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janeiro/fevereirode2014|

RevistadaESPM

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os nossos constituintes vão visar o

voto, e não o país.

Alexandre

— Alguns dos valores dos

sindicalistas que o senhor criticou são

compartilhados por uma parcela impor-

tante dos estudantes, a qual tem se mos-

trado ainda menos disposta a negociar.

Em São Paulo, alunos da USP arromba-

ram a porta da reitoria, na base da mar-

retada, porque o Conselho Universitário

não mudou a forma de escolha do reitor.

Pastore

— A juventude é parte dessa

cultura do garantismo legal. Tudo

tem de ser garantido, sem nenhuma

contrapartida de responsabilidade e

deveres. A ideia do equilíbrio entre

direitos e deveres, que há na cultura

anglo-saxônica, é praticamente des-

conhecida entre nós. No campo do

trabalho, isso é bemmais claro. Nossa

tradição trabalhista é a de estabelecer

todos os direitos por lei, e não por

negociação. Na nossa legislação, só

há dois direitos negociáveis: salário e

participação em lucros e resultados.

Todo o resto é fixado por lei, como se

fosse uma tarifação. Isso é diferente

empaíses avançados, onde uma parte

pequena é garantida por lei e o restan-

te, tradicionalmente, é negociado.

Alexandre

— Já se falou muito sobre

reforma trabalhista no Brasil, mas ela

sumiu do debate político.

Pastore

— Não vejo evolução nesse

campo. O Brasil está vivendo uma cri-

se institucional no que tange aos va-

lores que sustentam as instituições,

a Justiça do Trabalho, a legislação

do trabalho, a área educacional etc.

Nós temos uma invasão crescente

do garantismo legal, que se choca

contra a ideia de conquista negociada,

baseada no desempenho e no aperfei-

çoamento. O Brasil tem chances de ir

bem na economia, mas tem ido mal

do ponto de vista institucional.

Alexandre

— Só que muitos problemas

institucionais acabam vazando, por

assim dizer, para a economia.

Pastore

— Sem dúvida. O Brasil não

está isolado no mundo, onde parcei-

ros e concorrentes estabelecem uma

competição selvagem, baseada em

inovações, pesquisas e conquistas.

Estamos ficando isolados dessas ca-

deias globais de valor. Isso acontece

porque não temos uma estimulação

da criatividade, do desempenho.

Alexandre

— Isso resulta na estagna-

ção da produtividade da indústria.

Pastore

—A produtividade só cresceu,

na indústria brasileira, na década de

1970. Dos anos de 1980 para cá, ela

evoluiu de forma desprezível. Ultima-

mente, está parada. Parece até umele-

trocardiograma de morto, enquanto

a produtividade de outros países está

disparando, em especial a da China

e a da Alemanha — um dos países que

pagam os salários mais altos no mun-

do. Lá, a produtividade é tão alta, que

é barato pagar salários mais elevados.

No Brasil, é caro pagarmesmo os salá-

rios mais baixos. Na área de serviços,

embora a baixa produtividade não

seja tão grave quanto na indústria,

está aquém do padrão internacional.

Nossos serviços são precários e caros.

Alexandre

— O que está por trás dessa

estagnação tão prolongada da produti-

vidade no Brasil?

Pastore

— Em primeiro lugar, é a falta

de investimento em pesquisa e ino-

vação. A indústria fica defasada. Em

segundo lugar, é a baixa qualificação

média dos trabalhadores. Por último,

ainda há muita empresa que trabalha

comadministração retrógrada.

Alexandre

— O fato de a qualificação

média do trabalhador brasileiro ser bai-

xa tem relação com a entrada de muita

gente no mercado formal de trabalho?

Pastore

— O tema é bem complexo.

Uma linha de raciocínio diz que nos

últimos dez anos o Brasil estimulou

o crescimento baseado no consumo,

por meio de linhas de crédito, redu-

ção do IPI e desoneração da folha de

pagamentos. O estímulo ao consumo

gerou muitas oportunidades de tra-

balho no setor de serviços, mas, como

na maioria dos casos são serviços

de baixa qualidade, as pessoas que

entraram no mercado de trabalho

também têm baixa qualificação. En-

tão, na média geral, isso compromete

a produtividade total do país. Essa é

uma posição teórica defendida por

muitos economistas de respeito.

A ideia do equilíbrio entre direitos e deveres,

que há na cultura anglo-saxônica, é praticamente

desconhecida entre nós. No campo do trabalho,

isso é bemmais claro