Revista ESPM Mai-Jun 2012 - NEM BABÁ, NEM BIG BROTHER a eterna luta do indivíduo contra o Estado - page 18

Revista da ESPM
|maio/junhode 2012
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entrevista
que elas só analisam como a conta
vai fechar. Agora, é preciso lembrar
que quando a previdência social
surgiu, antes da primeira metade
do século 20, foi ancorada pela ideia
de que a pessoa idosa seria recom-
pensada pela sociedade, com um
final de vida adequado, sem precisar
trabalhar até o fim. O projeto estava
associado à construção de toda uma
rede de lazer, no caso do Brasil as
colônias de férias dos sindicatos. É
um projeto de vida, não um ajuste
contábil. Ocorre que, apesar de se
ter tanta chance no mundo de hoje,
a imaginação das pessoas é usada
para pouca coisa. Quem aparece nos
jornais dizendo que podemos ter por
meta as férias das crianças ou um la-
zer melhor? Mal se ouve falar disso.
Temos poucos projetos de vida.
Gracioso
Democracia e República
são temas caros para você.
Renato
– São. Vejo que o senhor
conhece bem o que escrevi.
Gracioso
Fale um pouco sobre
a nossa democracia e a nossa Re-
pública
.
Renato
– Entendo República como
a defesa do bem comum, da “
res
publica
”, acima dos interesses pri-
vados ou de grupos específicos.
A rigor, há monarquias que são
republicanas, como as escandi-
navas, preocupadas com o bem
comum. E há repúblicas que são
autocráticas, como todas as dita-
duras pelas quais passamos. No
caso da educação, por exemplo, a
postura republicana é defender a
melhor educação possível e não os
interesses desse ou daquele grupo
que são legítimos, mas são inte-
resses locais. Por mais que esteja
convencido de que não há educação
sem professor, o objetivo da educa-
ção é o aluno. Desde o começo da
democracia na Grécia, a palavra é
associada ao povão, ao pobre. É um
regime no qual a grande maioria
com menos posses manifesta a sua
voz, que nem sempre é agradável,
com reivindicações até ásperas e
duras. A questão importante para
o estadista seria como pegar esse
cerne democrático da reivindicação
da igualdade e fazer com que isso
se manifeste em algo que não seja
destrutivo para a sociedade. Para
ser mais específico, o Brasil viveu
nas últimas décadas um processo
de inclusão social fabuloso, que
causou uma mudança na pirâmide
social. Agora, temos um losango,
no qual a classe C sozinha tem
mais pessoas que a D e a E juntas.
Isso é fabuloso e foi uma conquista
do governo Lula. O que falta para
o governo Dilma é dar uma ênfase
maior à educação e cultura, porque
o critério desse desenho é do acesso
ao consumo e o consumo, como
o próprio nome diz, é destrutivo.
Já educação é aquilo que constrói,
que ensina a pessoa a sair dos seus
preconceitos e de sua ignorância e
passar a viajar pela vida.
Gracioso
Os valores típicos da
classe média também levarão algum
tempo para cristalizar.
Renato
– São valores complicados
por incluir honestidade, aversão
à corrupção, egoísmo e desprezo
pelos pobres. São valores que têm
elementos positivos e negativos.
Numa sociedade desigual como a
brasileira, o desprezo pelo pobre é
uma chaga.
Gabriela
Para Maquiavel, o medo
é uma forma de conquistar e manter
esse poder. A educação brasileira é
muito alicerçada nesse ponto, ou seja,
não estimula o aluno a pensar. Utiliza
o medo para obrigá-lo a aprender.
Como esse ponto pode influenciar
de maneira negativa a evolução da
sociedade?
Renato
– É algo muito contradi-
tório. Por um lado, há uma grande
convicção de que você precisa cen-
trar o foco em duas ou três coisas
essenciais: ler, escrever e matemá-
tica – pontos essenciais dos quais
“Quando aprevidência social surgiu, antes daprimeirametade
do século 20, ela foi ancoradapela ideiade que apessoa
idosa seria recompensadapela sociedade”
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