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entrevista | Fernando Sampaio

Revista da ESPM

|maio/junhode 2014

64

Alexandre –

Esta edição da

Revista

da ESPM

gira em torno do conceito

de agrossociedades, que são cidades

espalhadas pelo Brasil com economia e

mentalidade baseada no agronegócio.

Quais são os casos de sucesso de agros-

sociedades centradas na pecuária?

Fernando –

A pecuária brasileira

sempre foi atividade de fronteira,

que abriu caminho para a agricultura

e para a ocupação do território. Isso

começou no Rio Grande do Sul, por-

que o gado era europeu e lá temos os

Pampas, um território de pastagens

naturais com todas as condições

para a pecuária se desenvolver. Foi o

primeiro polo da indústria da carne,

que produzia o charque e o couro

para o Brasil inteiro. No final do

século 19, Uberaba (MG) começou a

importar gado zebu, que possibilitou

à pecuária ocupar a região central do

Brasil. Era umgadomais adaptado às

condições tropicais. Depois da intro-

dução do zebu, registramos a expan-

são da pecuária em Minas Gerais e

dali para Goiás, Mato Grosso, Mato

Grosso do Sul. Tem também o Panta-

nal, uma região onde não há nenhum

outro tipo de agricultura viável. E há

as regiões do norte do Mato Grosso

e do sul do Pará, que foram, e ainda

são, ocupadas com pecuária. Em to-

das essas regiões, há cidades inteiras

que giram em torno dessa atividade.

Alexandre –

Ainda existe uma men-

talidade de pioneiros nos grupos que

estão abrindo essas novas fronteiras

que você citou por último? No sentido

de serem sociedades mais igualitárias

nas oportunidades?

Fernando –

Sim. O problema é que

parte dessa ocupação foi feita de for-

ma desordenada, o que causou muito

conflito, porque não se temsegurança

jurídica. O conflito entre terras indí-

genas e assentamentos de produtores

é grande. Então, temum senso de pio-

neirismo grande de gente que saiu do

Sul do país e foi ocupar essas regiões.

Por outro lado, isso gerou conflitos em

determinados pontos.

Alexandre –

Em cidades que estão se

desenvolvendo por conta da pecuária,

você consegue apontar transforma-

ções sociais e econômicas provocadas

pela indústria da carne, além do cres-

cimento populacional?

Fernando –

Sim, até porque a indús-

tria acaba seguindo o caminho do

boi. Houve uma migração da indús-

tria para essas regiões, atrás de ma-

téria-prima. Temos cidades no Brasil

que giram em torno do frigorífico: só

boi em volta e a indústria da carne. A

padaria só funciona porque o frigo-

rífico está em operação. Transporte,

posto de gasolina... a economia local

gira em torno dessa indústria. Tenho

uma foto de 30 anos atrás, da cidade

de Juara, no norte do Mato Grosso, e

uma foto atual desse município. Há

30 anos, a cidade tinha três barracas

de pau a pique no meio da rua. Hoje,

Juara é uma cidade arrumadinha,

comum bompadrão de vida.

Alexandre –

Hoje, qual a importân-

cia das exportações de carne para o

Brasil?

Fernando –

O boi abastece 49 seg-

mentos industriais: carne, couro,

biodiesel, gelatina, indústria far-

macêutica, até fertilizantes que

usam conteúdo bovino. A cadeia,

como um todo, movimenta US$

170 bilhões por ano. A exportação

é parte disso. O Brasil é o maior ex-

portador de carne do mundo. No ano

passado, batemos o recorde: foram

US$ 6,6 bilhões exportados. Mas a

exportação representa apenas 20%

da produção. O resto é tudo mercado

interno. Há geração de emprego em

áreas onde, se não tivesse um frigo-

rífico, não haveria onde trabalhar.

Alexandre –

Para 2014 a expectativa

é obter umnovo recorde de exportações?

Fernando –

No primeiro quadri-

mestre, crescemos 14% e a expec-

tativa é a de chegar perto de US$ 8

bilhões.

Alexandre –

O setor tem uma meta

para os próximos anos?

Fernando –

A demanda mundial

por carnes está crescendo, princi-

palmente nos países em desenvol-

vimento, que hoje têm um consumo

per capita

baixo e um crescimento de

renda alto. A China ainda vai ter um

peso grande na demanda por qual-

quer tipo de carne. Quando compara-

mos o Brasil com seus concorrentes,

Oboi abastece 49 segmentos industriais: carne,

couro, biodiesel, gelatina, indústria farmacêutica,

até fertilizantes que usamconteúdo bovino. Toda

essa cadeiamovimentaUS$ 170 bilhões por ano