janeiro/fevereirode2014|
RevistadaESPM
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onde o consumidor exige sentido até mesmo da bebida
que se quer escolhida por ele.
Vivemosumturbulentomomentodetransiçãonaciviliza-
ção,quandoosindivíduossãodesafiadospormudançascada
vezmais aceleradas que dissolvematémesmo osmodelos
deconvívioquefundamentaramsociedadesporséculosou
milênios.Afamíliapatriarcal,queperdurounoBrasildesde
a chegada dos primeiros colonizadores que aqui se radica-
ram,estádesaparecendonocursoapenasdedécadas,enin-
guémaindapodesaber comoseráonovomodelo familiar.
As ideologias que incendiaram paixões no século 20
envelheceram, utopias ruíram.
Mundos desabam, novos mundos surgem de repente.
Vetustas instituições são questionadas. Valores tradicio-
nais se esfumam.Muitas pessoas estãoperplexas, outras
angustiadas,inseguras,ebuscamumapalavraqueasajude
a pensar. Sobre tudo isto que é tão relevante e desafiador
para o seu público, empresas que têm tanto poder sobre
os rumos domundo, o que dizemna fala de suasmarcas?
O que uma marca diz precisa ser significativo e rele-
vante para o consumidor. Só assim a comunicação
poderá ser contributiva para a marca. O consumidor
brasileiro está cada dia mais instruído, não apenas por
termos maior percentual da população frequentando
escolas. Hoje, o ensino já não acontece apenas nas salas
de aula. Ocorre a qualquer hora e on-line. Consumidor
mais instruído significa também cidadão mais ques-
tionador e exigente.
Recentemente, Philip Kotler disse que o marketing
precisa recorrer à antropologia, à sociologia, à psicolo-
gia. Isso é importante, mas não suficiente. Para que os
conhecimentos aportados por essas disciplinas possam
se tornar plenamente fecundos ao marketing, é pre-
ciso construir uma análise cultural, que supõe criar as
sinapses interpretativas entre as contribuições das três
disciplinas, para então chegar à compreensão do caldo
cultural em que se insere o consumidor. Essa síntese
interpretativa é tarefa da ciência do sentido, a filosofia.
Semumquestionamentosériodosentido, queéaessên-
cia do saber e da prática filosófica, o marketing corre o
risco de continuar chafurdando em chavões da moda.
Estratégia de marketing vai requerer cada vez mais pro-
fundidade e densidade de pensamento.
Tudo isso porque as marcas educam. E o fazem sem-
pre, independentemente de que o saibam ou queiram.
Deseducar é a frequente sina de quem educa sem refle-
tir sobre o que faz.
Para concluir, é preciso ressaltar que mesmo o que
possa aqui soar à primeira vista inusitado, na verdade
nada temde inaugural. Muito ao contrário. Não precisa-
mos ir longe para encontrar os precedentes. No Brasil,
mais de quatro décadas atrás, o presente artigo pouco
traria de novidade para Luiz Seabra, quando então fun-
dava a Natura, para Max Feffer, quando promovia cur-
sos de filosofia, arte e história para os gestores da Com-
panhia Suzano e para Roberto IrineuMarinho, quando
ainda jovem ressaltava a importância da filosofia e das
ciências humanas para a visãode comunicaçãodaGlobo.
Assim fazem os verdadeiros precursores. Eles sabem
enquanto muitos ignoram, e ignoram as incompreen-
sões que alguns então lhes dedicam. Eles ousam fazer
quando muitos duvidam, e seguem inovando quando
tantos passam a imitá-los.
Gustavo Pinto
Sócio da ConcretoBrasil, Inteligência de Mercado para Soluções de
Marketing
(www.concretobrasil.com.br), conferencista convidado nas
Universidades de Berkeley, Oxford, Calgary, Lausanne, Viena e Otani-Kyoto
Quemescolhe comunicar somente
pelo preço deveria refletir se essa
lhe parece ser amelhormaneira de
educar as futuras gerações
Comercial da Coca-Cola com jovens de diferentes etnias
cantando pela paz, veiculado durante a guerra doVietnã,
mostrou a crença damarca numa hora grave da história
divulgação