Stalimir
Vieira
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S E T EMBRO
/
OU T UBRO
DE
2005 –REV I STA DA ESPM
Q
uandoCaetanoVeloso, aodedilhar
no violão os primeiros acordes e
cantar os primeiros versos de
“Alegria, alegria”, foi interrompido
por uma vaia ensurdecedora,
durante um festival de música nos
anos60, estava sofrendo, aomesmo
tempo, uma censura cruel de gente
que, em tese, estaria alinhada com
ele na oposição à ditadura militar
instaladanoBrasil, desdemarçode
1964.Nãoédeduvidar quemuitos
jovens de hoje confundam aquele
momento com o motivo do exílio
do compositor baiano, imaginando
que suapoesiahouvesse irritadoos
militares e sido censurada, e ele,
mandado embora do País.
Por paradoxal que pareça, uma
coisa não tem nada a ver com a
outra. Apenas para ajudar na
compreensão, podemos dizer,
mesmo beirando a simploriedade,
que a censura através das vaias foi
obra da esquerda e o exílio, da
direita. A moçada que assoviando
e urrando fez calar opoeta é quem
estava irritada com a suavidade da
melodia e a sutileza da letra,
julgadas inadequadas para um
momento extremo de repressão às
liberdades. Preferiam as canções
vigorosas de Geraldo Vandré, por
exemplo, verdadeiros chamados à
luta contra a ditadura.
Na ocasião, Caetano fez um dis-
curso, indignado, que culminou
comoconceito“éproibidoproibir”.
Sérgio Ricardo, outro compositor e
intérprete, também vaiado inapela-
velmente, quebrou o violão no
joelhoeoatirounopúblico.Calca-
dos em suas convicções, ambos
reagiramàquiloquecompreendiam
apenas comocensura, nuncacomo
opinião. Era censura? Claro, uma
vez que foram impedidos de se
manifestar. Mas era opinião?
Também, levando-se em conta que
avaia foi uma respostaàspropostas
intelectuais manifestas nas obras.
Pode-se dizer que Caetano Veloso
sempre foi umartistanão-alinhado.
Enquanto Vandré, por exemplo,
nutria o ódio da ditadura com seus
hinos convocatórios ao enfren-
QuandoCaetanoVeloso, aodedilhar no violãoosprimeirosacordese
cantarosprimeirosversosde“Alegria, alegria”, foi interrompidopor
umavaiaensurdecedora.
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