Artur
DaTavola
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S E T EMB RO
/
OU T UBRO
DE
2005 –REV I STA DA ESPM
JR
– Fala-se em liberdade de ex-
pressãopara todos.Como?Sealguns
têmmuito mais liberdade ou, pelo
menos, obtêm muito mais reper-
cussãonoquedizemdoqueoutros?
Como a grande imprensa, por
exemplo?
ARTUR
–Começo lembrandoa frase
doSamuelWainer,paramim,nodia
em que eu fui trabalhar na
Última
Hora
. Eledisse: “Olha, aqui nomeu
jornal você não tem nenhuma
liberdade”. Eu fiquei olhando para
ele.“Mas tem todaa independência”.
Eeu fiqueicomarde risoeeledisse:
“Nãoria,não.Vou lhedizerporquê:
vocênão tem liberdadeporque, em
nenhum jornal do mundo, alguém
tem liberdadeparaescrevercontraos
interessesdodonodo jornal.Masvo-
cê tem todaa independência,porque
eu nunca irei pedir para escrever a
favor das minhas idéias, do que eu
penso, dosmeus interesses”. A vida
meensinouoquanto istoé sábio.O
Samuel,aliás,foiummestreparamim.
Ele nuncame pediu para escrever a
propósitodenada.Nósdoisestávamos
cassados, acabávamos de voltar do
exílio.Resolviescreversobretelevisão,
queera,aparentemente,um temaem
que o grau de liberdade poderia ser
maior.
JR
–Aindana
ÚltimaHora
?
ARTUR
–Aindana
ÚltimaHora
. Eu
soupré-histórico,porque fuicassado,
em1964.Samueltambém.Nóssomos
pré-históricos. Para a maioria, a
cassaçãoveiocomoAI-5,em1968.
JR
–Você jáerapolítico, em64?
ARTUR
–Era, eueradeputadoesta-
dual pelo PTB – aquele PTB antigo
doRiode Janeiro– líderdaoposição
ao Carlos Lacerda, embora fosse
muitomoço; tinha 28 anos. Houve
umas comissões parlamentares de
inquérito, queriamme pegar; mas
pessoas do ladodoCarlos Lacerda,
queeramminhasamigas,aconselha-
ram-me a me cuidar, me asilar,
primeiro, edepois – se fosseocaso
– me exilar: assim fiz e fui para o
Chile.NocomeçodoGovernoCosta
e Silva, o general tentou fazer uma
abertura e disse aos brasileiros que
quisessemvoltar,queaquierao lugar
deles. Apenas dois voltaram: o
SamuelWainereeu.EleveiodeParis
eeuvimdoChile.
sobre televisão. Porque eu havia
trabalhadona televisãodoChile,eo
assuntocomunicação jácomeçavaa
explodir. Euhaviaestudado isso, no
Chile, edei aulasnaUniversidade–
oqueme obrigava a estudarmuito.
E,paraminhacompletasurpresa,um
dia sou convidado pelo Evandro
CarlosdeAndradeparaescrever no
OGlobo
–quemme trouxeoconvite
foioHenriqueCaban–aquemdisse
“mas como é que eu vou escrever
justamenteno
OGlobo
, sobre tele-
visão.Comovoupoderfazercrítica?”.
Fui conversar com o Evandro e ele
disse:“Deixa,queeuadministro isso.
Você escreve seus assuntos e eu
administro”.Então,comeceiaescre-
ver. Claro que não podia fazer o
laudatóriodaRedeGlobo–queentão
começavaa teroseu
boom
,masnão
eraaindaaenormeempresadehoje.
Mas eu também não era daqueles
intelectuais que abominavam a
televisão. Comecei aprocurar com-
preenderatelevisãobrasileira.Devez
em quando, fazia algumas linhas
críticas. O Dr. Roberto Marinho
reclamavacomoEvandroeelevinha
falarcomigo.Umbelodia,oEvandro
medisse:“PauloRoberto,vamosfazer
oseguinte:quandooDr.Robertovier
falar comigo, você vai marcar uma
audiênciaevai conversar comele”.
Eu, então, passei a ter uma série de
conversasmuito interessantescomo
Dr. Roberto, erammuito francas e
acabavam semprebem. Lembro-me
deumadelasnaqualeleestavamuito
furiosocomumacrônicaminha,eeu
propus:“Dr.Roberto,vamosfazerum
trato– jáqueeu tenhoque trabalhar,
a única atitude correta, da minha
parte, é trabalharna linhadademis-
são. Se eu fico aquémdademissão,
nãoestoucumprindoa tarefaparaa
JR
–Seuexílio foi curto, então?
ARTUR
– Foram quatro anos, mas
quatroanosmuito longos.
JR
–Você foicassado,exilado,mas–
exercendoaprofissãode jornalista–
alguma vez você teve a liberdade
ameaçada?
ARTUR
–Não.Masvivioutrasituação
curiosa. Em 1968, eu comecei a
escrever sobre televisão na
Última
Hora
;em70,a
ÚltimaHora
faliu,eu
continueinaBloch, também falando
“ELE DISSE: ‘OLHA,
AQUI NOMEU
JORNAL VOCÊ NÃO
TEM NENHUMA
LIBERDADE’.”