janeiro/fevereirode2014|
RevistadaESPM
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para capacitar esses desempregados. Até aqui há uma
excelente adequação entre os valores e as decisões da
empresa. Porém a rede acabou comprando produtos
menos lucrativos por conta de uma recessão econômica
no setor. Os lucros caíramconsideravelmente, e os acio-
nistas exigemo cumprimentode umdos valores, o
Lucro
.
Ora, para normalizar os lucros, seria preciso cortar os
programas de
Responsabilidade Social
... Aqui também
não há uma resposta, uma vez que não há valores mais
importantesdoqueoutros.Optar por umdosvalores seria
como dizer que há coresmais importantes do que outras
ougrupos humanosmelhores doque outros. Tantoos tra-
balhadores quanto os clientes vão olhar para a empresa
e questionar: “E agora? Que valor vocês vão respeitar?”.
Nessas situações, as decisões terão de ser bem pen-
sadas e justificadas pela direção do estabelecimento.
Participação revolucionária
Oquemais incomoda a alta cúpula das organizações são
as insubordinações das novas gerações. Afinal, querem
trabalhar quando querem, da forma mais conveniente
possível e no que gostam— semusar uniforme ou roupa
social. Para manter esses funcionários na organização
é preciso ter jogo de cintura e ser bom em negociação.
Eles são os novos representantes da geração digital 2.0,
que não se enquadramnos arcaicos padrões da geração
baby boomer
. Pior, representamos novos consumidores
ativos e exigentes.
Quando esses novos profissionais digitais chegaram
ao mercado de trabalho, legitimados pela expansão da
internet, eles iniciaram os questionamentos das auto-
ridades, hierarquias e planos de carreira. Não demorou
para elesmudarema cultura organizacional de uma ins-
tituição. A nova geração de consumidores e trabalhado-
res não aceita mais ordens sem sentido, horários fixos,
produtos padronizados e metas pelas quais eles não
se motivam em cumprir — cada vez mais as empresas
investememprogramasmotivacionais, semsucesso. As
novas gerações querem conversar, questionar e propor
soluções para tudo: política, educação, produtos, servi-
ços e, para desespero dos velhos gestores, na maneira
como as empresas gerenciamseus recursos financeiros
e humanos. Se as empresas não escutamseus funcioná-
rios, elas podemperdê-los para o concorrente. Com isso,
perdem tambéma capacidade de conseguir entender os
novos públicos consumidores.
Nos últimos três anos, nossa consultoria ética em
diversas organizações constatou o anseio dos traba-
lhadores em participar ativamente das decisões que
os afetam. A figura do chefe seguro de si, experiente
e que bate metas vem perdendo lugar para a figura do
líder que conversa e cativa seus colegas de trabalho. Os
impactos dessasmudanças culturais, e as formas como
as empresas lidam com elas, resultaramno livro
O exe-
cutivo e o martelo
(Editora HSM, 2013), que trata da ética
nos negócios posicionada na contramão dos discursos
dominantes no campo.
Nossa sociedade não aceita mais respostas prontas
para seus problemas, nem o discurso de especialistas
que se propõem a responder. Não aceita mais as demo-
cracias representativas, onde escolhe porta-vozes para
lhe representaremno condomínio ou no Estado. Como
nas redes sociais, as pessoas querem ter o direito de ser
escutadas e de escolherem seu próprio destino. Não
desejammais produtos formatados, como os tradicio-
nais sorvetes de palito, querem produtos singulares,
como as sorveterias que fazem sorvetes personaliza-
dos a pedido dos clientes. Queremmontar seu próprio
hambúrguer, estilizar as roupas que compram, mudar
a cor dos celulares que usam. Os velhos discursos éti-
cos não são mais aceitos pela sua falta de sentido. São
rejeitados emnome de uma anarquia libertária que des-
constrói poderes e autoridades preestabelecidas. Não
aceitamosmais uma “ordempública” alheia aos nossos
interesses. A ética do século 21 quer ser radicalmente
democrática, inclusiva e participativa – mais humana
e menos serviçal. Na prática, isso significa que os valo-
res das organizações que sobreviverem às mudanças
serão cada vez mais negociados.
Arthur Meucci
Mestre em filosofia pela USP e doutorando em educação, arte e história
da cultura pelo Mackenzie. Psicanalista, consultor e editor-chefe do
Espaço Ética, professor de filosofia corporativa e ética do HSM e professor
conferencista da ECA/USP. É coautor do livro
O executivo e o martelo:
reflexões fora da caixa sobre ética nos negócios
(Editora HSM, 2013).
Clóvis de Barros Filho
Doutor em direito pela Universidade de Paris e doutor em comunicação
pela ECA/USP. É conferencista e consultor do Espaço Ética, consultor
de ética da Unesco, professor de filosofia corporativa e ética do HSM,
professor livre-docente da ECA/USP e coautor do livro
O executivo e o
martelo: reflexões fora da caixa sobre ética nos negócio
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