Mesa-
Redonda
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REV I STA DA ESPM–
J A N E I RO
/
F E V E R E I RO
D E
2005
JR
– Seria bom iniciarmos o deba-
te com uma definição do que seja
um produto, um serviço de luxo.
MAURO
– Há muitas definições,
e gosto do que diz a Danielle Al-
lérès, diretora doDepartamentode
Gestãode Luxo eArtedaUniversi-
dade de Marne-la-Vallée, numa
definição bastante abrangente:
“Produtode luxoé todacriação fora
do comum ou trivial, extraordiná-
ria, sinônimo de beleza, estética e
refinamento, produtomágico, com
as marcas da sedução, lúdico,
evocativo de sonho, prazer e
principalmente uma promessa de
felicidade. É qualificado como
prestigioso, de alta classede luxo”.
Essa definição é em termos de
produto. Quer dizer, além das
características inerentes do pro-
duto, tem-se uma parte de promes-
saqueoprodutopodedar àpessoa
que vai usar uma imagem proje-
tiva interessantedoprodutode luxo
de quem o usa.
JR
– Será que não haveria uma
definição um poucomais simples?
LIVIA
–Atualmente, o conceito se
ampliou.Oprodutode luxo é uma
categoria, do ponto de vista do
business
. Ele é uma qualidade da
experiência. Por isso talvez, que
ela fale desse envolvimento com
sonhos, essadimensãoprojetiva.O
serviçode luxo é caracterizadopor
uma experiência excepcional. O
que se observa é justamente a
ampliação do que é, generica-
mente, chamado luxo. Só que, no
Brasil, há ainda um outro dado:
luxo passou a não mais designar
algo específico, mas é, digamos,
um conforto. Numa edição da
revista
Vogue-Brasil
, dez perso-
nalidades foram chamadas para
falar sobre luxo – Sig Bergamin,
Gisele Bündchen, entre outros –, e
o que eles enfatizaram foi exata-
mente essa qualidade da expe-
riência. A possibilidade de você,
depois de um dia tumultuado, ter-
minar o seu dia vendo o pôr-do-sol
na praia do Arpoador. Pode até
levar uma pequena garrafa de
champagne – seria perfeito. Mas o
luxo estaria na qualidade da ex-
periência e não no produto.
FG
– Gostei da definição da Da-
nielle, essa referência que ela faz
a promessas. Acho isso importante
para explicar oque leva as pessoas
a comprar produtos e serviços de
luxo. É a promessa de auto-estima
aumentada, emulação de um ído-
lo. Enfim, coisas que, de uma for-
ma ou outra, estão ligadas à
marca. Isso explica a importância
da marca, da grife nos produtos e
serviços de luxo.
ISMAEL
– Há uma definição do
presidente da Federação Francesa
de Costura que é bastante interes-
sante. Ele diz que o luxo tem alma,
que se trata um pouco de sair do
lugar comum. Esse conceito de al-
ma, da experiência, da grife, aca-
ba constituindo essa percepção do
luxo – é uma somatória de tudo is-
so. Sevocêconseguir perceber exa-
tamenteoqueaspessoascompram:
algo que as faz diferentes no grupo
de referência, através de uma ex-
periência com o produto que real-
mente traga essa percepção.
MAURO
– Houve uma evolução
na definiçãode luxo.Vi uma repor-
tagem comumpsicanalista chama-
do Jorge Forbes que diz que o luxo
sempre esteve junto àhumanidade.
Só que o objetivo do luxo, no
início, era tentar aproximar-se do
metafísico, era algo divino – uma
aproximação dos deuses. Depois,
passou por uma transformação até
chegar no iluminismo – um ponto
de ruptura, porque aí se falou da
razão, da lógica. Então desviou-se
o caminho original do luxo que
beirava a religiosidade, para um
papel paralelo à sociedade – uma
coisa superficial.
FERREIRINHA
– Esse trabalhodo
Jorge Forbes é feito em cima do
trabalho do Gilles Lipovetsky, na
verdade,oprimeiro filósofocontem-
porâneo a escrever sobre o luxo. A
grande mudança em relação ao
luxo é justamente essa: deixou de
ser comportamental, a busca pelo
efêmero –peloque era endeusado –
e hoje é uma atividade de negócios.
E como atividade de negócios, esse
universo foi ampliado. E os concei-
tosestãomeioconfusosporquesediz
que se pode consumir luxo barato;
masnãopode. Luxo temde ser caro.
Ele pode ter classificação por aces-
sibilidade, mesmo assim é caro.
JR
– Mas e aquilo que se chama
no Brasil, de “luxo de pobre”?
MAURO
– Essa padronização de
luxo– formatar-se, rotular-sedentro
de umamarca – não é a tendência
do luxo atual. Tudo envolve a
busca de uma identidade pessoal.
“HOJE,TEMOSUMAVISÃOUMPOUCOMAISDEMOCRÁTICA.”