras, nãoseconseguiuaprovar aConstituição Européia). Este tema não está fora do sistema de comércio, mas integrado ao que sechamaoAcordosobreComércio e Serviços. Hoje, indianos compram empresasdeaçonaEuropaenosEstados Unidos, disputando conosco, inclusive. Basta lembrar o caso da Gas de France, em que o Primeiro Ministro francês deu uma entrevista em cadeia nacional para dizer que “isto vai ficar em mãos francesas e não estrangeiras”, e referia- se à Itália, membro da mesma União Européia, europeus, comomesmo pas- saporte – para se ter uma idéia de como issoestápolitizado. Essasmudançasnão sãotriviais.Umadasgrandesmudanças, também, é a de que os próprios EUA tornam-se regionalistas, querem acor- dos regionais, o que explica por que acordos com a Coréia, por exemplo, não são tão interessantes. A quarta consideração são as conse- qüências disso tudo. A verdade é que o mundo hoje, para mim, é uma coisa paradoxal: o comércio nunca cresceu

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