Revista ESPM JUL AGO 2012 - Comunicação Integrada espetáculo à procura de maestros - page 63

julho/agostode2012|
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começou a sua decadência em relação a empresas como
a Fuji Photo FilmCo. Com o tempo, foi ultrapassada pelos
concorrentes, que investiram no mercado digital e desen-
volveramnessaáreacâmerasmuitosuperioresàsdaKodak.
A era digital encurtou os tempos emultiplicou as possi-
bilidades.Agrandemaioriadosconsumidoresdehojequer
apertar o botão e, caso decida fazer algo com o resto, ter a
opção de fazê-lo por si mesma.
A reinvenção do fotógrafo amador
AanálisedeBourdieudestacava,em1965,umafortecorre-
lação entre fotografia e integração grupal. A câmera com-
pacta de Eastman foi o primeiro passo nessa direção, que
tem sido potencializada nos últimos anos coma invenção
de câmeras digitais compactas, celulares e outros disposi-
tivos comcâmera. Fotografar ficoumais barato namedida
emque épossível ter acessovirtual imediatoàs imagens e,
eventualmente, imprimir asmelhores.
Acrescenteexposiçãoàcâmera,poroutrolado,temsido
responsávelpelatransformaçãodasimagensemparâmetro
de beleza por excelência. Cada vez mais, ser bonito é ser
fotogênico. Nesse sentido, Susan Sontag já dizia, há quase
30 anos, que omedo de ser fotografado já não passava pelo
temor de ficar sem alma, senão pela possibilidade de ser
reprovado pela câmera.
Oque esta autora não conseguiuprever foi que na era do
Photoshopnãohámaneiradenãoserfotogênico.Aimagem
desimesmo, como todasasoutras, é facilmentemanipula-
da, modificada, reinventada.
Mas,aindaassim,Sontagnãoestavaerrada.Atecnologia
foi capaz de criar ferramentas capazes de nos tornar tão
fotogênicos quanto desejemos e, no entanto, o temor de
sermos reprovados pelo outro aumenta entre as novas ge-
rações,compelidasarevestirdeumcarácterinovadorcada
pequeno detalhe das suas vidas, exibindo suas aventuras
cotidianaspublicamentenasredessociaiscomosefossem
eventos promovidos pormeio de ações demarketing.
Um lado positivo desse avanço tecnológico é o de ter
permitido a um número crescente de pessoas com acesso
à internet ser potencialmente capaz de escrever e publicar
umlivro,comporedivulgarmúsicas,fazervídeos,construir
páginas na web e tantas outras atividades criativas.
Embora a análise de Bourdieu seja interessante e até
certo ponto pertinente, cabe destacar umaspecto que este
autor não levaemconsideração: a iniciativadeEastmande
lançarumacâmeraportátildebaixocusto,quepudesseser
utilizada por qualquer leigo, foi pioneira nomovimento de
democratização do acesso à tecnologia.
É importante, neste ponto, lembrar das assertivas de
Umberto Eco em
Apocalípticos e integrados
(Perspectiva,
2008), onde ele afirma que, no nível da circulação das
ideias e dos valores culturais, não ocorre a cristalização
reformista que pode ser encontrada na base socioeconô-
mica. O exemplo que ele nos fornece no livro
Obra aberta
(Perspectiva, 2001) é contundente e esclarecedor: se
perante uma ameaça de greve é aumentado o salário dos
trabalhadores de uma fábrica, é possível que esta solução
evite a ocupação do estabelecimento. Mas, se umpolítico
ensina os membros de uma comunidade de analfabetos
a ler, para que tenham acesso ao seu ponto de vista, nada
impedequeno futuroessesmesmos camponeses tenham
contato, também, com outros discursos.
A miopia dos executivos da Kodak foi não terem sido
capazes de reinventar a empresa sem perder de vista o
rumoditadopeloseu fundador, falecidoem1932. Eastman
estavacertoem1888econtinuacertoem2012: ademocra-
tizaçãodoacessoà tecnologiaéumcontextopropíciopara
osurgimentodenovosconsumidores.Sendocoerentecom
as suas origens, é para o surgimento desses personagens
que as estratégias da Kodak deveriam apontar. Afinal,
comoconclui TheodoreLevitt no famosoartigo
Marketing
myopia
(
HarvardBusiness Review
, Jul/2004), “aorganização
precisa aprender a considerar sua função, a aquisição de
clientes e a realização de ações que levarão as pessoas a
querer trabalhar com ela. Seu presidente precisa saber
exatamente onde deseja chegar, assegurando-se de que
todaorganizaçãoestejaentusiasmadaecientedisso”. Para
Levitt, esse é umdos principais requisitos para a lideran-
ça: “A menos que ele saiba para onde está indo, qualquer
caminho o conduzirá a esse local. Se qualquer caminho
serve, então o dirigente máximo da empresa pode muito
bemarrumarsuapastaeirpescar.Seumaorganizaçãonão
souberounão tiver interesseemsaberparaondeestá indo,
não precisa fazer propaganda desse fato com um chefe
protocolar. Todos irão perceber bem rápido”.
Valeria Ravier
Antropóloga, consultora de marketing
com MBA pela ESPM/SP e escritora.
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