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entrevista | Dickson Despommier

Revista da ESPM

|maio/junhode 2014

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Arnaldo –

O senhor afirma que o

mundo demanda hoje uma área equi-

valente à da América do Sul para ali-

mentar sete bilhões de pessoas. Se che-

garmos a dez bilhões, precisaremos

de mais um território do tamanho do

Brasil. Atingimos o nosso limite na ca-

pacidade de produção de alimentos?

Despommier –

É difícil definir

qual é esse limite. O fato é que hoje

há gente passando fome, e isso não

ocorre pela falta de alimento, mas

pela forma como ele é distribuído.

No futuro, se somarmos outros três

bilhões de pessoas, aí não teremos

comida suficiente para todos, es-

taremos chegando ao nosso limite.

Um dos maiores problemas será a

falta de capacidade da Terra em re-

verter o processo de degradação dos

recursos naturais.

Arnaldo –

Para o Brasil, que tem

áreas de monoculturas agrícolas

maiores que muitos países, a ideia de

fazenda vertical parece ficção cientí-

fica. Como o senhor traduziria esse

conceito para a nossa realidade?

Despommier –

A produção agrícola

em ambiente fechado é algo que já

se faz há muito tempo. Na Inglater-

ra, esse conceito nasceu no século

17, quando as primeiras estufas

foram feitas. E foi uma experiência

de sucesso dentro de uma escala

pequena. As pessoas produziam ar-

tigos agrícolas de butique ou flores.

Mas, nos últimos 20 anos, tivemos

um enorme avanço nas variedades

que podem ser produzidas, assim

como o ganho significativo de pro-

dutividade. Ainda assim, as estufas

convencionais demandam muito

espaço. No Estado do Arizona, nós

temos uma estufa com 318 acres

(1,28 milhão de metros quadrados).

É uma enorme operação que produz

tomates, feijões e vários produtos,

com capacidade para abastecer até

5% da demanda de todos os Estados

Unidos nessa variedade ao longo de

todo o ano. E esta é a beleza da agri-

cultura fechada: ela não depende

das condições do clima ou de qual-

quer estação do ano para ser produ-

zida. E se você considerar que, fora

das regiões tropicais, as condições

climáticas interferem decisivamen-

te na agricultura, é uma vantagem

muito grande.

Arnaldo –

De que forma o conceito

de estufa se adapta a uma fazenda

vertical?

Despommier –

A estufa é o ponto

de partida. Basta imaginar que você

pode colocar uma estufa em cima da

outra, depois mais uma e assim por

diante, obtendo um ganho imenso

de capacidade em pouco espaço

ocupado. Por isso eu não vejo como

algo fora da realidade que cada

cidade possa produzir até 10% de

tudo o que consome, em fazendas

verticais, considerando os avanços

técnicos que já alcançamos até aqui.

Numa fazenda vertical também não

é necessário nenhum tipo de pesti-

cida ou defensivo. É um ambiente

totalmente controlado, mais pro-

dutivo e já dispomos da tecnologia.

Então a pergunta é: por que não

começamos a investir nisso agora?

Arnaldo –

O que isso pode represen-

tar do ponto de vista da sustentabili-

dade em termos práticos?

Despommier –

Eu fiz um cálculo

e isso tem relação direta com o

Brasil. Desde 1950, estima-se que

o Brasil tenha sacrificado 700 mil

milhas quadradas (1,23 milhão de

quilômetros quadrados) de florestas

em prol do desenvolvimento. E nós

sabemos que a maior parte disso foi

destinada à agricultura. Se todas as

cidades no mundo, que ocupam ape-

nas 3% do território, fossem capazes

de produzir 10% do que consomem,

isso representaria 340 mil milhas

quadradas (547 mil quilômetros

quadrados) de florestas — a metade

do que foi devastado no Brasil. Con-

siderando toda a população global,

nós precisamos hoje de meia Amé-

rica do Sul apenas para alimentar

as pessoas que vivem nas cidades. É

por esse motivo que a produção em

áreas urbanas se torna uma tendên-

cia importante para o futuro.

Arnaldo –

Que modalidades de agri-

cultura urbana vêm se espalhando no

mundo, atualmente?

Despommier –

Sem dúvida não

são apenas as estufas. No Japão já

existem diversas fazendas verticais

e mesmo em lugares como Cuba há

Hoje há gente passando fome, e isso não ocorre

pela falta de alimento, mas pela forma como ele é

distribuído. No futuro, se somarmos outros três

bilhões de pessoas, não teremos comida suficiente