entrevista | Cassio Spina
Revista da ESPM
|março/abril de 2013
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Alexandre –
Vamos começar pela per-
gunta mais óbvia. Afinal, quem é e o que
faz o investidor-anjo?
Cassio –
É uma pessoa física, nor-
malmente empresário, executivo
ou profissional liberal, que teve uma
carreira bem-sucedida e resolve
aplicar o valor que tem acumulado.
Quase nunca se trata de grandes for-
tunas, mas de pessoas que desejam
transferir essa experiência de vida,
para evitar que o futuro empreende-
dor cometa erros que eles próprios
cometeram no passado. Eles têm a
função de abrir portas, orientar esse
processo de formação da empresa.
Arnaldo –
O que vocês fazem?
Cassio –
Anjos do Brasil é uma or-
ganização sem fins lucrativos, na
qual tentamos fomentar a atividade
do investidor-anjo no país. Fazemos
isso em três frentes. A primeira é a
construção de uma rede de investi-
dores. São grupos regionais, porque
o investidor tem de estar próximo do
empreendedor. A segunda missão é
disseminar cultura e conhecimento.
Capacitar tanto os investidores quan-
to os empreendedores para entender
como é o processo de investimentos
e obter bons resultados. O terceiro as-
pecto é institucional, principalmente
com o governo, em particular com os
poderes Legislativo e Judiciário. No
Brasil, ainda temos muitas barreiras,
que já foram superadas lá fora, como
a proteção ao investidor e incentivos
para que ele possa desenvolver essa
atividade. Buscamos produzir algu-
mas pautas para sensibilizar o poder
público sobre essa questão.
Arnaldo –
É possível traçar um perfil
mais detalhado de quem é o investi-
dor-anjo brasileiro?
Cassio
— É um empreendedor que já
teve seu negócio, já passou por alguns
fracassos e superou essas barreiras.
Há também executivos. Como muitas
empresas hoje têmpolíticas de bônus,
renda variável, isso ajuda a formar
um certo capital ao longo da carreira.
Há também médicos, advogados, que
têm o seu perfil empresarial, já que
precisam aprender a gerir o próprio
negócio. São pessoas que têm muito
interesse pelo empreendedorismo e
que querem fomentar novos negócios.
É claro que o investidor-anjo também
quer ganhar dinheiro, mas há uma
busca pela satisfação de construir
algo novo, uma vez que esses inves-
timentos demorampara dar retorno.
Arnaldo –
Em que estágio está o in-
vestidor-anjo no Brasil, comparado com
os dos Estados Unidos, onde já existem
grupos mais estruturados nesse nicho
de mercado?
Cassio
— Os Estados Unidos são o
berço do investimento-anjo, é um
mercado mais maduro. Há também,
como você disse, grupos estrutura-
dos, que atuamde forma segmentada,
em energia ou saúde, para citar dois
exemplos. Aqui é tudo muito novo,
mas acredito que o nosso perfil não
é muito diferente. Estamos apenas
num estágio anterior, como os Esta-
dos Unidos estavamhá dez anos.
Arnaldo –
O índice de empreendedo-
rismo no Brasil é alto. Está muito acima
da Europa e supera a maioria dos mer-
cados emergentes. Que fatores explicam
esse fenômeno?
Cassio
— Historicamente, o brasileiro
sempre foi empreendedor. Só que hoje
isso ocorre de uma maneira diferente
em relação ao passado. Antes, o perfil
básico era o do empreendedor por
necessidade. Por falta de uma opor-
tunidade profissional, um emprego,
a pessoa era obrigada a montar o
próprio negócio. É o caso da famosa
barraquinha de cachorro-quente.
Com a nossa economia em pleno em-
prego, issomudoumuito. O que temos
hoje é muito mais o empreendedor de
oportunidade. Aquele sujeito que tem
um projeto, um sonho, e entende que
agora há condições para colocá-lo em
prática. É claro que o mercado evoluiu
muito nos últimos anos e houve mais
acesso a capital, o que é indispensável
para desenvolver qualquer negócio.
Arnaldo –
No ano passado, surgiram
1,6 milhão de empresas no Brasil,
sendo que um milhão delas foram de
negócios individuais. Isso não masca-
ra uma nova realidade nas relações
trabalhistas?
Cassio
— É difícil ter clareza sobre
esse universo. Mas estamos viven-
ciando, de fato, uma mudança na
relação do trabalho. O sistema for-
mal, o cartão de ponto, mudou para
Éclaroque o investidor-anjo tambémquer ganhar
dinheiro,mas háumabuscapela satisfação
de construir algonovo, uma vez que esses
investimentos demoramparadar retorno