entrevista | Jorge Miguel Samek
Revista da ESPM
| janeiro/fevereirode 2014
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Samek
— As relações bilaterais entre
Brasil e Paraguai vivem ummomento
favorável. Desde a posse do presiden-
te Horacio Cartes, em 15 de agosto
do ano passado, já foram realizados
pelo menos cinco encontros entre ele
e a presidente Dilma Rousseff. Esse
entrosamento entre os dois chefes
de Estado também se reflete na área
diplomática e nas relações empresa-
riais entre os dois países. Outro fator
muito favorável é a fase de prosperi-
dade vivida pela economia do Para-
guai, que registrou em 2013 o terceiro
maior crescimento econômico do
mundo, com uma taxa de aumento
de 14,1%, de acordo com o Banco
Mundial. É sabido que a demanda por
energia acompanha de perto o cres-
cimento da economia. A economia
brasileira, por exemplo, cresceu 2,2%
em 2013, mas o consumo de energia
aumentou 3,5% e foi puxado pelo con-
sumo residencial, o que reflete o uso
de mais eletrodomésticos pelas fa-
mílias que tiveram aumento de renda
nos últimos anos. Se o Paraguai man-
tiver essa trajetória de crescimento
acelerado, logo vai utilizar para o seu
próprio consumo uma parcela cres-
cente de 50% da energia produzida
por Itaipu a que temdireito. É natural,
portanto, que as lideranças do país
expressemo desejo de aproveitar essa
abundância de energia para acelerar
o seu desenvolvimento. O Brasil deve
estar preparado para suprir o seu pró-
prio aumento de demanda, contando
com a progressiva redução do volume
de energia proveniente de Itaipu.
Aliás, Itaipu já respondeu por 25% do
mercado brasileiro. Hoje, a sua par-
ticipação é de 17%, percentual que
deverá continuar caindo em razão
da ampliação do parque gerador na-
cional e da diminuição do excedente
de energia comprada de Itaipu, que o
Paraguai não utiliza para o seu pró-
prio consumo.
Gracioso
— Itaipu Binacional é parte
de um esforço para aumentar o turismo
na região de Foz do Iguaçu. Um esforço
bem-sucedido, por sinal. O efeito cola-
teral disso é o turismo sexual e a pros-
tituição infantil. Os países da Tríplice
Fronteira acabam de anunciar que vão
trabalhar juntos no combate a esse tipo
de exploração. Esta é uma questão de
sustentabilidade para o setor de turis-
mo. Como enfrentá-la?
Samek
— Estudos mostram que di-
minuiu drasticamente, nos últimos
dez anos, o número de crianças e
adolescentes em situação de risco
social. Hoje, a sociedade brasileira
está mais consciente e atenta para
combater o problema. Em Foz do
Iguaçu, um dos principais destinos
turísticos do país, a situação social
era muito preocupante no início de
2003, quando fui convidado para
assumir Itaipu. Na ocasião, uma das
primeiras iniciativas que tomei foi a
implantação do Programa de Prote-
ção à Criança e ao Adolescente. Nos
últimos dez anos, graças às políticas
promovidas pelo governo, a mudan-
ça foi notável, especialmente em Foz
do Iguaçu. Existem problemas? Cer-
tamente que sim. Mas o turismo que
movimenta a economia da região
tem contribuído para gerar empre-
gos, renda e inclusão social. O trade
turístico de Foz do Iguaçu é um dos
parceiros mais ativos no combate à
exploração de crianças e adolescen-
tes. Oque estamos fazendo é reforçar
as iniciativas que vimos realizando
desde 2003. Uma ação coordenada
dos governos e organizações sociais
dos três países tornará mais eficaz o
esforço para erradicação da explora-
ção de crianças e adolescentes.
Gracioso
— No futuro, como deverá ser
a matriz brasileira de produção de ener-
gia elétrica?
Samek
— Nos anos 1980, foi orques-
trada uma campanha internacional
contra grandes projetos de hidre-
létricas em países em desenvolvi-
mento. Grupos poderosos e bem
financiados se mobilizaram para de-
negrir a opção brasileira pela hidre-
letricidade, sob o falso argumento de
que seria social e ambientalmente
insustentável. Com um discurso
pseudamente comprometido com a
defesa do meio ambiente, conquis-
taram importantes aliados locais em
movimentos sociais e ambientais
que defendiam interesses legítimos
de populações atingidas pela im-
plantação de projetos de grande por-
te e reivindicavam uma legislação
ambiental mais rigorosa. O Brasil
pagou umalto preço pela paralisação
dos investimentos na construção de
Reduzir o desperdício e promover a eficiência
energética não sãomedidas antagônicas.
Ao contrário, são essenciais para garantir a
soberania energética do país nas próximas décadas