mercado de trabalho
Revista da ESPM
| setembro/outubrode 2014
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limitesdeseumodelo: “Nós identificamosuma tendência,
entre alto, médio e baixo riscos de computadorização de
ocupaçõesdeterminadas”. Ealertam: ospreços futurosdo
trabalho do capital ou da falta demão de obra “não foram
considerados”. Ou seja, estimar quantos empregos serão
automatizados “dependerá de vários fatores”. A fronteira
do conhecimento, em2014, apenas identificou uma “ten-
dência” e definiu as “ondas” de computadorização.
É essencial, portanto, ter presente entre esses fatores
duas situações bem definidas: a resistência à computa-
dorização e as “expectativas exageradas” em torno dela.
Subestimar a resistência à mudança tecnológica no
mundo do trabalho é caminho perigoso. Essa resistência
é real esecaracteriza tantoporprocessos legislativos imo-
bilizadores como por ativismos políticos, semesquecer o
peso enorme da aceitação pública dos avanços tecnológi-
cos. Quanto a processos legislativos, é preciso observar a
profundaquestãocultural entreavisãoanglo-saxônicade
menornoçãodeproteçãodoEstadoao
status quo
domundo
do trabalho (vigente, por exemplo, nos Estados Unidos,
na Inglaterra ou na Alemanha) e a maior proteção, mais
presente na cultura latina (omelhor exemplo é a França).
O ativismo político é realidade bemdiferente. É claro
que amentalidade “ludista”, encontrada na Inglaterra de
1810, de quebrar asmáquinas que “roubavam” os empre-
gos não é mais possível. Aliás, a questão não está só no
fato de ser impossível atacar fisicamente a web. O pro-
blema é que esse ataque físico é inútil! Esse ponto inibe
todo e qualquer “ludismo” contra a rede. Oativismo con-
tra amudança tecnológica se dá de outromodo. As pres-
sões regulatórias e protecionistas são fatores reais que
atrasama computadorização. Adecisão da prefeitura de
Berlimemproibir oUber, o app que permite o serviço de
compartilhamentode veículos e que émuitomais barato
queo táxi tradicional, dáumaboa ideiadecomoapressão
“regulatória” pode inibir o avanço tecnológico.
Mas não há muito exagero? Basta ver a “internet
das coisas”... Há, ainda, outro lado nesta questão da
computadorizaçãoquemerece toda a atenção: as “expec-
tativasexageradas” emrelaçãoàsmudanças tecnológicas.
No fundo, as expectativas exageradas sobreasmudanças
tecnológicas nomundo do trabalho obedecemàmesma
dinâmica das expectativas exageradas em relação, por
exemplo, à chamada “internet das coisas” e de sua revo-
lução no cotidiano de todos nós.
Tendência por tendência, a internet das coisas é tam-
bémumaperspectivadeque todososprodutosouequipa-
mentos acabeminteiramente conectados. A “tendência”
detectada é que a comunicação interpessoal será ultra-
passada pela comunicação entre asmáquinas — como os
automóveisque jásabemoque fazer paraandar sozinhos.
Mas seráque tudoé tãomaravilhosoassim?E tão rápido?
Commáquinas falando entre si o tempo todo?
O relatório “
Ciclo de hype para tecnologias emergen-
tes 2014
”, da consultoria Gartner, vai ao ponto certo ao
apontar que a expressão “internet das coisas” alcançou
o “ponto mais alto das expectativas exageradas”. Nesse
aspecto, vale pensar um pouco também na expressão
“hype”, que temo significado de “excesso” e é uma redu-
ção da palavra “hyberbole”, em inglês. Emsua coluna no
jornal
O Estado de S.Paulo
do dia 17 de agosto de 2014, o
jornalista RenatoCruz, especializado emtecnologia, foi
direto ao que importa: “O setor de tecnologia é cheio de
hype”nosentidodequeprodutosouconceitosapareceme,
de repente, passamaserdiscutidoscomoresposta líquida
ecertaa todo tipodeproblema. E, de repente, passaadire-
cionar decisões industriais, empreendimentos e investi-
mentos. Umóbvio exagero.
Foi exatamentesobre issoque tratouorelatóriodaGart-
ner. Esseestudoavalioumaisdeduasmil tecnologias, em
119 áreas, e identificou cinco estágios no “ciclo de hype”.
Emoutraspalavras, identificoucinco fasesnaabsorçãode
qualquernovatecnologia,oquechamoudeciclode“hype”.
Essas cinco fases do ciclo são: 1)
gatilho da inovação
;
2)
pico das expectativas exageradas
; 3)
vale da desilusão
; 4)
aclive do esclarecimento
; 5)
platô da produtividade
. Tradu-
zindo estas fases, teríamos: a nova tecnologia surge, pro-
voca atenção impressionante, emseguida gera decepção
muito forteesódepoisdealgumtempocomeçaasermais
bemcompreendidae“digerida”pelaspessoas.E,noúltimo
estágio, é de fato incorporada na vida delas.
Émais fácil entender essas fases comalgunsexemplos.
Ocarrosemmotoristaestáemplena fasedasexpectativas
A tecnologia surge e chama a atenção.
Em seguida, gera uma forte decepção
e depois de algum tempo começa a ser
compreendida e digerida pelas pessoas