maio/junhode2013|
RevistadaESPM
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maior para compreender o problema.
Normalmente, uma crise dessas dura
dois anos, e já estamos no quinto.
Como era algo mais grave, criou-se
esse discurso de que era o fim do
capitalismo. Foi uma leitura da es-
querda. E aí apareceram também os
arautos do caos, como o economista
Nouriel Roubini. Mas quem conse-
guiu manter certa independência na
análise percebeu que as coisas foram
andando no sentido correto. De ma-
neira que hoje você tem informações
suficientes. Cito duas básicas. Amais
importante é uma das armadilhas de
situações como essas, que o governo
é chamado a intervir na economia,
com aumento dos gastos e, com isso,
você eleva o deficit público. Como
a recessão é muito forte, a receita
do Estado cai e o endividamento do
governo cresce muito. Pelo andar da
carruagem das últimas décadas, já
havia uma dívida interna grande das
principais economias. Isso criou,
pela primeira vez, uma imagem de
que os governos não conseguiriam
pagar as dívidas, o que adicionou
mais um elemento nessa discussão.
O que Keynes diz, e que seus seguido-
res infelizmente estão se esquecen-
do, é que essa ação do governo temde
ocorrer enquanto a demanda privada
está afetada pela crise. Só que é difícil
fazer essa retirada. Mas aí os Estados
Unidos, de novo por um fator externo
das decisões do governo, criaram
uma solução para o problema.
Arnaldo –
Que solução foi essa?
Mendonça de Barros –
O Partido
Republicano, que controla uma das
casas do Congresso [
Senado
], numa
luta agressiva com Obama, passou
uma lei de sequestro de receita, que
obriga a redução de gastos do gover-
no. Só que a lei foi aprovada quando a
economia já estava se recuperando e,
segundo Keynes, já era hora de redu-
zir gastos mesmo. É difícil fazer isso
numa democracia, porque o governo
sempre é pressionado a aumentar o
ritmodo crescimento econômico.Mas
nesse caso foi mandatório por uma
questão política. De maneira que o
deficit público americano, que chegou
a 10% do PIB, nesse ano já caiu para
4%, enquanto se esperavam 6%. Como
aumentou o crescimento e houve esse
corte de despesas, a recuperação foi
mais rápida. Em 2014, os Estados Uni-
dos já terão um deficit de 2,4%, o que
é um índice de normalidade. A dívida
vai se estabilizar em70% do PIB, o que
é aceitável. Desse ponto de vista os
americanos saíramda crise.
Arnaldo –
Os Estados Unidos adotaram
uma solução keynesiana clássica?
Mendonça de Barros –
Sem dúvida,
mas adaptada ao arranjo institucio-
nal da economia mundial. Por isso,
levou um certo tempo. O Bernanke
começou com os mecanismos do
pensamento keyenesiano, a coisa não
funcionava e ele foi obrigado a inovar.
O governo também estatizou empre-
sas. Então, a inteligência política de
Obama levou a essas soluções.
Arnaldo –
Houve um fator extracam-
po na economia americana, a revo-
lução do gás de xisto, que ajudou na
formação de empregos. É um elemento
importante?
Mendonça de Barros –
Isso vai ser
importante daqui para frente. Mas é
umdadomicroeconômico que, jogado
nesse contexto da economia ameri-
cana, não é nada. Sem dúvida, é uma
revolução tecnológica e, como toda
inovação desse gênero, terá impacto
importante no futuro.
Arnaldo –
E a Europa, que partiu para
soluções mais ortodoxas, está fadada a
uma crise eterna?
Mendonça de Barros –
AEuropa é um
bicho político diferente. Hoje existem
trabalhos interessantes dizendo que o
problema é a complexidade do arranjo
político aliada a um conservadorismo
nacional muito grande dos países. O
francês não quer abrir mão das 35 ho-
ras semanais de trabalho, enquanto o
alemão não abre mão de sua paranoia
com inflação. No fundo, a Europa vi-
rou umespaço velho, semcriatividade
e inovação. Além disso, enfrenta um
cenário de dívida muito sério, porque
nos últimos dez anos muitos países
cresceram à custa de endividamento.
A Europa virou um pedaço da econo-
mia mundial que não funciona. Sob
outro aspecto, com os Estados Unidos
se recuperando, isso ajuda a China na
mudança de seu modelo econômico.
E temos ainda um dado novo, que é o
Japão, que depois de décadas resolveu
lutar contra a deflação e a estagnação.
Se der certo, como aparentemente
está dando, passaremos a ter três mo-
tores, os Estados Unidos, a China e o
Japão, puxando a economiamundial.
Temos umdado novo, que é o Japão, que resolveu
lutar contra a deflação e a estagnação. Se der certo,
teremos três motores – os Estados Unidos, a China
e o Japão – puxando a economia mundial