Revista daESPM – Setembro/Outubro de 2002
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O
s profissionais envolvidos com
o estudo da criatividade costu-
mamdistinguir essacompetên-
cia humana, quando aplicada ao traba-
lho, da criatividade artística, que é vista
como um dom quase divino. Isso vem
de longe, pois em 1964 o livro
The Act
ofCreation
,deArthurKoestler,que inau-
gurouomodernoestudodacriatividade,
já esboçava essa distinção.
Apartirdaamplamenteaceitasepara-
ção,psicólogoseprofessoressempre iden-
tificaram duas vertentes motivadoras da
criatividadenãoartística,queseriam,por
um lado, a solução de problemas, e por
outro, adescobertadeoportunidades.
Trabalhando com criatividade desde
antes de 1964, na verdade, a vida intei-
ra, ultimamente, passei a sugerir que é
possível definir-se uma terceira via
motivadora, aqui chamada de “aventura
do novo”. Se a considerarmos uma ver-
tente válida, ela poderá explicar alguns
detalhes denosso comportamento, além
de permitir que se estudem osmecanis-
mos criativos do ser humano sem a ne-
cessidade de separar o campo das artes
dosdemais–poisassinapsesdocérebro
do artista, que o levam a criar, são as
mesmas sinapsesdocientistaa formular
hipóteses, do vendedor buscando argu-
mentos e da cozinheira aproveitando as
sobras paraumnovoprato. Estudando e
entendendo essa pretendida terceira via
motivadora, poderemos cultivá-la, e as-
sim exercer melhor o nosso potencial
criativo.
que seja também a terceira das forças
específicas que nos mobilizam para o
uso do raciocínio criativo, aquele que
se usa muito para inovar, tanto nas ar-
tes, comonaciênciae tecnologia, como
na gestão e nomarketing.
O registrodessacaracterísticahuma-
na vem da antigüidade, pois podemos
identificar a raiz da aventura do novo
dentro da interessante metáfora criada
pelosgregossobreaexpansãodoconhe-
cimento. Segundo os pré-socráticos, se
imaginarmos o saber como um círculo
de luz, eo“não saber”comoaescuridão
em volta, verificamos que, quantomais
sabemos, mais nossa área luminosa se
expande, porém passa a ter também um
crescente contato, em seus limites, com
o que não sabemos. Portanto, quanto
mais aprendemos, mais verificamos
quanto somos limitados, ao vislumbrar
como é intangível o universo do novo.
Entretanto,mesmoassim, somosempur-
rados de tal forma para esse novo, que
hoje já existe até uma neurose causada
pela preocupação com a impossibilida-
de de acompanhar o que acontece.
Identificada pelos terapeutas do pri-
meiro mundo, essa patologia vinda da
expansão da informação é tratada com
uma receita de comedimento, tipo ver
apenas uma hora de tevê e ler um jornal
por dia, uma revistapor semanaeum li-
vropormês.Dessapráticaviriao alívio
de sentir-se sem culpa, ainda que não
acompanhando tudo,mas por ter feito a
coisa certadentrodopossível.Uma for-
ma de lidar com aquela compulsão.
Oqueéaaventura
donovoe
deondevem
Tudo o que pode definir a aventura
donovovemdeuma atraçãoquenossa
espéciecarregaquasecomocompulsão,
um sentimento forte e inato, misto de
curiosidade e fome de conquistas, um
impulso peculiar do homem. Trata-se
de uma das maiores molas do desen-
volvimento em geral, e defendo aqui
Oprazerdonovo
Mas, onde estará o porquê dessa
compulsão,hojecausadoradeumdecor-
rente sofrimento?A resposta deve estar
contida em uma frase de Erich Fromm,