Revista daESPM –Março/Abril de 2002
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cotidiano, é um encontro estésico como
mundo que se dá em um tempo fora do
tempo(OLIVEIRA,1995:229),permitin-
do a visão de algo anteriormente imper-
ceptível.Seo livrodoBoti já foi lidocom
acriança,outromomentode“fratura”em
que seu imaginário foi povoado de ani-
mais daAmazônia e demedidas de pre-
servação da natureza, quando ela toma
banho, ela“fazdeconta”queestáno rio,
que sente seusodores,manuseia sua for-
manosabonete,manipulaseucorpocom
aesponjadogolfinho.Brincadeestarno
RioAmazonas. Esse momento de brin-
cadeira e diversão é fundamental para a
infância. Sobre sua importância nos diz
FERRAZ (1993):
Através das brincadeiras as crianças
vivemsituaçõesilusóriaseaprendemaela-
borarseu imaginário, emuitasvezesatéa
buscar a realizaçãode seus desejos,mes-
mo que sejam irrealizáveis.
Portanto, in-
centivaracriançaaparticipardapreserva-
çãodanaturezaé torná-lacidadã,éapostar
nasuacapacidadede lidarcomproblemas,
dando-lhe condições para atuar.A grande
leva de livros ecológicos de literatura in-
fantil da década de 80 primava por uma
posturanegativae insolúvel, típicadaneu-
rosedo ser humanoadulto, quedesconhe-
ceouniverso infantil.Curiosamente, essa
campanhapublicitárianão incorreunesse
erro.Eapostarnacapacidadedascrianças
éalgoqueMonteiroLobato jánosprovou
com sua obra que vale a pena.
Se, de um lado, a criança brinca e
vive no mundo do “faz de conta”, de
outro, ela valoriza o cotidiano, a repeti-
çãodeaçõese fatosqueaajudamacons-
truir sua identidade, sua noção demun-
do. Por isso mesmo, a campanha pro-
põeaparticipaçãodeumclubeecológi-
co, queenviaàs crianças correspondên-
ciacom jogos lúdicos sobreanimais em
extinção, catálogos com a continuação
da campanha e que inclui sempre a in-
serção de novos produtos, como a es-
ponja do Boti para o
kit
de Natal, uma
saboneteira na forma de sapos e golfi-
nhos, um
kit
para o próximoNatal com
objetosparabrincarnapraia (baldes, pá,
etc.). Ler o livrodoBoti, tomar banho e
fazer parte do clubinho ecológico são
brincadeiras complementares que, se-
gundoVygotsky (FERRAZ, 1993:85),
a
criança modifica os hábitos e compor-
tamentos usuais, mostrando-se mais e
emmaior grandeza.
E completa dizen-
do:
Apesardarelaçãobrinquedo-desen-
volvimento poder ser comparada à re-
lação instrução-desenvolvimento, o
brinquedo fornece ampla estrutura bá-
sicaparamudanças das necessidades e
daconsciência.Poressasrazões,obrin-
car passa a ser um fator de
conscientizaçãodepapéissociais, inclu-
siveos de relações de estratificação, de
poder e de normas.
A única ressalva a ser feita foi que a
campanha iniciou-seeas lojasexpunham
os produtos inicialmente atrás do balcão,
o que não permitia que a criança tivesse
acessosozinhaaoproduto,dependendode
umadultoparamostrá-lo.Mesesmais tar-
de,as lojaspassarama terumaestantecom
os produtos do Boti, o que aproximou o
consumidor do produto, mas as pratelei-
ras eram ainda altas para as criançasme-
nores.Normalmente,produtosparacrian-
ças são expostos ao alcancedas crianças.
É só pensar nos
displays
da balaTic-Tac
nossupermercados,dagôndoladechoco-
lates ou as vitrines baixas feitas nas lojas
deCafédoPonto,noqualascriançasapre-
ciam asminiaturas e bonecos commuito
interesse.
Concluindo...
Portanto, acriançaque leuo livrodo
Boti váriasvezes, brincoucomaespon-
ja doBoti nobanho, fez usodos produ-
tos de banho e recebeu informações do
clubeecológicodoBoti estáemproces-
so de ressemantização da produção de
sentidos. Logo, no banho, ela
reestabelece a relação com o líquido
aminiótico que revitaliza e reatualiza a
sensaçãode completudedavida, do cui-
dado,docarinhoaomesmo tempoemque
introduz informações e participação do
universo amazônico e sua preservação.
Desse modo, a criança pode construir
novossignificadosparaasuarelaçãocom
o “sujeito” natureza por meio de seu si-
mulacro,aecologia.Assimentreosensí-
vel dobanho eo inteligível do livro eda
participação social, a criança exerce sua
cidadaniaecria-seumnovo
devir
parao
planeta, no passado imediato, que traz a
carga semântica da novidade Boti. Por-
tanto, amarrar todas essas questões: pre-
sente e futuro, universo infantil, ecolo-
gia,produtos lúdicoseatrativos, emuma
única e contínua campanha é realmente
uma proposta demestre que revela um
profundoconhecimentodoperfil dacri-
ança enquanto consumidora.Ah, se to-
das as campanhas para crianças fossem
como essa doBoti...
“Osgolfinhos
ocupamapágina
inteiraeestão
nohorizonte
queamenina
provavelmente
observa.”
“Senãohouvesse
oproblemada
agressãoaomeio
ambiente,
provavelmente
essesgolfinhos
seriamreais.”