Revista da ESPM
| julho/agostode 2012
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Branding
Aevoluçãodas
campanhas
publicitáriasdessa
empresacentenária,
queacabousuperada
pelaprópria invenção:
a imagemdigital
produzidapelo
fotógrafoamador
despertando uma sutil dimensão que se lança em direção
à subjetividade de cada espectador, aguçando o seu desejo
de ver alémdoespaçoedo tempoque essa imagemcongela
e imortaliza.
Dessepontode vista, a fotografianão émera representa-
çãodarealidade,senãolinguagem,narrativa,interpretação
deumfotógrafodestinadaaserrevisitadatodasasvezesem
que houver um interlocutor.
Quem aperta o botão?
Nadécadade 1960, aKodak encomendouumapesquisa ao
sociólogo Pierre Bourdieu, cujas conclusões seriam publi-
cadas na França, em 1965, sob o título
Uma arte mediana:
ensaio sobre os usos sociais da fotografia
(
Un art moyen: essai
sur les usages sociaux de la photographie
).
Bourdieu é um pensador que retoma e, de certa forma,
mantém a ideia da objetividade no campo sociológico,
afirmando, no entanto, que essa objetividade se constrói e
perpetuaatravésdassubjetividades.Énessesentidoqueele
entendea fotografiacomoumprodutosocial quecontribui
fortementeparaacontinuidadedossistemasdepercepção,
pensamentoeapreciaçãoexistentesque,deacordocomele,
se fundam em valores estéticos e éticos da classe à qual o
fotógrafo aficionado está subordinado e que este, por sua
vez, ajuda a reproduzir.
As proposições de Bourdieu nesse estudo não se apli-
camunicamente aomeio fotográfico, representando certa
exemplificação da sua teoria no campo da fotografia, mais
precisamente da fotografia leiga encontrada nos álbuns
de família. No fundo, a ideia de que a fotografia seria uma
atividade cultural menor emrelação a outrasmais exigen-
tes é tambémuma crítica àquele personagemque a Kodak
ajudouacriarequefoiofocoperseguidopelaempresadesde
o início, o fotógrafo amador.
A perspectiva analítica desse autor destaca, de outro
ângulo,arelaçãoqueomeiofotográficoguardacomareali-
dade.Paraele,ofatodequetodaimagemfotográficaserefira
a uma cena que realmente ocorreu, – e de algumamaneira
continua ocorrendo graças ao impacto que essa represen-
tação provoca no espectador – torna essa prática cultural
especialmente eficaz na interiorização da objetividade e
consequente reprodução de subjetividades objetivadas.
O que fazer com o resto?
Em janeiro de 2012, mais de 120 anos após Eastman ter
enunciado aquelas oito palavras mágicas, a Kodak entrou
com um pedido de concordata. Pessimistas enxergam a
atitude comoofimde umimpério. Otimistas a veemcomo
mais uma tentativa de se manter nos negócios. Todos pa-
recemconcordar como fatodeque a empresanão soube se
reinventar na era da fotografia digital.
O estudo de Bourdieu na década de 1960 e o próprio
mercado, a partir do ano 2000, puseramemxeque, respec-
tivamente, cada uma das afirmações de Eastman.
Quemapertaobotão?Quemfazoresto?Aparentemente
os executivos da Kodak não souberam enfrentar esses di-
lemas. Amarca foi criadoradaprimeira câmeradigital, em
1975, época em que a empresa detinha 90% do mercado e
os seus lucros vinhamdos produtos químicos edosfilmes.
Mas naquele momento ela recuou diante da possibilidade
deinvestiremumlançamentoquepudesseprejudicaroseu
negócio tradicional. Pouco tempo depois, nos anos 1980,