entrevista | JOHN HOWKINS
Revista da ESPM
| setembro/outubrode 2014
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dade da criatividade nas diferentes
áreas de produção intelectual. É
uma abordagemmais realista.
Arnaldo
— Podemos concluir, então,
que o cenário para a economia e a criati-
vidade ficou muito mais complexo neste
início de século?
Howkins
— Sim. Eu tenho trabalha-
do nos últimos 15 anos com gover-
nos, economistas e pesquisadores,
em organismos como as Nações
Unidas, e a conclusão é de que pre-
cisamos ter uma visão mais realista
de como as pessoas aplicam a criati-
vidade no desenvolvimento de suas
atividades. Hoje, eu me sinto muito
mais inclinado a fazer análise psi-
cológica, sociológica e seu impacto
nos negócios, em vez de sair atrás
de dados estatísticos.
Arnaldo
— Já que entramos no cam-
po da sociologia, eu gostaria de acres-
centar um pouco de política a este
tema. O senhor destaca a suma im-
portância da liberdade para a criati-
vidade e o livre trânsito de ideias. O
recuo geopolítico que temos visto em
situações recentes, como os conflitos
da Rússia na Ucrânia, a tensão mi-
litar em Israel, a crise entre China e
Japão e o avanço do extremismo no
Oriente Médio, põe em risco a ideia
da globalização como motor para
uma sociedade mais criativa?
Howkins
— A criatividade vive um
momento difícil em vários lugares.
Pessoas criativas ao redor do mun-
do estão sendo presas. Isso é trági-
co. De uma maneira geral, é preciso
haver um ambiente de mercado
mais aberto para que a criatividade
floresça, e isso é praticamente im-
possível em situações de grave crise
institucional, guerra civil ou fome.
A ocorrência de mais violência e
disputas políticas é claramente
um problema de primeira grandeza
para o livre pensamento.
Arnaldo
— Qual é o impacto direto da
crise econômica nesse contexto? A lenta
recuperação da Europa está inibindo a
economia criativa no continente?
Howkins
— Entre prós e contras,
eu d i r ia que não. Os governos
continuam mantendo verbas para
a manutenção das artes, museus,
institutos e companhias de teatro,
por exemplo. Cla ro que a lguns
pa íses sof reram ma is, como a
Espanha, França, Alemanha ou
aqui na Inglaterra, onde foram
feitos cortes orçamentários. Isso
prejudicou, mas creio que o im-
pacto na criatividade foi mínimo.
Desde 2008, as pessoas têm menos
dinheiro para gastar e estão con-
sumindo menos, mas a economia
criativa não trata simplesmente de
produção, compra ou venda de pro-
dutos. A criatividade se adapta à
realidade em que ela está. Em Lon-
dres, nos últimos cinco anos, nós
vimos o surgimento de uma enor-
me quantidade de estúdios digi-
tais, de design e desenvolvedores
de aplicativos. Isso está crescendo
muito rápido. Alguns setores, por-
tanto, crescem de maneira mais
acelerada mesmo com a crise.
Arnaldo
— A figura do pensador é fun-
damental para a construção de um em-
preendimento criativo. Como exemplo,
o senhor cita Jeff Bezos, que, no início
dos anos 1990, pesquisou quais seriam
os produtos mais fáceis de vender. E,
mesmo não tendo nenhuma experiência
no mercado editorial, em 1995, criou a
Amazon.com. Em sua opinião, quem são
os grandes pensadores da atualidade? E
que ideias eles estão desenvolvendo?
Howkins
— Em todos os lugares
a que eu vou — estive há alguns
d ias no Méx ico —, sempre f ico
impressionado com a quantidade
de pessoas que estão rea lizan-
do trabalhos muito criativos. Há
centenas de milhares de pessoas
fazendo isso ao redor do mundo.
Se tivéssemos de apostar em quem
seria o futuro gigante monopolista
dos negócios, como a Amazon, é
muito provável que ele virá dos
Estados Unidos. Mas há uma boa
chance de que ele venha da Chi-
na também. A li estão surgindo
empresas impressionantes, como
Alibaba [comércio eletrônico], que
já é uma empresa maior que o Fa-
cebook, e Tencent (redes sociais),
que tem um perfil muito interes-
sante. Por isso, acredito que os
novos líderes corporativos globais
virão da China.
Desde 2008, as pessoas têmmenos dinheiro para
gastar, mas a economia criativa não trata apenas
de produção, compra ou venda de produtos. A
criatividade se adapta à realidade emque ela está