Julho_2002 - page 86

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Revista daESPM – Julho/Agosto de 2002
Oded – Sempre me interessei por
questões sociais, políticas; pela co-
munidade onde vivia, pelas coisas
que aconteciam à minha volta. E
sabia que queria participar daque-
las coisas; nãoqueriaapenas rece-
ber ascoisas tudopronto, tentarme
adaptar ou sofrer passivamente.
JR – Aliás, como escreveu um
amigo meu num artigo – o
StalimirVieira–elesesentecons-
trangidode ser feliz sozinho.
Oded – E aí comecei a partir para
atividades sociais, como participar
do sindicato das empresas do pri-
meirosetor.Esempre tentei fazeras
coisasqueachavaquedeveriamser
feitas. Inclusive, isso foi um dos fa-
tores queme levarama ser umem-
presário. Eu via comoas coisas po-
deriam ser feitas e disse: eu quero
implementar minhas idéias, minhas
concepções.
JR – E qual é a origem das suas
concepções?
Oded–FizengenharianaPolitécni-
ca, depois pós-graduação naGetu-
lio Vargas. Mas se tivesse que es-
colher, de novo, não faria engenha-
ria. Fiz, porque, naépoca, asprofis-
sões eram engenheiro, advogado,
médico. E, no sindicato, via como
eram as coisas e opinava para que
fossem feitasde formadiferente.Os
colegasdiziamqueeueraumapes-
soamuito idealista,mas também in-
gênua, porque, noBrasil, as coisas
não são bem assim. Que no Brasil,
era assim. Mas eu achava que po-
dia dar certo fazendo de outra ma-
neira. Quandome convidaram para
ser o presidente do sindicato, acei-
tei, porque era a oportunidade para
colocarminhas idéiasemprática.Foi
o que fiz e acabou dando certo.
JR – Você estava financeiramen-
te independente, nessa época?
Porque, uma das coisas que os
jovens reclamaméquegostariam
de trabalhar com assuntos soci-
almente responsáveis ou mais
proveitososàsociedade,masque
nãohá dinheironessa área. Anti-
gamente, havia o cursode assis-
tentesocial.Aspessoas faziamo
curso e depois não havia empre-
go. Iam trabalhar no comércio,
nosbancos.
Oded–Quantoanãohaver dinhei-
ro nessa área, émentira. Temmui-
ta gente que já trabalha emONG.
Aqui, no Ethos, temos 30 pessoas
trabalhando e que vivem disso. Na
FundaçãoABRINQ–queeu criei –
são 60 pessoas que trabalham e
vivem disso.
JR – Esse parece ser ummerca-
do de trabalho atraente para os
jovens, porque os jovens são
mais idealistas.
Oded – Depende do jovem. Alguns
são atraídos pelo consumismo. Se
você quiser ficar rico, ter iate, fortu-
na, não vai ser em uma entidade
sem fins lucrativosquevai conseguir.
Mas você pode ter todas as condi-
ções para viver decentemente, fa-
zendo o que gosta. Quem diz que
nãovai poder sobreviver, trabalhan-
donumaONG, nãoéverdade.Pode
ser que tenha alguma dificuldade
para achar trabalho oumesmo que
não consiga. Mas muita gente tra-
balha nessa área e vive disso. Eu
escolhi esse caminho porque, para
mim, cada vezmais, viver noBrasil
era difícil sem tentar fazer alguma
coisa paramudar. Porque assistir a
tudo que a gente vê, em termos de
miséria, pobreza, injustiça, quando
se vêem os indicadores sociais no
Brasil, temos vergonha, porquenão
estamos só mal; estamos pior do
quemuitos países atémais pobres
quenós.Paramim, éatéumaques-
tão de sobrevivência porque gosto
e estou tentando fazer alguma coi-
sa para melhorar essa realidade.
Isso, pouco a pouco, foi-me envol-
vendoe vemdando sentidoaomeu
trabalho.Em1987, saí daparteexe-
cutivadaempresaepassei aganhar
bem menos. Mas pude sair como
acionista, o que me deu condições
deescolher esse caminho. Não sou
umapessoaambiciosa; nãopreciso
de helicóptero para me deslocar;
nem de um iate. Tenho exigências
normais.
JR – O iate, tudo bem. Mas, toda
vezquevenhoaSãoPaulo,come-
ço a achar que o helicóptero vai
tornar-seumanecessidade.
Oded – Sim, mas se tiver que sair
daqui para poder andar de helicóp-
“Sempreme
interesseipela
comunidadeonde
vivia,pelascoisas
queaconteciamà
minhavolta.”
“Setivesseque
escolher,denovo,
não faria
engenharia.”
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