Eduardooyakawa
Professor deSociologiadaReligiãodo cursodeRelações
Internacionais daESPM.
A recente eleiçãode BarackObama para ocu-
par a presidência dos Estados Unidos
suscita
naquelesquesededicamàreflexãosobrea
interface
religião-política, indagações profundamente rele-
vantes no que tange à exarcerbada laicização das
sociedadesocidentais industrializadas.
Sabe-sequeesseprocesso racionalizadordasações
humanas aconteceudemaneira algopeculiar nos
Estados Unidos da América. Sob os oito anos da
administraçãoBush,muito se falouda forte influ-
ênciadegruposreligiososconservadorescristãosna
articulaçãoe ideologizaçãodosnegóciosdoEstado
pretensamente laico. Ainda que a separação clara
edistinta entreEstado e Igreja tenha sidoumdos
pilares das democracias ocidentais, creditou-se a
responsabilidadepelaaçãodoidivanasetresloucada
de Bush em relação aos imigrantes, aos ambien-
talistas, aos grupos pela assunção dos direitos
humanos, a este enclave obscurantista formado
por fundamentalistas puritanos e seus pruridos
racistas exenófobos.
A eleição de Obama parece colocar fim a esse so-
lipsismo irracional e abrir a possibilidade de um
diálogo inter-religiosopautadopela aceitaçãodas
diferenças e busca incessante de consolidação de-
mocrática.Acomunidademuçulmana jácomeçou
acobrardonovopresidenteumaposturadesmisti-
ficadora em relaçãoaos seguidoresdeMaomé, en-
quantooscristãose judeusmostram-seapreensivos
quantoàelevaçãodo Islãàcategoriadeator social
legítimo. A democracia implica esse embate de
ideiase interesseseparecequeanovaadministração
tentaráestabelecerumadosemaiordetolerânciaem
relaçãoàsminorias étnicas e religiosas.
Mas o que salta aos olhos de uma certa filosofia
da religiãodecorte fenomenológico,notadamente
em sua acepção alemã, é opragmatismo religioso
deBarackObama.Nãohouveumdiscurso sequer
que ele não tenha terminado sua peroração com
o emblemáticoDeus abençoe a América... sob os
aplausos entusiásticosdasmultidões!
Mas aqualDeus aludeObama?Certamente aum
Deusconvenienteàfortunapolíticadascircunstân-
ciaseleitorais.DeusabençoeaAméricapoderiaser
traduzido então por Deus abençoe os negócios e
interessesdohomemedoEstadonorte-americanos.
Realmente é isto a racionalização da ação social
religiosanomundomoderno (se acreditarmos na
BarackObama, amorte
análise deMaxWeber). Deus −no espaçopúblico
midiático−passaa serumapalavradeordembem
comportadaeumadeliberação íntimaque sópos-
sui relevância ontológica na esfera da consciência
privadada existência.
Só a título de curiosidade intelectual caberia
perguntar, no âmbito desse pequeno ensaio, o
que significava espaço privado para a civilização
grega,berçodademocraciaocidental?Basicamente
(leia-se a reflexão prometeica de Hanna Arendt)
o espaço privado para os gregos era o espaço de
cerceamento da luz − privado de luz − onde vigia
o reino da necessidade em que os seres humanos
padeciamdaescravidão inexcedíveldosdesejosdo
corpo... edas trocascomerciais, daeconomiae seu
voraze intrínsecoegoísmo.Oespaçoprivadopara
os gregos era
Oikos
. Não é à
toa que o próprio Platão,
em sua República, al-
cunhavaaquelesque
habitavam
Oikos
deseresqueviviam
nas sombras à
mercêde suaopa-
cidade, futilidade
e insignificância.
Nas democracias
ocidentais a luz
donde jorram todas
as luzes (o tu de Mar-
tin Buber), privatizou-se
inexoravelmente.
QuandoBarackObamaentretecerumabertodiálo-
go inter-religiosonosEstadosUnidosdaAmérica,
talvezeleestejarealmentefortalecendoa instituição
democrática concebida e praticada por seres hu-
manosdísparesemultifacetados...mas, segundoa
reflexãoradicaldafenomenologiadareligiãoalemã
−notadamenteparaos seguidoresdeRudolfOtto
− Obama, como todo político profissional, terá
substituído Deus pelos interesses da Oikos, por-
tanto, terátransformadoo
mysteriumtremendum
inerente ao sagrado emmerapalavrapublicitária,
vaziade conteúdoontológico e existencial.
F
deDeus e o diálogo religioso
Mas aqualDeus
aludeObama?
Certamente aum
Deus conveniente à
fortunapolíticadas
circunstâncias
eleitorais.
cadernoespecial
