Revista daESPM –Maio/Junho de 2002
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H
áumpostulado irrefutável: não
há um único
case
vitorioso de
Marketing que não seja relato
de uma Inovação bem-sucedida. A
Criatividade preside o sucesso em
Marketing, como, digamos, a ignição
preside, num carro de Fórmula 1, o de-
sempenho que o torna campeão (nessa
metáfora, as engrenagens do motor,
igualmente imprescindíveis, representa-
riamas funçõesdopensamento técnico,
lógico, racional).
Então, é altamente desejável saber-
mosmuito sobre essa estimada senhora
– Criatividade – para melhor conviver
com seus caprichos, eventualmente
conquistá-la, seduzi-la.Massaberascoi-
sas certas, seus segredos compen-
sadores. Não boatos, mistificações. Fa-
lemos sobre uma das mais difundidas
mistificações.
• • •
Opresenteartigocomeçouaserpro-
duzido quando escrevia meu livro
Criatividade no Trabalho e na Vida
(Summus,1997).Deparei-meentãocom
a necessidade de comentar uma grotes-
capressuposição,muitoemmodaainda
hoje, sobreaorigemneurofisiológicado
que se entende por Criatividade.
• • •
Aristóteles, sempre um precursor,
ensinava que o cérebro era um órgão
destinado a resfriar o sangue. Deu iní-
cio à longa cadeia, através da História,
de fantasias e suposições imaginosas
sobreamassaonduladaecor de rosade
1.500gramasque flutua silenciosamen-
te entre nossas orelhas.
Atualmente, apartir doúltimoquar-
tel do século XX, a falácia fisiologista
mais popular é aquela – repetida
ad
nauseam
emartigos, livrosemesmo se-
mináriosdeCriatividade–dequeopen-
samento lógico e verbal provém do he-
misférioesquerdodocérebro, enquanto
opensamentoartísticoecriativoprovém
do direito.
que chegarmos a saber pelo menos o
quanto faltaparasaber, teremosdadoum
grande passo.”
Maisainda:osneurofisiologistascal-
culamque,mesmona faseatual, estamos
usando apenas 2% ou 3% das
potencialidadesdoscircuitos integrantes
do cérebro (temgente que usamenos).
Jádaí, pergunto: como, baseadones-
se conhecimento máximo de 5% sobre
algo que só funciona, como reconheci-
do, a3%, pode-se ládesenvolver teorias
gerais sobre Criatividade, pressupondo
queelavenhadeum ladooudooutrodo
cérebro? Lembra-me a observação do
fisiologista britânico William Grey
Water, em
Mecânicadocérebro
(Zahar,
1962), quando dizia que os psicólogos
começaram “afobadamente” a pergun-
tar comoamente funciona, “enquantoo
fisiologista, modesto demais, ainda es-
tava querendo saber oque é o cérebro”.
Fatos: grandes porções de pratica-
mente qualquer parte do cérebro huma-
no podem ser destruídas sem perda de
memóriasespeciais,como lembraArthur
Koestler, em
O fantasma da máquina
(Zahar, 1969).Noscélebresexperimen-
tos de Karl Lashey, neuropsiquiatra de
Harvard, seum ratoaprendeu seucami-
nho em um labirinto, pouco importam
as partes de seu córtexque tenham sido
danificadas, ele sempre seguirá o cami-
nho correto, mesmo se arrastando ou
dando cambalhotas. Onde estará então
a memória – imprescindível tanto nos
processos racionaiscomocriativos?Ad-
mite-se hoje (
Time
, 28 de outubro de
1991) “no cérebro todo”. Em bom por-
tuguês: ninguém sabe.
Fatos: aindaquemuitomais lentodo
que um computador – processa apenas
uma informaçãopor segundo contra até
1,2bilhõesdoCray-2 (recorde)–, deve-
se ter emmente que cada
chip
de um
computador está conectado, emgeral, a
dois ou três outros, enquanto cada um
dos 10 ou 12 bilhões de neurônios do
cérebro chega a estar ligado a
centenas
de outros. Devido a essa especial fisio-
logia, océrebrooferece, às informações
que processa, 10
800
caminhos diferentes
Creio ter base para alegar que isso,
em última análise, é pura inconsistên-
cia, para dizer omínimo.Vamos lá:
A despeito de avançadas experiên-
cias que se fazemhoje no estudodo cé-
rebro;dedescobertasbioquímicasquan-
to,porexemplo, amoléculasestruturais,
comoaserotonina,na raizdecertasemo-
ções; ou mesmo da aferição, por
tomografia, de doenças mentais, tudo
acrescido aindade especulações, àbase
de“os cientistas supõemque...”o fatoé
quehápostulados científicosmaisbási-
cos, anteriores a tudo isso.
Eopostuladomaisbásico, aquede-
safio que se encontre qualquer contes-
tação séria, é o seguinte: ninguém sabe
hoje, realmente,
o que
é o cérebro! Se-
quer se ele é um órgão químico ou elé-
trico.Trata-sedamatériademaior com-
plexidade do universo. Mesmo um au-
tordevulgarizaçãocientífica, comoCarl
Sagan, já notou que seriamais fácil, no
futuro, reproduzir em laboratório a
complexíssimamoléculadoDNAdoque
umcérebrohumano.Noticiandoaaber-
tura da atual Década doCérebro, o J
or-
nal do Brasil
, de 15 de setembro de
1991, informa,depoisdepesquisas: “Há
quem diga que a ciência conhece ape-
nas5%dasatividadescerebraiseoutros
que consideram essa proporção absur-
damenteexagerada”.Eentrevistaobió-
logo Rafael Linden: “No momento em
“Tal indivíduo
seriaumgrande
excêntrico,
infensoatécnicas
modernasde
marketing,digno
deserdemitidono
primeirodiade
trabalho!”