maio/junhode2012|
RevistadaESPM
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Renato Janine Ribeiro
Gracioso
–
Você fala da falta de
bom-senso do governo, que estimula
a produção de automóveis sabendo de
todos os problemas gerados por eles.
O que dizer então de um governo que
estimula a produção de motocicletas
que estão se transformando numa
verdadeira carnificina urbana, com
centenas de mortes todos os meses?
Renato
– Tudo isso está errado.
Gabriela
–
Como resolver esta questão?
Renato
– O ponto de partida deve
ser o investimento em transporte
coletivo, junto com medidas de dis-
suasão do uso individual do carro.
Por exemplo: se o veículo estiver
cheio de passageiros, vai pela pista
expressa e não paga pedágio. Te-
mos de tirar do nosso imaginário a
utopia do carro, que é um elemento
de desejo fortíssimo para a classe
média brasileira. Aí entra a respon-
sabilidade publicitária, que estimu-
la esse “casamento” entre a minha
psique e o carro. É preciso pensar
em uma economia que seja menos
adicta ao carro. Este é um ponto que
acaba batendo muito na questão da
própria escola, porque algo que está
ficando claro é que o planeta não
aguenta um mundo em que o con-
sumo tenha toda essa relevância.
Como vamos pensar a publicidade,
que é uma atividade importante,
num mundo em que o mais sensato
é reduzir o consumo?
Gabriela
–
O caminho passa pela
educação
.
Gracioso
– Isso significa que você
defende a intervenção e o poder disci-
plinador do Estado até determinado
ponto, o que é natural. Lembro-me de
uma frase famosa dita por Winston
Churchill, durante um debate no Par-
lamento inglês: “Não existe opinião
pública. O que existe é opinião publi-
cada, e esta o governo tem o direito
de usar a seu favor”. Em outras pala-
vras, mesmo sendo um defensor da
democracia, Churchill admitia que a
intervenção do Estado era necessária
em alguns momentos. Até que ponto,
e quem determina essa medida?
Renato
– Não concordo com a sua
descrição da minha posição, porque
não estou chegando ao ponto de
defender a intervenção do Estado. O
que estou querendo expor é que um
problema sério pode ser resolvido
de muitas maneiras. Se estamos
num mundo em que o consumismo
se constitui numa ameaça para a
espécie, isso pode ser resolvido pela
autorregulação da sociedade e pelo
comedimento dos profissionais da
área. A intervenção do Estado é a
última solução. Minha preocupação
é sobretudo ética. Pense, por exem-
plo, no trabalho que as ONGs estão
fazendo. Muitas delas estão envol-
vidas com a ideia do consumo sus-
tentável e consciente, mas é difícil
convencer uma empresa a fazer isso,
porque vai contra o negócio dela. Até
quando? A economia verde já está
movimentando trilhões de dólares.
Então, existe espaço para ummerca-
do diferente. Agora, temos também
que nos acostumar a pensar numa
vida distinta da que vivemos hoje.
Por exemplo: até 30 anos atrás se
falava em redução de horas de tra-
balho devido aos ganhos de produti-
vidade. Talvez não tenha havido na
história um salto de produtividade
tão grande como nas últimas três dé-
cadas e as pessoas continuam traba-
lhando o mesmo ou até mais do que
antes. Não seria possível começar a
pensar numa vida com lazer criati-
vo, seguindo a tese do ócio criativo,
que Domenico De Masi levantou?
Com a ampliação dessa fatia de
ócio, as pessoas teriam mais tempo
para ter acesso à arte, à natureza e
ao esporte, atividades que também
gerariam uma riqueza econômica
fantástica. Nossa sociedade precisa
pensar em opções diferentes. Quan-
do ouço as pessoas discutindo sobre
a questão das horas de trabalho, que
está ligada à previdência social, vejo
“Se estamos nummundo emque o consumismo se constitui
numa ameaçapara a espécie, issopode ser resolvidopela
autorregulaçãoda sociedade e pelo comedimentodos profissionais
da área. A intervençãodoEstado é aúltima solução”