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entrevista | josé pastore

Revista da ESPM

| janeiro/fevereirode 2014

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Alexandre

— Isso, por si só, não seria

negativo. As pessoas podem até não ser

qualificadas, mas é melhor vê-las incor-

poradas à força de trabalho, não?

Pastore

— Melhor dentro do trabalho

do que fora. Agora, no trabalho, elas

adicionam pouco. Em relação aos

nossos concorrentes internacionais,

elas nos deixam para trás. A corrida

é em relação a um ponto móvel. Por

exemplo: enquanto aumentamos em

1% a nossa produtividade, o coreano

registra um ganho de 5% por lá. O

alemão também, o japonês idem.

Não podemos dizer que está melhor

porque eles [os trabalhadores pouco

qualificados] estão trabalhando. Mas

em função daquilo que o país precisa,

como parte da economia global, isso

significa pouco, bempouco.

Alexandre

— O senhor começou a res-

ponder à pergunta sobre a estagnação

da produtividade falando de inovação.

Na realidade, os índices de inovação

que tenho visto estão caindo, e não au-

mentando, com a provável exceção do

setor agropecuário, no qual a inovação

é importante por conta da Empresa

Brasileira de Pesquisa Agropecuária

(Embrapa). No último ranking interna-

cional de inovação, o Brasil perdeu po-

sições e aparece apenas no 56º lugar...

Pastore

— O caso da agropecuária

foi bem lembrado, porque mostra

que, quando você investe em ideias,

como a Embrapa, a economia brilha,

o país se desenvolve e desponta como

líder mundial. Se você mantém tudo

na base da proteção, tudo garantido

por lei ou pelo Estado, os agentes

econômicos são pouco estimulados

a inovar. O Brasil sofre desse mal, se-

cularmente. Aqui, existe um excesso

de proteção. Para usar a palavra mais

certa, de protecionismo.

Alexandre

— Olhando por uma pers-

pectiva histórica mais ampla, o senhor

acredita que estamos vivendo um mo-

mento turbulento numa rota de evolu-

ção da nossa democracia que um dia

nos levará a ser uma sociedade mais

meritocrática e inovadora? Ou será que

estamos limitados, por uma questão his-

tórica e cultural, em nossa capacidade

de avançar por essa via?

Pastore

— Eu não tenho bola de cris-

tal, mas penso que o Brasil chegou

a um ponto desafiador. O modelo de

proteção pelo Estado não dá mais

conta de manter a eficiência da eco-

nomia. Não há condições de se cons-

truir uma economia mais eficiente

com esse protecionismo estatal que

inibe a inovação, a criatividade, o

desempenho, a produtividade e o

avanço. Nos últimos 20 ou 30 anos, o

mundo disparou. A produtividade da

Coreia do Sul, por exemplo, é quase

tão alta quanto a da Alemanha. O

mundo em desenvolvimento foi con-

vergindo para altos níveis de produ-

tividade. Nós ficamos estagnados. Se

nós nãomudarmos os estímulos, para

instigar mais criatividade e produtivi-

dade, o Brasil não terámuita chance.

Alexandre

— Qual é o peso de fatores

históricos na relação dos brasileiros com

o trabalho?

Pastore

— Não há dúvida de que o que

acontece hoje tem raízes no passado. O

peso da história é grande. Fomos um

país por muito tempo colonizado por

um povo extremamente autoritário,

que instigava pouco a criatividade. A

empresa moderna dá aos empregados

as linhas gerais do trabalho. Quem

tem de encontrar as soluções são eles.

Historicamente, nunca tivemos essa

cultura de autonomia. Na escravidão,

o senhor definia a tarefa específica que

o escravo tinha de cumprir. Essa raiz

histórica vai longe.

Alexandre

— Fica a sensação de que

uma parcela da nossa cultura nacional é

parte oculta do que chamamos de custo

Brasil, em termos de competitividade.

Pastore

—Concordo.

Alexandre

— De onde mais vêm essas

crenças e esses valores que fazem o Bra-

sil ser o país que é hoje?

Pastore

— Aqui vou me valer do Sér-

gio Buarque de Holanda. Temos uma

cultura que começou com o espírito

da apropriação. Ele teve um aspecto

predatório muito grande para o cres-

cimento do país no período do Brasil

Colônia. Teve também reflexos na for-

mação da personalidade do brasileiro.

Alexandre

— Aproveito sua capacida-

OBrasil está vivendo uma crise institucional

no que tange aos valores que sustentam

as instituições, a Justiça do Trabalho,

a legislação do trabalho, a área educacional