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REVISTA DE JORNALISMO ESPM | CJR 47 Como mostrar indignação mas preservar o limite jornalís- tico entre emoção e isenção em episódios como Charlot- tesville – quando Trump evitou confrontar as ações dos supremacistas brancos? Bom, você começou a dar a resposta no final da sua pergunta. Mesmo em meio a tanta polarização, o bom jornalista deve seguir com a metodologia correta, rela- tar os diferentes lados da história, indo além do que está na superfície. Mostrar os personagens, as questões sec- tárias, os interesses de quem está sendo beneficiado eco- nomicamente com aquele conflito. Nesse sentido, a pola- rização é sempre um tema jornalístico. No dia 29 de abril, o senhor fez um discurso na Columbia University sobre os novos desafios do jornalismo após a eleição de Trump. O que aconteceu desde então? A situação piorou, porque esse presidente continua tra- tando os jornalistas como desonestos, inimigos do povo e antipatriotas. O nível de excitação de extremistas con- tra o jornalismo abre caminho para uma escalada de vio- lência. Eu não me surpreenderia se víssemos algum inci- dente, umassassinato ou outro tipo de violência contra jor- nalistas. Inimaginável que o próprio presidente trate um grupo de pessoas e seu papel na sociedade de modo tão irresponsável sem consequências. Eu disse em abril que essa administração estava seguindo o caminho que infeliz- mente o governoObama havia iniciado – até reverter pos- teriormente – de criminalizar o jornalismo em nome da segurança nacional. Isso ocorre quando o jornalista revela fatos de interesse da sociedade e é acusado de crime por expor informações contra o interesse do governo. Depois de abril, o procurador-geral anunciou que oDepartamento de Justiçamantémumrecorde de investigações criminais sobre jornalistas. Quando foi perguntado sobre a visão da administração anterior de que um jornalista não poderia ser condenado se estivesse cumprindo estritamente a sua função profissional, este procurador-geral não se pronun- ciou. Será um desafio resistir e enfrentar essa situação, porque mais revelações virão a público. A liberdade de imprensa está sob ataque no mundo? Comcerteza está sob ataque nos EstadosUnidos. À elei- ção de Trump se seguiu a ascensão de políticos autoritá- rios em diversas sociedades, aumentando o risco à liber- dade de expressão. Nos Estados Unidos, isso fez crescer o tom de ameaça ao jornalismo, mas, por outro lado, forta- leceu a relação da imprensa coma sociedade civil e os lei- tores dos veículos mais sérios. Estamos emummomento de conflito: é a primeira vez que umgoverno se opõe dire- tamente ao trabalho do jornalismo. Aqui no Brasil a imprensa vive algo parecido, com ataques semelhantes sobre sua cobertura da Lava Jato. Não acompanho amídia brasileira com frequência.Mas tenho lido a respeito do escândalo na imprensa americana e internacional. Não me sinto capaz de fazer nenhum julgamento dos meios do seu país, mas sei que há uma série memorável de revelações a respeito da Petrobras e outros casos baseados em fatos, gravações e registros de movimentação financeira. Creio que isso tudo fala por si. Eu gostaria de ouvir de um jornalista brasileiro a ava- liação sobre o papel da imprensa nessa cobertura. O que vocês acham? O trabalho da imprensa temsido bom, mas, por outro lado, para quemestá olhando de fora, deve ser difícil de entender o que realmente está acontecendo noBrasil. É inacreditável ler que, por exemplo, foram encontrados R$ 51 milhões em um monte de malas num apartamento. É surreal [risos] . Nos Estados Unidos ocasionalmente surgem escânda- los de dinheiro desse tipo, mas as somas sãomuitomeno- res [risos] . O jornalismo vencerá seus enormes desafios? Sim. O jornalismo vai sobreviver. Nas sociedades demo- cráticas, estamos no embate para manter garantias cons- titucionais e não sabemos ao certo se – e como – elas irão prevalecer ao assédio dos populistas. Aqui, nos Estados Unidos, deveremos superar essa questão e a Constitui- ção sairá fortalecida dessa crise. Porque sabemos como os princípios de um bom governo demandam transpa- rência e prestação de contas para a sociedade. Mas o que víamos como leis agora é tratado apenas como normas e o governo não mostrará mais esses registros? Acredito que a administração Trump terá que prestar contas – e haverá um fortalecimento do ponto de vista legal. E isso é do interesse de nossos dois maiores partidos e ambos trabalharão nessa direção. ■ jorge tarquini é coordenador da Pós em Jornalismo Digital da ESPM. ricardo gandour é diretor executivo da Rádio CBN e professor colaborador do Mestrado Profissional em Jornalismo da ESPM. A revolução digital derrubou barreiras e contribuiu para a diversidade e a criatividade de escritores e editores

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