Revista ESPM - maio-jun - Brasil Assombrado. Que caminho seguir. - page 42

entrevista | Maílson da Nóbrega
Revista da ESPM
|maio/junhode 2013
42
com poucas barreiras à inovação,
ao empreendedorismo. Basta tomar
o caso do gás de xisto. A tecnologia
do fracking (usada para extrair gás
natural a grandes profundidades) já
existia há vários anos quando um
empreendedor sozinho desenvol-
veu o mecanismo em “L” e barateou
tremendamente a produção de uma
hora para outra. Vai ter uma explo-
são, e os Estados Unidos têm gás, só
em reservas conhecidas, para mais
de cem anos. Dizem que, em oito a
dez anos, eles serão autossuficientes,
não precisarão mais importar. Isso
vai gerar mudanças geopolíticas
tremendas. Coisas como essa aconte-
cemquase exclusivamente na econo-
mia americana.
Alexandre –
A rigor, os Estados Unidos
já estão saindo da crise, certo?
Maílson –
Há muitas dúvidas ain-
da. Os indicadores são dúbios. Mas
algumas coisas estão se enraizando
e sinalizam um processo de recu-
peração inequívoco. Por exemplo,
a desalavancagem das famílias.
O crédito volta a fluir. Segundo, a
volta do dinamismo no mercado
imobiliário. Os preços de imóveis
se estabilizam ou começam a subir
de novo. Os estoques de imóveis
estão acabando ou voltando a pa-
drões normais. A confiança do con-
sumidor está se ampliando. Tudo
isso sinaliza para um processo de
recuperação. Quem é pessimista
hoje fala que a economia americana
vai crescer perto de 2%, 2,5%. Mas,
no próximo ano, serão 2,5% a 3%. Se
você olhar para a Europa, ninguém
aposta num crescimento desse
nível nos próximos dois anos. Os
sinais são de que a economia ameri-
cana sairá primeiro da crise.
Alexandre –
Há um modelo para o
pós-crise ou a receita é mais do mesmo?
Maílson –
É mais do mesmo, com
eliminação dos excessos e equí-
vocos. Todas as crises levam a um
processo de revisão. As crises finan-
ceiras são características do sistema
capitalista. Hoje, não tem crise nem
banco quebrando emCuba. Também
não tem sistema financeiro. Nem
tampouco prosperidade.
Alexandre –
Os formuladores da polí-
tica econômica brasileira não parecem
acreditar que a receita para o pós-crise
seja mais do mesmo. Parece estar ha-
vendo uma mudança de orientação na
política econômica, usando a crise de
2007 e 2008, em parte, como pretexto.
Ma í lson –
A presidente Dilma
Rousseff tem legitimidade para pro-
mover essa mudança. Ela foi eleita,
tem poder e o direito de pedir que a
gente espere. Ela está dizendo que
a política mudou. Guido Mantega, o
ministro da Fazenda, fala em uma
nova matriz econômica. Tem gente
achando que vai dar certo. Eu acho
que não vai dar.
Alexandre –
O país estaria vivendo,
por essa lógica, as dores de uma tran-
sição de modelo?
Maílson –
Sim.
Alexandre –
Inflação fora da meta
prevista, preocupação com as contas
externas, a desindustrialização, tudo
isso seria parte da adaptação a um
novo modelo?
Maílson –
As dores do parto de uma
nova realidade. Esta é a mensagem
que vemdo governo.
Alexandre –
Quais as características
dessa nova realidade econômica?
Maílson –
Primeiro, taxas de juros
baixas, decididas politicamente.
A presidente Dilma acredita que a
taxa de juros é um componente pas-
sível de ação governamental, e não
consequente de um determinado
conjunto de condições ambientais.
Então, ela decide que a taxa de juros
vai cair e tem, neste momento, um
banco central submisso. Esta é uma
característica [
da nova realidade
econômica
]: ação política sobre o
Banco Central. E a migração do cen-
tro de decisão sobre a taxa de juros
do Comitê de Política Monetária
para o Palácio do Planalto.
Alexandre –
Que mais mudou?
Maílson –
Houve um relaxamento
da política fiscal, com a ideia de que o
superavit primárionão é tão relevante
quanto se fala e vai agora ser oque der.
Isso é claramente dito pelo secretário
do Tesouro. A prioridade é o cres-
cimento. O governo promoveu um
quase desmonte institucional ao usar
acontabilidadecriativapara fazer crer
que está cumprindometade superavit
No passado, os maus governos tiravam o país
do rumo. Agora, o Brasil perde oportunidades
por conta de uma gestão medíocre. Em vez de
crescer 5%ou 6%ao ano, vai crescer 2%ou 3%
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