Maio_2009 - page 41

mundial.Tantoassimqueos juristasde
Salamancacriaramaconcepçãojurídica
deuma res-públicamundial eCarlosV
dizia“nomeuimpérioosolnãosepõe”,
porque ia desde o extremoOcidente,
que é aAmérica, ao extremoOriente,
queéo Japão.Os teóricosdesseprojeto
sedividem.Um éofilósofodo estado
modernoThomasHobbes: “nósvamos
criar a unidade domundo a partir de
uma potência que submete a todas as
demais, é amão fechada que contém
a areia, se ela abre amão, ela perde
areia;apartirdeumapotênciamundial
seunificaomundoeassimcriamosum
tipodeglobalização”.Asegundaestáno
último grande texto filosóficode Kant,
quesechama
Apazperpétua
.Kant,pela
primeiravez, propõeem termosfilosó-
ficos, uma repúblicamundial, fundada
em trêsvalores:oprimeiroéahospitali-
dade, onde todomundo temdireitode
ser aceito e tem dever de acolher que
somos filhos da terra; segundo, elediz
que “oarco-íris queDeus nos deu são
osdireitoshumanos”,que fazcomque
cadapessoasejaumfimenãoummeio
paranada.Ea terceiraéa formademo-
cráticadeorganizar-nos onde todos os
cidadãospodemedevemparticipar.Aí
teremos uma república feita demuitas
nações, mas constituindo ummundo
só–epormeiodevalores éticos.Mas
ficounosonhoenão triunfou.Massão
osdoisgrandesmodelosteóricosdeKant
eHobbesqueprevalecem.Talvezagora
secrieachance–pelacriseecológica,
pelos limitesdopróprioPlanetaTerra...
Gracioso–Aprópriacriseeconômica...
Leonardo – A crise econômica
mostra que talvez devamos criar, não
digoumpodercentral,masorganismos
centrais que cuidem da única casa
comum que temos, que é o Planeta
Terra;quedistribua,deformaequitativa,
os recursos escassos que temos, não
renováveis; que os renováveis sejam
cuidadosparaquesereproduzam,eque
garantamoprojetoplanetáriohumano.
Caso contrário, vamos extinguir a hu-
manidade. Coisa aqueAlainTouraine
chamou atenção, no seu último livro,
Podemos viver juntos?
Escreveu: “tal-
vez não vamos viver juntos porque os
poderosos poderão criar umMuro de
Berlim, de ponta a ponta do planeta,
onde20%dahumanidadevãousufruir
de todos os frutos da tecnociência, da
biotecnologiaeviveraté130anos,que
é a idadedas nossas células. E aoutra
parte é a humanidade deixada por si
mesma– talveznemmaisconsiderada
damesmaespécie; enãoé impossível
que a humanidade se divida em duas
porque os ideais de igualdade nunca
foram fortes emnenhuma cultura. Por
issoelediz“umdosdesafiosmundiais
hojeémanterunidaaespéciehumana”.
Gracioso–Com tudo isso,édecep-
cionantever que, napróxima reunião
doG20, apreocupaçãodominante é,
simplesmente, encontrar uma nova
regulaçãopara o sistema bancárioou
financeiro. Como estão longe de per-
ceberagrandezadosproblemas!
JRWP–SegundoMillor,esteassuntofoi
equacionadoporBrechtnumafrase:“o
queéumassaltoaumbanco,diantede
umbanco?”Queriasabersevocêsassis-
tiramaofilme
Ensaiosobreacegueira.
Leonardo–Não.
JRWP –Acho que ele trata um pouco
disso.Menosprezamos a ideia de que
“pensar que as pessoas serão solidá-
rias é umamaneira idealista de ver as
coisas, portanto utópica”. Aí invocam
(erradamente) Adam Smith, dizendo
que, se as pessoas perseguirem seus
objetivos egoístas, isso resultará num
certoequilíbrio.Parece-mequeosdois
extremos estão sofismando alguma
coisa.Paraondevamos,realmente,para
queomundonãoacabe,paraquehaja
sustentabilidadeeparaque as pessoas
seentendam?
Leonardo–Creioquechegamosna
última trincheira,porque–nodia14de
setembro–estourouabolhae surgiua
crise econômico-financeira; nodia 23
desetembro,osorganismosqueacom-
panhamoestadodaTerrarevelavamque
o consumo humano passou em 30%
dacapacidadede reposiçãodaTerra,o
quesignificaquenós,hoje,precisamos
de umaTerra inteira emais 30% (que
não temos) paraatender asdemandas,
principalmente dos consumistas. Sig-
nificaqueaTerrachegouao seu limite
e realiza-se aquiloqueMarx escreveu
no terceiro livrode
O capital
(que, de
acordocomChomsky,éosegundolivro
maislidoatualmentenaEuropaenosEs-
tadosUnidos).Marxanalisaaseventuais
crisesdocapital financeiroedizquea
tendência do capital é destruir as suas
duasfontesderiquezaedevida:aforça
de trabalho substituídapelamáquinae
devastaranaturezaaopontodenãose
conseguirmaisexplorá-la.
Gracioso–Marxdizia isso?
Leonardo–Sim.Elepreviuqueosis-
temacujadinâmica internaeraexplorar,
de forma ilimitada, anaturezaea força
de trabalho.Eoprojetodocapitaléacu-
}
As religiões são formasde resistênciaà
globalização, especialmenteo Islã.
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maio
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junho
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2009 – R e v i s t a d a E S P M
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Leonardo
Boff
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